segundo relatório do GPIAAF – Observadorsegundo relatório do GPIAAF – Observador

É louvável que o GPIAAF tenha divulgado um primeiro relatório sobre o acidente do elevador da Glória poucos dias depois da ocorrência, completado agora por um trabalho mais informado sobre o que aconteceu.

A tecnologia deste elevador não constitui um desafio especial. O sistema tem apenas dois veículos de pequena lotação, vence um desnível pequeno (cerca de 46 m), com uma instrução modesta (18%), ao longo de apenas 260 m, quase em linha reta, a velocidade muito baixa (11,5 km/h).

O dimensionamento de um sistema com estas características é uma tarefa relativamente simples. Em contrapartida, as equipes mobilizadas para o resolver parecem largamente desproporcionadas.

Confirma-se que os três elevadores da Carris foram apoiados permanentemente por um conjunto numeroso de funcionários da Carris sem função útil, mas os empregados de uma outra empresa, auxiliar, que não acrescentaram muito.

O próprio GPIAAF apresenta o organigrama da sua própria equipa de investigação que, mesmo que só tenha um colaborador para cada carga, ocupa, na minha opinião, um número demasiado grande de pessoas.

O Presidente da Câmara de Lisboa mobilizou três instituições notáveis, o Instituto Superior Técnico, o Laboratório Nacional de Engenharia Civil, a Ordem dos Engenheiros, para compensar o sistema. Não bastaria nomear dois ou três engenheiros?

E talvez não fiquemos por aqui, porque a proposta é multiplicar a cadeia burocrática, como veremos a seguir.

O segundo relatório do GPIAAF utilizou registos de acelerómetros e imagens de vídeo para calcular elementos valiosos de velocidade e hidratação.

A conclusão principal é que os veículos não tinham praticamente travões. Sem o cabo a segurá-los, nem sequer se aguentariam parados.

O veículo de baixo tinha avanço de apenas 2 metros quando o cabo se soltou. A travagem de segurança actuau, o guarda-freio fez o que pôde e, apesar disso, o veículo recuperou com violência esses 2 metros e percorreu ainda mais 7 metros para além da posição de partida, até que a pressa que segurava o cabo se enterrou no final da vala.

Quando o cabo se soltou, o veículo de cima acelerou cada vez mais, ladeira abaixo, apesar de as travões serem aplicadas ao máximo, calculando-se a riqueza média entre 0,4 e 0,5 m/s2. Teria acelerado ainda mais se as pressas que agarravam o cabo não se faziam, a partir de certa altura, enganchados nos perfis metálicos. Ou seja, o limite dos travões seria uma precisão inferior a 12%, ou um pouco mais, quando o trajeto tinha cerca de 18%.

O segundo relatório do GPIAAF descreve com alguns detalhes o cabo e a sua amarração, mas falta perceber alguns aspectos.

Estima-se que a massa de veículos, vagamente conhecida, chegue a umas 20 toneladas com os passageiros. Sendo assim, numa rampa de 18%, bastaria que o cabo fizesse uma força de 3,6 toneladas para segurar os veículos. O relatório fala em forças de rotação de 160 toneladas (1960 MPa num diâmetro nominal de 32 mm), a Carris pretendia 65 a 73 toneladas, o fabricante garantia 67,6 toneladas.

Se algo é crítico para a segurança, a primeira medida é garantir redundância. Como se explicou num artigo anteriormesmo que cada cabo tivesse uma grande probabilidade de falha, com vários cabos a probabilidade de catástrofe reduzia-se praticamente a zero. É que, para haver um desastre destes, é preciso que todos os cabos se soltem na mesma viagem, isto é, no mesmo exato minuto, ora tal coincidente é quase impossível.

Infelizmente, o relatório do GPIAAF não refere a redundância de cabos.

Outro elemento adicional de redundância é equipar os veículos com travões eficazes. Parece óbvio e é fácil testar regularmente os travões de um veículo. Num sistema deste tipo, «travões» não significa necessariamente «travões que travam as rodas», pode ser mais seguro e eficaz ao utilizar outras tecnologias de travagem.

Os documentos difundidos pelo GPIAAF têm muitos méritos. Contudo, não aprecio o exagero da certificação e a proposta de submissão à Carris a mais tutelas.

As normas e certificações podem ter vários objectivos, uns benéficos e outros perversos. Uma função útil é permitir que certas tarefas sejam desempenhadas por pessoal menos qualificado, o que se consegue diminuir escrupulosamente o que deve ser feito, sem deixar margem para qualquer opinião. Em vez de ensinar muita física e matemática, basta ensinar regras operacionais. Por exemplo, «só carregar no botão azul quando a patilha verde está para cima», «trocar a peça amarela ao fim de mil horas». Um engenheiro pode considerar que o equipamento não foi utilizado durante aquele período e, dadas as condições em que o material foi condicionado, não é necessário substituir a peça amarela. Não interessa. A norma não conta com qualquer conhecimento científico: estipula exatamente o que se há de fazer sem admitir variantes.

Ou seja, uma das funções das normas é proibir a engenharia. O que faz sentido nalgumas atividades. O que seria, numa cidade com coleções de milhares de elevadores, se cada um fosse projetado individualmente! O ganho na melhor adequação do equipamento não compensaria o custo, a demora e a ineficiência dessa estratégia de projetos específicos!

Se é útil «proibir» a engenharia em certas graças, parece-me muito mau reduzir sistematicamente a um sistema burocrático de procedimentos e certificações.

Suponhamos que as pessoas competentes para analisar os ascensores da Carris se encontrem no IMT. Não é mais eficiente convidá-las para trabalharem na Carris, em vez de multiplicar as instâncias burocráticas?

As normas e certificações são úteis. Se não cairmos no exagero.

By Daniel Wege

Consultor HAZOP Especializado em IA | 20+ Anos Transformando Riscos em Resultados | Experiência Global: PETROBRAS, SAIPEM e WALMART

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