Alessandra Munduruku no TEDxAmazônia (Felipe Martins/TEDxAmazônia)

09 de junho de 2025

Fabyo Cruz – Da Cenarium

BELÉM (PA) – As negociações de créditos de carbono, contaminação por mercúrio e a exclusão dos indígenas de Conferências do Clima da ONU (COPs), como a COP30, foram os assuntos abordados pela liderança indígena Alessandra Korap Munduruku, em declaração à CENARIUM, na sexta-feira, 6, em Belém (PA). Alessandra esteve na capital paraense para participar do TEDxAmazônia, evento que seguiu até domingo, 8, no Theatro da Paz.

Korap falou sobre a contaminação por mercúrio de indígenas, que tem se tornado uma questão de saúde pública. Ela questiona se a COP30, que acontecerá em novembro, no Pará, trará soluções para os problemas que afligem os povos tradicionais.

“A gente percebe que nós, povos indígenas, estamos doentes por conta do garimpo, por conta do mercúrio. Imagina que toda vez que a gente vai sentar com pesquisador, com cientista, eles dizem que o leite materno das mulheres está contaminado com mercúrio, os úteros das mulheres estão contaminados com mercúrio. Isso não existe. Mas, qual solução vão trazer? Será que a COP vai trazer essa solução?”, argumenta.

À reportagem, ela criticou duramente o que chamou de “farsa institucional” em torno das conferências internacionais e denunciou a exclusão das populações tradicionais nos debates que impactam diretamente seus territórios, como a COP30.

“Estão tentando nos silenciar, estão tentando nos apagar para não termos essa visibilidade, mas a gente continua brigando, a gente continua falando, a gente vai continuar gritando, sim, para nos ouvirem e ouvirem as necessidades dos povos indígenas, dos povos quilombolas, dos povos tradicionais. É o nosso dever gritar, e eles têm que ter a obrigação de resolver as políticas públicas para o nosso território”, disse ela.

Alessandra Munduruku em palestra no TEDxAmazônia (Felipe Martins/TEDxAmazônia)

Veja o vídeo:

A fala de Alessandra demonstra uma insatisfação crescente entre lideranças indígenas da Amazônia, especialmente no Pará, Estado que tem sido alvo de empreendimentos que ameaçam terras e modos de vida tradicionais. Entre os principais pontos de crítica estão a ausência de consulta livre, prévia e informada às comunidades, o avanço da mineração em áreas protegidas e o uso indevido dos chamados créditos de carbono.

Para a ativista, a COP30 parece estar se tornando uma festa, tirando do foco o verdadeiro objetivo. “Olha, a gente sabe que são 30 anos de COP, mas o que a gente percebe é uma COP de negócio, de acordo, de festa, de festivais – não de resolver os problemas que estão acontecendo no território”, afirmou.

Consulta aos povos indígenas

Korap também comentou sobre o modo como estão sendo conduzidos os acordos de venda de créditos de carbono. Segundo ela, há uma corrida para fechar acordos antes da próxima COP30, atropelando os direitos das comunidades. “Tem comunidade com 10 mil indígenas e conversam com 100 pessoas, 200 no máximo, e dizem que já foram consultadas. Vão para outra que tem 5 mil e sentam só com 50. Isso não é consulta!”, criticou.

Alessandra Munduruku esteve na capital paraense para participou do TEDxAmazônia (Foto: Fabyo Cruz/CENARIUM)

Alessandra ressaltou que o processo precisa incluir não apenas lideranças tradicionais, mas também mulheres, pajés, professores, parteiras, enfermeiros e demais membros da comunidade. “E a gente pergunta: quem vai consultar os animais? Quem vai consultar os peixes, as árvores, os rios?”, questionou.

A liderança também alertou para o fato de que os interesses econômicos estão sendo colocados acima das necessidades reais e urgentes das populações locais: “Há uma urgência de assinar esses créditos de carbono porque a COP está chegando. Mas, e a nossa urgência com a seca? Com a queimada? Com a demarcação das terras indígenas? Não é urgente também, não?”, questionou.

Invisibilidade e contaminação

Alessandra relatou que, mesmo com a crescente visibilidade internacional, os povos indígenas continuam sendo silenciados dentro dos próprios territórios. Ela cita como exemplo os protestos realizados no início do ano, quando povos indígenas ocuparam a Secretaria de Educação do Pará (Seduc) para exigir melhores condições de ensino.

Mostramos que, ali, estavam os povos indígenas, que vieram de muito longe, três dias de viagem até a capital. Muitos não têm acesso ao que está sendo decidido. E decidem por nós, sem nos consultar”, disse.

Outro tema grave levantado por ela é a contaminação por mercúrio nas comunidades indígenas da bacia do Tapajós, reflexo direto da mineração ilegal: “Imagina sentar com um pesquisador e ouvir que o leite e a matéria das mulheres estão contaminados, que o útero está contaminado. É triste, mas qual a solução que vão trazer? Será que a COP vai trazer essa solução?”, acrescentou.

Resistência e continuidade

Apesar da violência simbólica e material, Alessandra reforçou que os povos indígenas seguem lutando. “A gente continua brigando, continua falando. A gente vai continuar gritando, sim, para nos ouvir e ouvir as necessidades dos povos indígenas, quilombolas e tradicionais. É o nosso dever gritar, e é obrigação deles resolverem as políticas públicas para o nosso território”, finalizou.

Leia também: ‘Ocupação no Pará dá recado’, diz Alessandra Munduruku
Editado por Marcela Leiros

By Daniel Wege

Consultor HAZOP Especializado em IA | 20+ Anos Transformando Riscos em Resultados | Experiência Global: PETROBRAS, SAIPEM e WALMART

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