Nesta quarta-feira (18), o CDC (Center for Disease Control and Prevention, ou Centro de Controle e Prevenção de Doenças), o órgão de saúde pública dos Estados Unidos, confirmou o primeiro caso grave de gripe aviária em humanos no país, e o primeiro cuja contaminação se deu via criação doméstica de aves.
Especialistas temem que o aumento de casos permitam ao vírus H5N1 acumular mutações suficientes para permitir a transmissão sustentada entre humanos, o que poderia descambar para uma nova pandemia, ainda pior que a da COVID-19.

Taxa de letalidade do vírus H5N1 é altíssima, e uma pandemia seria uma catástrofe (Crédito: bohdanchreptak/Pixabay)
Surtos de gripe aviária preocupam
O paciente de Louisiana não é o primeiro caso grave diagnosticado de gripe aviária dos EUA, mas até então, todos os registrados envolviam profissionais do setor de produção. A contaminação recente, segundo o CDC, se deu por uma criação de quintal, graças ao contato com aves e carcaças contaminadas.
O caso foi inicialmente relatado como “suposta contaminação” no dia 13 de dezembro de 2024, com o contágio da forma grave confirmada pelo órgão sanitário dos EUA cinco dias depois. A Influenza Aviária de Alta Patogenicidade, ou IAPP, é causada por uma variação do vírus Tipo A da gripe comum, que afeta humanos, outros mamíferos, e aves, e causa as epidemias sazonais (assim como o Tipo B, exclusivamente humano), e com variações, as pandemias gripais.
O vírus em questão, o A(H5N1), ou simplesmente H5N1, afeta principalmente aves e é transmissível de um indivíduo para outro apenas entre elas; outros mamíferos também são afetados, como bovinos e equinos, e um dos casos norte-americanos documentados se deu através do gado leiteiro. O ponto principal, humanos são até o momento praticamente incapazes de passar o vírus adiante, os casos documentados são raros, e não sustentados.
A gripe aviária é uma doença considerada grave, que pode evoluir de um simples quadro similar a uma infecção respiratória, para uma pneumonia e levar ao óbito. Os sintomas mais comuns envolvem febre alta (acima de 38 °C) e dispneia (dificuldade de respirar), mas outros como diarreia, vômitos, sangramento no nariz e gengivas também são relatados.
Os primeiros casos de gripe aviária causada pelo H5N1 em humanos foram registrados em Hong Kong em 1996 (18 infectados, 6 mortos), embora o vírus fosse conhecido desde 1959; até 2018, ele conviveu com outras variações, até a mais letal se tornar dominante, e os frangos são os hospedeiros aos quais ele melhor se adaptou, embora também possa infectar patos e gansos.
O grande problema envolvendo o H5N1 é sua alta taxa de letalidade, a porcentagem de mortos entre todos os infectados, cuja média supera os 50%. Só para dar uma ideia da gravidade da situação, a da COVID-19 não passa de 3%, considerando todos os casos relatados.
Oficialmente, a pandemia terminou com mais de 7 milhões de mortos em todo o mundo, mas esses são apenas os oficialmente relatados; estima-se que o número real de óbitos tenha ficado entre 18,2 milhões e 33,5 milhões.
Claro que é preciso lembrar, as taxas de mortalidade e letalidade variam muito de região para região, e dependem de como os órgãos sanitários de cada país, as autoridades, e a população, respondem a uma pandemia. O caso da COVID-19 foi especialmente didático, com o Brasil sendo o segundo país em número de mortes (702.116, números oficiais), ficando atrás apenas dos EUA (1.209.009). Ainda assim, o H5N1 é um vírus bem letal, mais que o da Covid.
Por outro lado, uma doença com alta letalidade tem menos potencial de se alastrar, porque os infectados morrem rápido; vide o Ebola, cuja média é de também aproximadamente 50%, mas surtos específicos chegaram a até 90%, e ainda assim, continuamos por aqui.
O que está preocupando os cientistas e profissionais de saúde, o fato do surto atual já ter contaminado 61 pessoas ao redor do mundo (até 2023, o Brasil registrou 5 casos de contágio, sem nenhum óbito), e o caso de Louisiana é uma mudança do cenário, pois mostra que o H5N1 está circulando entre criações domésticas, ficando assim exposto a humanos no aberto. E aqui as coisas começam a se complicar.
O vírus da gripe comum é mutável por natureza, um bom exemplo é o fato de idosos terem que se imunizar todos os anos, as vacinas só respondem bem à variação circulando no ano corrente. Até então, acreditava-se que os casos nos EUA, envolvendo profissionais manuseando gado leiteiro, eram causados por uma variação menos letal, e estes foram menos expostos. A bem da verdade, ninguém sabe por que os casos no país foram, em sua maioria, leves.
Já a circulação da variante grave, entre criações de frangos domésticas, pode levar a um cenário em que uma maior exposição a humanos leve a novas mutações, no que a mais temida é a que sustente a transmissão entre humanos de modo eficaz. Um estudo recente (cuidado, PDF), publicado na Science, diz que o vírus que circula entre o gado leiteiro só precisa de uma única mudança para isso.
O motivo é simples, quanto mais o H5N1 circular entre nós, mais chances ele terá para acumular mutações que o permitam sobreviver no nosso trato respiratório, e considere que essa variante circula nos EUA, onde a temporada anual de gripe está para começar; vírus diferentes da gripe são capazes de trocar material genético entre si, através do processo de rearranjo, quando ambos infectam um mesmo organismo ao mesmo tempo, o que também aumenta as chances de uma mutação aparecer.
Solução? Não tem, desde que o vírus está circulando livremente, as chances dele evoluir para uma variante que sustente o contágio entre humanos aumenta exponencialmente, mas, ao mesmo tempo, diversos laboratórios ao redor do mundo já estão desenvolvendo vacinas, incluindo o Instituto Butantan. Se a Covid nos ensinou algo, é que a Ciência funciona, e quando realmente queremos, nem mesmo as mais mortais doenças da História têm vez.
Referências bibliográficas
LIN, T. H., ZHU, X., WANG, S. et al. A single mutation in bovine influenza H5N1 hemagglutinin switches specificity to human receptors. Science, Volume 386, edição 6.726, 7 páginas, 5 de dezembro de 2024.