Terminou nesta quinta-feira (13) o julgamento na Inglaterra que analisa a responsabilidade da mineradora BHP pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG). A previsão é que a juíza responsável pelo caso, Finola O’Farrell, divulgue a sentença até meados deste ano. Caso a mineradora seja considerada responsável pelo desastre, haverá uma nova fase do julgamento para determinar o montante a ser pago em indenizações, estimado em até R$ 260 bilhões.

Após o fim da audiência, o escritório Pogust Goodhead, que representa as vítimas no processo, realizou uma coletiva de imprensa para apresentar um balanço do julgamento e informar sobre os próximos passos.

“Hoje é um dia extraordinariamente importante em uma batalha que meus clientes vêm travando há nove anos e meio para obter justiça pelo pior desastre ambiental da história do Brasil. Batalhas por justiça nunca são rápidas, por mais que gostaríamos que fossem, mas todos nós temos lutado juntos neste caso”, disse o CEO do Pogust Goodhead, Tom Goodhead.

O advogado criticou a postura da BHP durante o julgamento e a conduta da mineradora ao lidar com os milhares de atingidos pelo rompimento.

“Ouvimos nos últimos meses de julgamento em Londres provas e evidências da responsabilidade da BHP em relação ao rompimento da barragem. O mundo precisa entender o que esta empresa fez. A BHP forçou centenas de milhares de vítimas a viajarem ao redor do mundo para brigar por justiça. É o pior comportamento corporativo já visto de uma empresa no mundo”, disse o advogado.

Goodhead explicou que, havendo uma sentença favorável e caso não haja acordo, o escritório pedirá à Justiça inglesa que os clientes recebam o quanto antes um pagamento provisório, antecipando parte da indenização devida enquanto o processo segue.

No caso da cidade de Mariana, por exemplo, o Pogust Goodhead pedirá que ao menos R$ 1,2 bilhão sejam antecipados, por ser um valor já reconhecido pelas mineradoras no acordo de repactuação como devido ao município. “É uma antecipação das indenizações. A lei inglesa (Código Processual Civil – Regra 25) prevê a possibilidade de receber uma parte do pagamento antes do fim do litígio”, explicou.

O prefeito de Mariana, Juliano Duarte, foi a Londres para acompanhar o último dia de alegações finais. A cidade não aderiu ao processo de repactuação firmado entre mineradoras, Governo Federal e governos de Minas Gerais e Espírito Santo. Durante a coletiva, ele explicou que o acordo não teve participação dos municípios e os valores oferecidos, além de baixos, serão pagos ao longo de 20 anos.

“Infelizmente, no Brasil, o processo foi conduzido da pior maneira possível, sem ouvir diretamente quem foi atingido. O problema está nas cidades, não no governo federal ou estadual. Ele bate à porta das prefeituras todos os dias. E temos certeza de que, aqui na Inglaterra, teremos voz e conquistaremos uma indenização justa, por Mariana, pelos atingidos e por todos que, indiretamente, sofreram com o rompimento da barragem”, ressaltou o prefeito.

Três vítimas, moradoras de Bento Rodrigues, viajaram a Londres para acompanhar de perto a fase final do julgamento. Durante a coletiva, Gelvana Rodrigues, Monica dos Santos e Pamela Fernandes relataram a dor sofrida após perder entes queridos, casas e pertences no desastre.

“Viver isso por tantos anos tem sido uma verdadeira tortura”, disse Pamela Fernandes, mãe de Emanuele, de 5 anos, que morreu na tragédia. “Sei que a condenação da BHP trará um pouco de paz para mim, para minha filha e para o Thiago (outra criança vítima do rompimento). Eles precisam dessa paz. Não falo apenas de

justiça, mas de um alívio interior. A saudade e a dor continuarão comigo até o fim da minha vida, mas ao menos teremos um pouco de paz. Agora, estou voltando ao Brasil com mais esperança do que quando cheguei”, completou.

Quatro meses de julgamento

O processo coletivo — movido por cerca de 620 mil vítimas, comunidades tradicionais indígenas e quilombolas, empresas e 31 municípios — durou 13 semanas e interrogou sete testemunhas que estiveram em postos-chave da BHP. Os réus responderam perguntas sobre o nível de controle que BHP tinha sobre a barragem, o conhecimento sobre problemas da estrutura e a conduta da empresa após o desastre.

Além disso, a Corte inglesa ouviu os especialistas em direito civil, societário e ambiental brasileiros – já que o julgamento se fundamenta na legislação do Brasil – e questões geotécnicas. Entre oitivas e sessões com especialistas, foram 42 sessões e aproximadamente 210 horas de audiência.

Nos últimos dias de julgamento, as partes expuseram seus argumentos finais. A defesa dos atingidos reforçou que a BHP, na condição de acionista controladora da Samarco juntamente com a Vale, ignorou sinais de alerta de que uma barragem de grande porte estava em condição precária antes de seu colapso, que resultou na morte de 19 pessoas.

Os advogados defenderam a tese baseada no princípio do ‘poluidor-pagador’. Ou seja, uma empresa que causa poluição por meio de uma joint venture não pode se eximir de sua responsabilidade.

Durante a coletiva, o ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, que advoga em parceria com o escritório Pogust Goodhead, abordou as evidências apresentadas na Corte. “Tenho absoluta convicção de que as provas produzidas contra a BHP são avassaladoras. Tudo indica que os valores a serem determinados na Inglaterra serão significativamente superiores aos fixados no acordo firmado no Brasil. E é exatamente por isso que a BHP correu para fechar esse acordo da repactuação, após anos de inércia”, enfatizou.

No encerramento do julgamento, nesta quinta, a juíza Finola O’Farrel, responsável pelo caso, agradeceu a participação de todos. “O caso foi identificado como desafiador, mas alcançável, e nós conseguimos”, resumiu.

Próximos passos

Com o fim das audiências do julgamento de responsabilidade, a juíza O’Farrell deverá decidir no Tribunal Superior de Londres se a BHP é responsável pelo desastre. Na segunda fase, um novo julgamento será realizado para determinar os danos causados às vítimas e os valores das indenizações.

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By Daniel Wege

Consultor HAZOP Especializado em IA | 20+ Anos Transformando Riscos em Resultados | Experiência Global: PETROBRAS, SAIPEM e WALMART

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