Nesta quarta-feira (12), a NASA estava pronta para lançar sua mais recente missão robótica a Marte, a ESCAPADE, a bordo de um foguete da empresa Blue Origin. No entanto, o lançamento foi cancelado devido à “atividade solar extremamente elevada e seus potenciais efeitos” na espaçonave, informou a empresa em publicação nas redes sociais.
Na terça-feira (11), duas explosões de material solar, provocadas por um par de poderosas ejeções de massa coronal — enormes explosões na superfície do Sol que liberam fluxos de partículas carregadas — colidiram com a bolha magnética da Terra no espaço. O fenômeno gerou espetáculos de luz nos céus noturnos, que podem voltar a ser vistos entre a noite de quarta e quinta-feira. Mas as tempestades solares e a atividade contínua também exigiram monitoramento rigoroso das frotas de satélites em órbita e das missões em curso.
Atividade solar atinge pico do ciclo de 11 anos
“A história mostra que essas ejeções de massa coronal compostas e tempestades sobrepostas são as mais significativas para os efeitos do clima espacial”, explicou Daniel Baker, cientista do Laboratório de Física Atmosférica e Espacial da Universidade do Colorado, em Boulder. “É exatamente isso que estamos vivenciando agora.”
A atividade solar, que segue um ciclo de aproximadamente 11 anos, atingiu seu pico no ano passado. Segundo Baker, o período pós-pico costuma concentrar as erupções solares, explosões e outras manifestações de maior intensidade. Quando direcionadas à Terra, essas atividades podem gerar tempestades geomagnéticas, capazes de perturbar a magnetosfera — camada protetora que resguarda o planeta da radiação solar prejudicial.
Nos últimos dias, três ejeções de massa coronal foram lançadas pelo Sol, entre domingo e terça-feira. Duas delas se combinaram e atingiram a atmosfera terrestre na terça, aumentando o risco de apagões de rádio, falhas elétricas e desvios em rotas aéreas.
Dezenas de satélites em órbita também foram ameaçados. Conforme a engenheira Kerri Cahoy, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), o risco varia conforme a altitude. Satélites em órbita baixa podem sofrer anomalias, como perda de sinal e reinicializações. Ainda assim, a atmosfera terrestre e o campo magnético oferecem alguma proteção natural a esses equipamentos, segundo Cahoy.
Em altitudes mais elevadas, onde o campo magnético da Terra é mais fraco — e onde orbitam sistemas como GPS e satélites meteorológicos —, as naves ficam expostas a doses muito maiores de radiação. Nessas condições, a magnetosfera pode se deformar ou se desprender, deixando os satélites vulneráveis aos efeitos do clima espacial.
“Mas eles são construídos para isso”, disse Cahoy. “As espaçonaves em órbitas mais altas são projetadas com blindagem especial, resistente à radiação solar. Ninguém envia um satélite para lá sem essa proteção.”
No passado, segundo Baker, a maioria dos satélites era “resistente à radiação”. Hoje, porém, muitos modelos comerciais em órbita baixa não possuem essa característica, tornando-os mais suscetíveis a falhas e interrupções de comunicação.
Risco de colisão e danos motiva cancelamento da missão ESCAPADE
As ejeções de massa coronal também aquecem e expandem a atmosfera terrestre, o que pode alterar a resistência do ar em altitudes mais baixas. Em 2024, uma tempestade geomagnética fez alguns satélites da NASA caírem mais de trezentos metros. Em 2022, um evento semelhante deixou 40 satélites recém-lançados da SpaceX inoperantes.
Muitos satélites operam em altitudes fixas, e variações podem comprometer seu desempenho. Ajustes nas trajetórias para compensar o arrasto atmosférico aumentam o risco de colisões — tanto com outros satélites quanto com os milhões de fragmentos de detritos espaciais que orbitam o planeta.
Ao comentar a decisão de adiar a missão ESCAPADE, o cientista Rob Lillis, investigador principal do projeto, afirmou que o lançamento teria ocorrido se a atividade solar tivesse cessado na terça-feira. No entanto, na manhã de quarta, a NASA recebeu nova previsão indicando outra ejeção de massa coronal no momento em que os dois orbitadores seriam liberados do foguete.
“Algumas etapas críticas precisavam ocorrer”, disse Lillis. A radiação poderia danificar os computadores das espaçonaves e impedir a abertura dos painéis solares. “Não queríamos correr o risco de fazer isso em um ambiente ainda mais perigoso.”
Baker reforçou que o cancelamento também evita riscos de colisão. Durante tempestades geomagnéticas, a NASA e outras agências espaciais perdem dados essenciais de rastreamento, que precisam ser recuperados antes de qualquer lançamento. “As chances de colisão aumentam consideravelmente”, explicou. “E a última coisa que você quer é bater em alguma coisa.”
Enquanto isso, o lançamento de um satélite da empresa global de comunicações Viasat, previsto para quinta-feira, segue confirmado — por ora. A United Launch Alliance, responsável pelo foguete, informou em nota que está “monitorando de perto a atividade solar” e que o time de meteorologia espacial “reavaliará as condições antes da contagem regressiva”.
Em boletim divulgado na tarde de quarta (12), o Centro de Previsão do Clima Espacial da NOAA confirmou a chegada de uma ejeção de massa coronal ainda mais intensa e veloz que as anteriores. Os efeitos devem se estender até quinta-feira. Segundo o Serviço Geológico Britânico, essa pode ser “a maior tempestade solar a atingir o planeta em mais de duas décadas”.
Baker comparou os impactos atuais à série de tempestades de Halloween de 2003, que atingiram a magnetosfera da Terra. Naquele período, havia apenas algumas centenas de satélites em órbita baixa — hoje, são milhares.
Mesmo assim, as agências de monitoramento espacial estão mais preparadas. “Não sabemos ao certo o que o Sol ainda pode nos reservar”, disse Baker. “Mas esperamos que, como comunidade científica, estejamos cada vez mais aptos a evitar as consequências mais graves.”
