Os cerca de 155 mil mineiros que recebem mensalmente o benefício do Programa de Transferência de Renda (PTR), criado após o rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, conseguiram uma vitória na Justiça. Uma liminar concedida na noite de sexta-feira (28), pelo juiz Murilo Silvio de Abreu, da 2ª Vara da Fazenda Pública e Autarquias de Belo Horizonte, determinou que a mineradora volte a pagar o valor integral do auxílio, que havia sido reduzido pela metade em março de 2025.
A decisão atende a um pedido de urgência feito por três entidades que representam moradores das regiões afetadas: a Associação Brasileira dos Atingidos por Grandes Empreendimentos (ABA), a Associação Comunitária do Bairro Cidade Satélite (ASCOTÉLITE), em Juatuba, e o Instituto Esperança Maria (IEM). As organizações argumentam que a reparação prometida após a tragédia ainda está longe de ser concluída, e que a redução do benefício compromete a subsistência de milhares de famílias.
Segundo as entidades, os moradores atingidos continuam impedidos de exercer suas atividades econômicas habituais, como pesca, agricultura, turismo e comércio. Além disso, estudos técnicos e perícias para avaliar o impacto do desastre na saúde e no meio ambiente ainda não foram finalizados. “As execuções previstas nos anexos do Acordo de 2021 estão longe da conclusão”, afirmam os representantes.
Eles destacam ainda que a contaminação das águas, do solo e do ar na bacia do rio Paraopeba continua tornando inviável o retorno à normalidade nas cidades afetadas. “Essa é, sem dúvida, a questão central que impede, neste momento, a descontinuidade do Programa de Transferência de Renda. É inegável a responsabilidade da Vale quanto a essas condições”, sustentam na ação.
Ao analisar o caso, o juiz Murilo Silvio de Abreu reconheceu que os danos provocados pelo rompimento continuam se materializando com o passar do tempo. Ele também citou relatório da própria Vale, publicado em 2024, que prevê a conclusão do processo de reparação apenas em 2031. “O processo reparatório está longe de ser finalizado. O encerramento total do PTR está previsto para 2026, mas a Vale deverá seguir com os pagamentos até que a população retome as condições de vida anteriores ao desastre”, escreveu o magistrado.
Na decisão, o juiz determina que a Vale deposite em juízo os valores necessários para complementar os pagamentos já realizados, assegurando a manutenção do auxílio emergencial nos mesmos moldes anteriores ao corte. “Concedo a tutela de urgência para determinar que a ré Vale S.A. realize o pagamento de auxílio emergencial até que a população atingida alcance condições equivalentes às precedentes ao rompimento das barragens da Mina Córrego do Feijão”, conclui a liminar.
A Vale informou neste sábado (29) que ainda não foi oficialmente notificada da decisão. Em nota, a mineradora afirmou que o Programa de Transferência de Renda foi estabelecido como solução definitiva no Acordo Judicial de Reparação Integral, firmado em 2021, e que, com o depósito integral dos recursos, teria encerrado suas obrigações sobre o tema.
O PTR foi instituído no acordo celebrado entre a mineradora, o Governo de Minas e órgãos de Justiça estaduais, com o objetivo de reparar os danos causados pelo maior desastre ambiental da história do Brasil. Na ocasião, ficou determinado que a empresa destinaria R$ 4,4 bilhões ao pagamento de indenizações mensais aos moradores das 26 cidades atingidas.
A gestão e operacionalização dos repasses estão sob responsabilidade da Fundação Getulio Vargas (FGV), que anunciou a redução do benefício em março com o argumento de preparar os beneficiários para o encerramento do programa, previsto para março de 2026. Atualmente, o valor mensal corresponde a meio salário mínimo por adulto, com exceção da chamada “zona quente”, onde o repasse é de um salário mínimo. Crianças e adolescentes continuam recebendo, respectivamente, 1/8 e 1/4 do salário mínimo, valores que não foram alterados.
Foto: Washington Alves