O Supremo Tribunal Federal (STF) reuniu, nesta quinta-feira (27), lideranças comunitárias, organizações representativas, associações locais, pesquisadores, operadores do direito e instituições da sociedade civil na terceira edição do STF Escuta. A iniciativa busca ampliar e qualificar canais de diálogo, acolher narrativas e compreender barreiras que dificultam o acesso desses grupos à Justiça.
Todos os relatos apresentados – presencialmente, por videoconferência ou por formulário online – serão consolidados em um relatório que orientará o aperfeiçoamento das práticas institucionais do Tribunal e será encaminhado ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e a todos os ramos do Judiciário.
Conduzido pela juíza-ouvidora do STF, Flávia da Costa Viana, o encontro decorre da constatação da baixa participação de povos e comunidades tradicionais nos canais oficiais da Ouvidoria. “Identificamos barreiras linguísticas, culturais, geográficas e informacionais que afastam essas populações dos canais formais de escuta”, observou. “Precisamos ouvir mais e ouvir melhor.”
De acordo com a ouvidora, o STF Escuta foi concebido como um espaço de acolhimento e confiança. “Não se trata de discutir processos judiciais, mas de criar um ambiente sensível, direto e qualificado de comunicação”, afirma.
As lideranças e os representantes inscritos apresentaram diagnósticos, desafios e percepções sobre o acesso à Justiça e sugestões para fortalecer a relação entre instituições públicas e comunidades tradicionais. As manifestações destacaram um conjunto grave e contínuo de violações de direitos que afetam diretamente seus territórios, seus modos de vida e sua segurança.
O encontro também contou com a participação de representantes do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, da Ouvidoria do STF e da Ouvidoria da Mulher.
Preocupações
Entre as principais preocupações relatadas estão a poluição de rios por atividades minerárias, doenças decorrentes de contaminação ambiental, grilagem, desmatamento, violência armada, ameaças e assassinatos de defensores de direitos humanos. Também foram mencionadas restrições impostas por unidades de conservação criadas sem consulta prévia. Também houve menção à expansão de grandes empreendimentos, como mineração, agronegócio, energia eólica e fotovoltaica, que avançam sobre áreas tradicionais sem respeitar protocolos comunitários e geram conflitos, criminalização e expulsão de famílias.
Houve ainda relatos sobre a ausência ou a insuficiência de políticas públicas essenciais, a falta de regularização fundiária e o sentimento persistente de invisibilidade e vulnerabilidade diante do Estado. Outro ponto recorrente nas intervenções foi a crítica às barreiras ao acesso ao sistema de Justiça, sejam elas geográficas, linguísticas, culturais, econômicas ou estruturais.
As lideranças mencionaram deslocamentos longos e custosos, falta de internet em aldeias, decisões judiciais que ignoram contextos socioculturais, morosidade processual e interpretações que desconsideram territorialidades e identidades coletivas. Reivindicaram, ainda, formação especializada para magistrados, fortalecimento de ouvidorias, mediação intercultural adequada e respeito integral à consulta livre, prévia e informada. Em comum, a demanda para que o Estado, especialmente o Judiciário, atue com efetividade na garantia dos direitos constitucionais, territoriais, ambientais e culturais desses povos.
(Pedro Scartezini//CF)
