A partir de milhares de imagens feitas por seus fotógrafos ao redor do mundo, a revista National Geographic apresentou, na sua edição de dezembro, as imagens selecionadas como aquelas que mais nos emocionaram e inspiraram seus leitores.

Entre as 25 fotos selecionada, uma tem como personagem o pescador Damião Carlos da Silva, vítima da mineração predatória da Braskem, residente no Flexal de Baixo em Maceió.

A foto dele com um franguinho de estimação encostado na sua cabeça foi produzida pela fotojornalista Maíra Erlich, natural do Recife (PE), escolhida pela National Geographic como uma das 25 melhores imagens de 2025.

O registro numa das revistas mais respeitadas do mundo faz parte de um projeto documental que acompanha o afundamento de bairros em Maceió, causado pela extração de sal-gema pela Braskem.

Intitulada “Shoulder to lean on” (Ombro amigo, em tradução livre), a fotografia retrata Damião Carlos da Silva, um morador que precisou abandonar a casa onde viveu por mais de 20 anos após o solo ceder às margens da Lagoa Mundaú.

“Na imagem, ele aparece com seu pintinho de estimação apoiado no ombro, um símbolo de afeto e resistência em meio ao caos provocado pelo desastre ambiental”, destaca trecho de uma matéria nas mídias sociais.

A notícia despertou o interesse da reportagem da Tribuna Independente, que conversou com a jornalista autora da foto e visitou seu Damião, em sua casa, na Rua Tobias Barreto, no Flexal de Baixo, em Maceió.

“Eu não aguento mais morar aqui, com o que restou dos meus bichinhos de estimação. Gostaria que a prefeitura ou a Braskem tirassem a gente daqui”, disse ele, que reside com a mulher Luzia Odete da Silva e dois netos em uma casa apertada, com telhado precário ou banheiros entupidos e os fundo para o mangue da Lagoa Mundaú.

“Fui retirado do meu barraco na beira da lagoa, onde eu pescava praticamente todos os dias, criava meus animais e tirava da lagoa o sustento da minha família. Agora, vivo nesse sufoco, bancado pelo aluguel social pago pela prefeitura”, acrescentou Damião.

Ele disse que prometeram um apartamento para ele num conjunto residencial construído pelo programa do governo federal ‘Minha Casa, Minha Vida’, no bairro da Santa Amélia. Os apartamentos já estão prontos, mas até agora nada. Ainda não foi entregue.

“Só promessa, moço. Só promessa”, disse ele, tirando o chapéu da cabeça e alisando a careca. “Se pelo menos tivessem arrumado uma casa melhor, para a gente morar, mas com 250 reais de aluguel social não dava para arrumar outra casa”, reclama, resignado.

O pescador disse que torce para a Justiça dar ganho de causa a uma ação civil pública impetrada pela Defensoria Pública do Estado, para realocar os moradores dos Flexais, com indenizações justas e danos morais pagos pela Braskem.

PARAIBANO

Damião é paraibano de nascimento, mas mora em Alagoas desde menino, quando parte de sua família se mudou para o Estado. Ele espera que, com a repercussão dessa foto, a sua situação e resolva e o poder público, em parceria com a Braskem, encontre um local decente e aconchegante para ele morar com sua família.



Na beira da lagoa, ele ganhava a vida trabalhando como pescador, criando galinhas, porcos e até cavalo.

“Derrubaram as minha baias, onde eu tinha um cavalo e uma besta. A criação eu tiver que vender às pressas, por qualquer preço, para não perder tudo. Tive um prejuízo danado com essa mudança promovida pela Braskem e até agora nada, só promessas”, relata, angustiado.

Com 58 anos de idade e sem a força de trabalho que tinha quando mais moço, Damião aguarda uma aposentadoria e uma casa ou um apartamento para morar. Ele batalha também pela renovação de seu cadastro como pescador, que que possa voltar a viver da pesca e da retirada de sururu da lagoa.

“Tenho esperança de regularizar a minha situação na Colônia de Pescadores aqui dos Flexais, mas não se vai ter precisão, porque não temos mais peixe na lagoa e o sururu também desapareceu. Quando aparece é pouco, miúdo e não dá para todo mundo”, completa.

As causas da poluição do complexo lagunar Mundaú/Manguaba são muitas, mas um dos vetores é a grande quantidade de resíduos químicos despejados em suas águas ao longo de cinco décadas de extração de sal-gema para a abastecer a planta de cloro/soda da fábrica da Braskem, localizada no Pontal da Barra, em Maceió.

FOTÓGRAFA

A fotógrafa Maíra Erlich conta que a foto selecionada é fruto de um projeto desenvolvido por ela e contemplado com recursos disponibilizados por um edital cultural. Com a aprovação do projeto, ela passou a visitar Maceió no final de 2023, quando ocorreu o colapso da Mina 18 da Braskem.

Ela é pernambucana da capital Recife, mas reside em São Paulo há 8 anos. É fotógrafa há 20 anos e fotojornalista há 4 anos. Atua como fotojornalista para grandes veículos de comunicação do mundo.


Foto de Damião que viralizou (Foto: Maíra Erlich / National Geographic – Reprodução)


Além da foto selecionada e publicada na última edição da revista National Geographic, ela tem um acervo precioso de imagens, que deverá servir de base para uma exposição em 2026.

Maíra planeja mostrar em uma exposição, as fotos em Maceió, para que as pessoas tenham acesso a esse material relacionado com a tragédia da mineração. A ideia é para “quando conseguir recursos.”

Sempre que vem à capital alagoana, Maíra faz questão de visitar Damião e a família, no Flexal de Baixo. “Fiz amizade com ele, e a sua esposa, durante a realização desse projeto, que tem como objetivo dar visibilidade à luta das vítimas do afundamento do solo, provocado pela mineração de sal-gema, em Maceió”, concluiu.

By Daniel Wege

Consultor HAZOP Especializado em IA | 20+ Anos Transformando Riscos em Resultados | Experiência Global: PETROBRAS, SAIPEM e WALMART

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