Equipe técnica da CPI visita frigoríficos e abatedouros que operam próximos ao Melchior
Como parte das investigações sobre as causas da poluição do Rio Melchior, o corpo técnico da CPI foi a campo nesta quarta-feira (26) para conferir as condições de operação de quatro empresas do ramo alimentício que atuam às margens da bacia do rio. O grupo inspecionou os locais – que atuam no ramo de frigorífico, abatedouro e indústria de ração animal – no que se refere ao manejo dos resíduos da produção.
Para o secretário da CPI, Giancarlo Chelotti, as visitas contribuem de forma significativa para a evolução dos trabalhos da comissão, pois vão ajudar a embasar o relatório final, que será apresentado em 15 de dezembro.
“É importante a gente conhecer in loco para verificar se as informações que eles prestam para a CPI correspondem à realidade do local e também para conhecer alguns processos de tratamento do efluente”, avalia Chelotti.
Despejo de efluentes
As empresas visitadas informaram que utilizam o processo fertirrigação para a destinação dos resíduos líquidos oriundos da produção e que não há despejo desse material sendo realizado no Melchior, seja diretamente no rio ou no lençol freático.
A fertirrigação consiste em aproveitar os efluentes líquidos gerados durante o abate e processamento de animais para irrigar áreas agrícolas, após tratamento adequado. Esse material passa por etapas de separação e remoção de sólidos, flotação para retirada de gorduras e tratamento biológico em lagoas anaeróbias e aeróbias, garantindo a estabilização da carga orgânica.
Após análises de controle, o efluente tratado, rico em nutrientes como nitrogênio, fósforo e potássio, é aplicado no solo por sistemas de irrigação, funcionando como fertilizante natural para pastagens ou culturas agrícolas.

Posicionamento das empresas
A Suinobom Alimentos, que atua no abate e processamento de suínos, informou que opera com uma vazão diária de efluentes próxima a 146,34 m³ por dia, enquanto as outorgas concedidas pela Agência Reguladora de Águas (ADASA) garantem disponibilidade hídrica superior à demanda, totalizando 148 m³ por dia.
A empresa, que abate em média 220 animais diariamente, e que utiliza o sistema de fertirrigação para destinação dos efluentes gerados, alegou que possui as outorgas dos órgãos ambientais em dia e que o licenciamento ambiental está em processo de análise no Instituto Brasília Ambiental (Ibram). A Suinobom afirmou ainda que, em seus processos de manejo de efluentes, remove 95% da carga orgânica do parâmetro DBO (Demanda Bioquímica de Oxigênio) exigido pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA).
A Bonasa Alimentos, que opera na engorda e revenda de suínos, afirmou que também não despeja resíduos no leito do corpo hídrico, uma vez que utiliza um sistema denominado cama sobreposta no processo de manejo dos dejetos produzidos pelos animais.
A técnica consiste em manter os animais sobre um leito formado por materiais secos e absorventes, como a palha de arroz, que recebem os dejetos e passam por um processo de compostagem aeróbia dentro da própria instalação. Essa compostagem reduz odores, emissões de gases e elimina a necessidade de manejo de dejetos líquidos, transformando os resíduos em fertilizante orgânico.
“Esse sistema não traz nenhum malefício para o meio ambiente. Além disso, a gente tem uma grande preocupação ambiental: nossos poços artesianos são outorgados e todo o tratamento de dejetos é feito conforme preconizado pela legislação ambiental”, declarou Aroldo Amorim, gestor de operações da empresa.

A comitiva vistoriou também a Frigocan Indústria e Comércio de Subprodutos de Origem Animal, que processa de 20 a 30 toneladas de alimentos por dia para a produção de ração para aves. A empresa detalhou as etapas de produção e mostrou como é feito o despejo dos efluentes em bacias de contenção.
A Frigocan recebe o excedente da produção de frigoríficos do Distrito Federal e de Goiás, como vísceras, ossos e outras partes não destinadas ao consumo humano, processa esse material em caldeiras e produz a ração em forma farinha que é vendida para avicultores.
Um subproduto desse processo é uma graxa que é destinada à produção de óleo diesel e sabão. O efluente líquido final é direcionado aos tanques de contenção para, após tratamento, ser utilizado para fertirrigação na própria área da indústria.
Por fim, os técnicos da CPI visitaram a Prata Alimentos, produtora de linguiça. A indústria produz cerca de 6 mil quilos do produto diariamente, também utiliza a fertirrigação e está localizada a cerca de 500 metros do Córrego Taguatinga, que integra a Bacia do Rio Melchior. A empresa detalhou seu processo produtivo e afirmou estar regular quanto às licenças ambientais.
“A gente segue rigorosamente todos os critérios técnicos exigidos pelo Ibram (Instituto Brasília Ambiental). Fazemos um tratamento [de efluentes] que atende à Conama, atingindo até 70 % da eficiência. Com relação à bacia do rio, não temos despejo, pois todo efluente é disposto em valas de infiltração”, afirmou o responsável técnico pelo licenciamento da empresa Fernando Dias.

Avaliação preliminar
A consultora legislativa da CLDF Isabela Lustz, que compõe o corpo técnico da CPI, avalia que as inspeções foram produtivas para os subsídios técnicos necessários ao andamento da CPI.
Para ela, apesar de as empresas terem demonstrado que os efluentes não são despejados diretamente no rio, o processo “gera preocupação”, pois o resíduo, conforme os processos de destinação utilizados, pode, ainda sim, penetrar o solo gerando contaminação na água subterrânea e afetando o Melchior.
Lustz afirmou que, para uma avaliação mais precisa acerca da possibilidade de contaminação pelas indústrias alimentícias, seria necessário um exame laboratorial de amostras do efluente, mas que, com base no que viram, já foi possível identificar ocorrências que inspiram preocupação, como lagoas de contenção transbordando para locais sem impermeabilização.
“Numa análise visual, que não é a ideal, a gente percebeu espuma e restos de resíduos. Então, é preocupante, sim, esse efluente dessa forma”, declarou.
A próxima reunião da CPI do Rio Melchior está marcada para quinta-feira (27), às 10h, ocasião em que será ouvido o presidente da SP Regula, João Manoel da Costa Neto.
