Depois de uma sequência de lançamentos de regras e promessas ligadas à temática nos últimos anos, 2025 será um ano pivô, em que a “agenda ESG raiz”, que trata da materialidade de riscos causados por questões ambientais, sociais e de governança, ganhará ainda mais atenção.
Empresas e instituições financeiras terão que se adequar às mudanças regulatórias brasileiras e internacionais ligadas aos aspectos ESG, sigla em inglês que indica os fatores ambientais, sociais e de governança.
Ó Reiniciar conversou com especialistas sobre as tendências e os desafios que devem se destacar neste novo ano. São eles: Fernanda Camargo, CEO e sócia-fundadora da Wright Capital, Maria Eugenia Buosi, sócia da KPMG, Renato Eid, chefe de estratégias indexadas e investimento responsável da Itaú Asset, e Henri Rysman, líder de crédito no BNP Paribas.
Compilamos abaixo as principais tendências em que o leitor deve prestar atenção em 2025.
CVM na direção global
É consenso entre os quatro especialistas que as empresas e gestores terão que se mexer ao longo do ano para atender à norma 193 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que trata do conjunto de regras para divulgação financeira ligada à sustentabilidade e questões climáticas, batizadas de S1 e S2. A medida deve ajudar a amenizar a falta de dados e de padronização na temática, uma das dificuldades crônicas da agenda ESG.
A autarquia brasileira foi a primeira a adotar oficialmente o padrão global criado pelo International Sustainability Standards Board (ISSB), ligado à IFRS Foundation, a mesma organização que dita as regras para o padrão contábil mundial no futuro. O novo padrão foi endossado pela Organização Internacional das Comissões de Valores Mobiliários (Iosco, a “CVM das CVMs”).
A divulgação será obrigatória a partir de 2027, em relação ao exercício de 2026, mas pode ser feita voluntariamente um ano antes. Renner e Vale divulgarão até setembro suas informações sobre 2024.
A regulação deve auxiliar a deixar os riscos ESG mais tangíveis, de modo que até então não eram, diz Camargo, da Wright. “Várias partes da sociedade, como políticas de todos os lados ou o marketing de empresas, capturaram o termo ESG. Por ser tão abstrato, não era fácil comunicá-lo ao público geral. Agora, ele está cada vez mais indo para (as áreas de) risco.”
Buosi, da KPMG, aponta que essa normativa impacta portfólios de investimentos e que as informações geradas a partir dela devem ser lidas com cautela pelos investidores. “Isso porque a implementação da resolução presume não apenas o levantamento de indicadores ESG, como feito anteriormente nos relatórios voluntários de sustentabilidade, mas requer um ambiente de processos e controles internos que garantam a robustez dos dados, além de sua relação com os investimentos financeiros sobre a empresa”, afirma.
Nos relatórios, as empresas deverão apresentar, por exemplo, os planos de investimentos para atender aos seus compromissos de descarbonização e aos impactos de riscos socioambientais sobre custos operacionais.
“As empresas (de capital aberto) precisarão integrar considerações ESG nos relatórios financeiros existentes e envolver equipes multisetoriais de departamentos financeiros, jurídicos e ESG. O alinhamento com os padrões IFRS pode abrir portas para mercados de capitais internacionais, nos quais a conformidade com ESG é cada vez mais um pré-requisito para o interesse do investidor”, diz um relatório da EY divulgado em dezembro.
A taxonomia brasileira, que está em consulta públicatambém será vital para trazer concretude para essa agenda, segundo Camargo. Quando aprovada, a taxonomia será a classificação oficial do que poderá ser considerado um investimento de impacto socioambiental positivo.
O risco de carbono
No mês passado, o mercado regulado de carbono finalmente virou lei não Brasil. A regulamentação ainda exigirá alguns anos até que a melhoria seja concluída e as empresas sejam sujeitas a limites de emissões, mas os investidores já devem começar a identificar os impactos potenciais sobre o seu portfólio de investimentos, diz Buosi. “A necessidade de compensar carbono vai impactar o custo operacional de alguns setores e, direta ou indiretamente, seus resultados financeiros.”
Rysman, do BNP, também espera que a criação desse mercado contribua para que os riscos relacionados às emissões de gases de efeito estufa sejam melhor especificados pelas empresas que mais poluem. “Esse foi um risco que sempre ficou fora do radar e, agora, acredito que seja questão de tempo até que aplicações de forma mais relevante. É, inclusive, um bom exemplo de como podemos tentar antecipar a ocorrência dos mercados”, diz o gestor.
Foco na transição
Um movimento recente aconteceu para fortalecer a agenda da transição energética, e deve ser fortalecido ao longo de 2025, de acordo com especialistas.
Existe um entendimento crescente da importância de promover um plano de transição sustentável, afirma Eid, da Itaú Asset. “Por essa razão, aconteceu todo esse direcionamento e essa reclassificação massiva das estratégias (verdes) para estratégias de transição. O mundo vê isso com bons olhos, ao mesmo tempo em que existe um ponto de atenção sobre o prazo para essa transição”, diz.
Essa mudança tem sido refletida, inclusive, na indústria de fundos, com o fortalecimento e retorno do mercado dos veículos mais avançados nessa tese, segundo o gestor.
Camargo ecoa a fala de Eid, e acredita que várias oportunidades virão nessa frente: de um lado, de investidores, e de outro, da mobilização de empresas para acessar esses recursos.
De olho na Europa
Os regulamentos da União Europeia que têm impactos sobre o Brasil também devem ser sentidos ao longo do ano pelas empresas que fazem negócios com o bloco, segundo Rysman. Aquelas que não têm estratégias ESG bem integradas deverão encontrar dificuldades para cumprir as diretrizes europeias.
No mês passado, a UE entrou em um consenso para adiar a implementação da lei antidesmatamento, que atinge exportadores de soja, carne bovina, cacau, café, borracha, madeira e óleo de palma – incluindo os derivados.
O prazo original, 30 de dezembro de 2024, foi alterado para o fim de 2025 para grandes empresas e para junho de 2026 para pequenas e médias. O Parlamento Europeu foram feitas mudanças no textomas, devido às críticas pela redução da rigorosidade da legislação, a Comissão Europeia decidiu as alterações.
Daqui a dois anos, será uma vez a implementação da Diretiva de Due Diligence de Sustentabilidade Corporativa (CS3D)que busca prevenir, mitigar e eliminar a transparência dos direitos humanos e do meio ambiente encontrados em qualquer ponto das cadeias de fornecimento de empresas europeias, em um efeito que certamente atingirá os exportadores brasileiros.
‘Fale sobre dinheiro comigo’
Gestores que quiserem captar recursos em 2025 também deverão estar atentos às questões ESG, diz Buosi – em especial aqueles que pretendem levantá-los com instituições financeiras em desenvolvimento. “Essas instituições estão cada vez mais alinhadas aos requisitos de sustentabilidade, tanto no que diz respeito ao cumprimento socioambiental como às melhores práticas de diversidade e inclusão e alinhamento ao Acordo de Paris.”
Essas investigações, colaboradas pelos investidores institucionais, também contribuíram para a maior inclusão de aspectos ESG nas diligências para operações de dívida ou aquisição de ativos, diz ela.
Nas empresas, a expectativa de Buosi é que as questões ESG saiam da agenda institucional para a alocação de capital, a partir de um plano financeiro traçado pelas governanças que consideram os impactos desses temas sobre o valor e os resultados da companhia.