Dias quentes, orla cheia e aquela água cristalina que anima qualquer banhista. Mas será que a praia está realmente adequada para banho? Apenas olhando para o mar, é difícil identificar se a qualidade da água é segura, já que muitos dos fatores que determinam isso não são visíveis.
Um dos principais é a presença de Enterococos, bactérias que indicam contaminação fecal e não podem ser vistas a olho nu. “A legislação estabelece — através da resolução 274/2000, do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA) — que a classificação deve considerar cinco semanas consecutivas de monitoramento. Nesse período, a praia é classificada como imprópria quando duas ou mais amostras apresentam resultados acima de 100 colônias de Enterococos por 100 mL, ou quando a última coleta ultrapassa 400 colônias por mililitro. Se esses limites não forem superados, a praia é considerada própria”, explica Cláudia Lamparelli, gerente do setor de águas litorâneas da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb), órgão responsável pelo monitoramento da qualidade ambiental no estado.
Cada estado tem seu órgão ambiental. Em São Paulo, a Cetesb acompanha 175 praias, cobrindo todo o litoral de Cananéia a Ubatuba. A coleta segue um padrão nacional: é semanal e realizada sempre no mesmo ponto, para garantir comparabilidade. “Essa amostra é coletada exatamente na faixa onde o banhista entra no mar e segue imediatamente para análise laboratorial microbiológica para detectar Enterococos”, detalha Cláudia.
Foco no verão
É nessa estação que acontece a combinação do aumento do fluxo de turistas com períodos de chuvas intensas. “Esse conjunto de fatores — mais uso da infraestrutura urbana e maior volume de água escoando pelas ruas e galerias — favorece o arraste de resíduos e matéria orgânica até o mar, o que pode elevar temporariamente a concentração de bactérias. Por isso, é comum observar mais oscilações na balneabilidade durante o verão, com condições mais estáveis quando o volume de chuvas diminui”, esclarece a especialista.
Além das chuvas, o lançamento irregular de esgoto, incluindo ligações clandestinas, está entre as principais causas de praias classificadas como impróprias.
Choveu forte? Atenção redobrada
As recomendações dos órgãos ambientais são unânimes: depois de chuvas intensas, o ideal é verificar a situação da praia antes de sair de casa. Ao chegar ao local, procure as bandeiras indicativas, sendo verde para própria e vermelha para imprópria.
Outra orientação é evitar o mar nas primeiras 24 horas após chuvas fortes, período em que o escoamento urbano pode alterar significativamente a qualidade da água.
“Nos trechos próximos a canais, córregos ou rios que deságuam no mar, é prudente manter distância, porque a qualidade tende a variar mais nesses pontos. Outro cuidado importante é evitar engolir água do mar, especialmente no caso de crianças e idosos”, enfatiza Cláudia. Ela também recomenda não levar animais domésticos à praia, tanto por questões sanitárias quanto de segurança.
Recentemente o Ministério do Meio Ambiente lançou o aplicativo “Praia Limpa”, que, em parceria com estados e municípios, reúne informações sobre balneabilidade ao longo do litoral brasileiro.
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Riscos à saúde
O banho em praias impróprias pode causar diversos problemas de saúde. Segundo Alberto Chebabo, infectologista e presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), as doenças mais frequentes são gastroenterites (com sintomas como vômito, diarreia e febre), hepatite A (que causa urina escura, olhos amarelados, náuseas), infecções de pele, otite externa e infecções oculares.
“Tanto a gastroenterite quanto a hepatite A são doenças de transmissão fecal-oral, que acontecem geralmente no momento de mergulho. Na pele, normalmente pode haver lesões, alergias, ou até mesmo algumas lesões de vermes, porque normalmente quando a água está contaminada, a areia também está contaminada”, explica o especialista. Os sintomas podem surgir entre 24 e 48 horas após o contato, embora a hepatite A tenha período de incubação de até 30 dias.
O médico destaca que, em praias impróprias, podem estar presentes bactérias, vírus e parasitas. “Dentro das bactérias, normalmente a Escherichia coli, que é uma bactéria de intestino, advindas de coliformes fecais. No caso dos vírus, os principais são norovírus e rotavírus, que causam diarreia importante. Entre os parasitas, pode haver em maior número a giardia”, completa.
No caso da hepatite A, ele reforça a importância da vacinação. “[A vacina] é uma das principais medidas de redução de risco de infecção, de transmissão, e está disponível na rede pública de saúde para as crianças.”
Ninguém está imune, mas há grupos mais vulneráveis
Qualquer pessoa pode se contaminar ao entrar em contato com água poluída, mas crianças, idosos, gestantes e imunossuprimidos exigem atenção especial. “Para as crianças, principalmente, porque muitas ainda não tiveram exposição prévia, não têm anticorpos, e acabam desenvolvendo muito mais facilmente as doenças relacionadas a essa exposição. Gestantes também são consideradas pessoas mais frágeis, principalmente pela desidratação ocasionada por quadros gastrointestinais”, explica Alberto.
Se surgirem sintomas de gastroenterite, a orientação é a hidratação oral imediata. Caso a pessoa não consiga ingerir líquidos devido aos vômitos, deve procurar atendimento médico sem demora. O mesmo vale para quadros de febre persistente ou sinais de desidratação. “Crianças muito pequenas, idosos, imunossuprimidos e gestantes devem buscar atendimento médico logo nos primeiros sintomas.”
Por fim, o infectologista reforça a importância de cuidados básicos durante a permanência na praia, como alimentação adequada, armazenamento correto dos alimentos e boa hidratação.
