Belém do Pará, a cidade que sediará a conferência sobre mudanças climáticas da ONU, a COP-30, está sob críticas severas – e todas procedentes. A quase três meses de seu início, um grupo de 29 negociadores internacionais, incluindo representantes africanos e de nações desenvolvidas como Canadá e Noruega, respeitadas em matéria climática, assinou um documento no qual alertam para o óbvio: se os problemas de hospedagem e falhas de infraestrutura da cidade não forem resolvidos imediatamente, parte da conferência deveria ser transferida para outro local. A carta fala em problemas concretos, como hotéis insuficientes e caríssimos, insegurança, transporte precário e ausência de garantias para que as delegações participem com conforto e segurança.

Há meses as queixas vêm se repetindo, sem que o governo de Lula da Silva, a presidência da COP-30 e o governador Helder Barbalho demonstrem capacidade de reação à altura. Mesmo não signatários do documento, como China, Alemanha e Reino Unido, têm expressado ao Brasil e à ONU temores sobre as condições para Belém receber as comitivas oficiais e representantes da sociedade civil. Três meses atrás, diante da incerteza do problema básico de hospedagem, maior fator de apreensão, já se levantava a hipótese de redução drástica das delegações oficiais e transferência da cúpula de chefes de Estado.

“Não vamos nos mudar”, garantiu o presidente da COP-30, André Corrêa do Lago, em comentário à divulgação da carta. Mas a pressão existe e, por ora, a única certeza é a incerteza se essa convicção vai se confirmar. E mesmo que se consiga aplacar os temores internacionais, o risco está posto: a primeira conferência no Brasil, difundida como a “COP da implementação”, corre o risco virar a “COP do vexame”, e o que poderia ser um marco para o protagonismo do País na agenda climática global ameaça tornar-se um desastre logístico e político de proporções amazônicas.

Os maiores receios recaem sobre representantes de países mais pobres, sobretudo os africanos, além de movimentos sociais, organizações da sociedade civil e ativistas de todo o mundo. Com preços escorchantes, são eles os maiores candidatos a ficar de fora, incluindo os povos indígenas e as comunidades tradicionais da Amazônia. Um tiro de morte no simbolismo prometido por Lula da Silva ao lançar a candidatura de Belém, ao desejar levar ao mundo o peso e a experiência da floresta para a luta climática – e, de quebra, apresentar-se como o salvador do planeta.

Originalmente a ideia tinha sua lógica, sobretudo para um governo afeito a anúncios grandiosos e adepto mais à forma do que ao conteúdo: um evento climático às portas da maior floresta tropical do mundo. Mas, para que desse certo, seria imprescindível uma grande, ágil e organizada preparação. Foram quase três anos desde quando o Brasil se candidatou a sediar a COP, tempo suficiente, portanto, para o País fazer o que era necessário. E se não o fez, não foi por falta de aviso.

Primeiro, já se sabia que Belém era uma cidade de infraestrutura deficiente, pontilhada de esgoto a céu aberto e sem quantidade compatível de leitos de hotel para um evento global desse porte. Segundo, o País se recorda dos embaraçosos problemas na preparação da Copa de 2014 e da Olimpíada de 2016, que entraram para a História pelos atrasos, superfaturamento e legados não concretizados. Estádios hoje subutilizados, sistemas de transporte inacabados, obras abandonadas e promessas esquecidas afligiram o País e macularam nossa imagem internacional. Nas duas ocasiões, o governo da então presidente Dilma Rousseff garantiu até o fim que tudo estava sob controle. Não estava.

Diante das súplicas internacionais e do constrangimento brasileiro, é preciso admitir: a escolha de Belém foi um erro. Obras, instalações e ampliações previstas, mesmo que concluídas tardiamente, acabarão ociosas no dia seguinte à COP-30. E quem bancará a combinação entre extravagância e incompetência são aqueles que mais sofrerão as consequências das mudanças climáticas debatidas na conferência. Belém foi escolhida pelo seu simbolismo. Debalde, pois não há simbolismo que cumpra o que só a eficiência, o planejamento e o respeito ao dinheiro público podem resolver.

By Daniel Wege

Consultor HAZOP Especializado em IA | 20+ Anos Transformando Riscos em Resultados | Experiência Global: PETROBRAS, SAIPEM e WALMART

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