Ver uma supernova a bilhões de anos-luz de distância deveria ser, em termos práticos, impossível. A luz chega fraca demais, diluída pela expansão do cosmos. Mas a natureza, às vezes, oferece atalhos inesperados. Em um achado notável, uma equipe internacional de astrônomos conseguiu detectar uma supernova superluminosa localizada a cerca de 10 bilhões de anos-luz da Terra graças a um efeito raro conhecido como lente gravitacional — criando uma imagem que lembra a famosa “Cruz de Einstein”.
O objeto, batizado de SN 2025wny, se tornou a primeira supernova superluminosa já observada com esse tipo de amplificação cósmica. O estudo foi publicado no The Astrophysical Journal Letters e marca um avanço importante tanto na observação de explosões estelares extremas quanto na compreensão da expansão do universo.
Um telescópio construído pela gravidade
A descoberta começou de forma quase acidental. Durante uma varredura rotineira do céu em busca de eventos transitórios — fenômenos breves como supernovas — os astrônomos notaram algo estranho: um grande borrão de luz com duas galáxias aparentemente “na frente”. Análises posteriores, feitas com outros telescópios, revelaram que o brilho vinha de uma supernova excepcionalmente energética.
As duas galáxias em primeiro plano estavam desempenhando o papel de uma lente gravitacional. De acordo com a relatividade geral de Albert Einstein, objetos muito massivos deformam o espaço-tempo ao seu redor. Quando a luz de algo distante passa por essa região distorcida, ela é desviada, ampliada e, em alguns casos, dividida em múltiplas imagens.
“Isso é o telescópio da própria natureza”, explicou Joel Johansson, autor principal do estudo e astrofísico da Universidade de Estocolmo. No caso da SN 2025wny, o efeito foi impressionante: o brilho da supernova foi amplificado em cerca de 50 vezes, tornando observável algo que, de outra forma, estaria completamente fora do nosso alcance.
Uma imagem que parecia um erro — mas não era
O fenômeno óptico produzido pela lente gravitacional fez a supernova aparecer como uma imagem fragmentada, com múltiplos pontos de luz surgindo em posições ligeiramente diferentes. Cada um desses “ecos” luminosos corresponde à mesma explosão, mas seguindo caminhos distintos pelo espaço-tempo até chegar à Terra — e, portanto, chegando em momentos diferentes.
“Eu não acreditei quando vi os dados pela primeira vez. Achei que fosse um defeito da câmera”, contou Jacob Wise, coautor do estudo e doutorando em Estocolmo. Ao revisar observações de noites anteriores, porém, ficou claro que o padrão persistia.
Para confirmar a descoberta, a equipe acionou rapidamente o Observatório Keck, no Havaí, que obteve os espectros do objeto. O resultado foi inequívoco: tratava-se de uma supernova superluminosa, um tipo raro de explosão estelar que pode ser dezenas ou centenas de vezes mais brilhante do que supernovas comuns.
O que torna essa supernova tão especial
Supernovas superluminosas já são raras por si só. Observá-las a uma distância tão extrema, graças a lentes gravitacionais, é algo inédito. A SN 2025wny passa a ocupar um lugar especial na história da astronomia por combinar dois fenômenos extremos: uma explosão estelar colossal e a amplificação causada pela curvatura do espaço-tempo.
Essa combinação oferece oportunidades científicas únicas. Um dos aspectos mais promissores é a possibilidade de usar o atraso entre as múltiplas imagens da supernova para medir a taxa de expansão do universo — a chamada constante de Hubble.
Esse valor é hoje motivo de intenso debate, pois medições feitas com diferentes métodos não concordam entre si, gerando o que os cientistas chamam de “tensão de Hubble”. Eventos como o da SN 2025wny podem ajudar a esclarecer se essa discrepância aponta para novas leis da física ou apenas limitações nos métodos atuais.
Um vislumbre do futuro da astronomia
A equipe já iniciou observações de acompanhamento com dois dos instrumentos mais poderosos da atualidade: o Telescópio Espacial Hubble e o James Webb. A expectativa é extrair o máximo de informações possíveis sobre a explosão, o ambiente ao redor e as galáxias que atuaram como lentes.
Mais do que uma curiosidade isolada, a descoberta sinaliza uma nova fase da astronomia moderna, na qual diferentes técnicas — observações ópticas, espectroscopia e lentes gravitacionais — são combinadas para estudar um único objeto. Nesse sentido, a SN 2025wny não é apenas um recorde distante, mas um prenúncio do que está por vir.
Ao usar a própria estrutura do universo como instrumento de observação, os astrônomos estão começando a enxergar explosões estelares de uma época em que o cosmos ainda era jovem. E, com isso, talvez cheguem mais perto de responder uma das maiores perguntas da ciência: como, afinal, o universo evolui ao longo do tempo.
