Ciência

As “megaconstelações” de satélites em vão contaminar as imagens dos telescópios em órbita terrestre baixa, incluindo o Hubble.

Simulação da contaminação projetada por satélites num dos futuros telescópios espaciais. As faixas de luz refletidas pelos satélites artificiais de telecomunicações ofuscam a imagem de duas galáxias a interagir em segundo plano.

Simulação da contaminação projetada por satélites num dos futuros telescópios espaciais. As faixas de luz refletidas pelos satélites artificiais de telecomunicações ofuscam a imagem de duas galáxias a interagir em segundo plano.

NASA/Borlaff, Marcum, Howell/Nature

A órbita baixa da Terra tornou-se, em poucos anos, o sítio preferencial para as megaconstelações de satélites e isso está a colocar em risco as descobertas astronómicas.

Em apenas cinco anos, o número de satélites em órbita da Terra disparou – de cerca de 2 mil para 15 mil. Mas esse crescimento tem um custo: a poluição luminosa provocada pelos satélites ameaça a eficácia dos telescópios espaciais. 

De acordo com um estudo do Centro de Investigação Ames da NASA, publicado na Nature, se os lançamentos planeados de constelações de satélites avançarem sem restrições, até 560 mil satélites poderão orbitar a Terra em 2037 – o que tornará inúteis 40 % das imagens do Hubble e mais de 96% dos dados de outros telescópios espaciais serão perdidos.

Impacto nos telescópios espaciais

Nas simulações feitas pelos investigadores, a média de “rastros” de satélites por exposição varia conforme o telescópio: cerca de 2,14 para o Hubble, 5,64 para o SPHEREx, 69 para o ARRAKIHS e 92 para o Xuntian. 

Os cientistas usaram modelos que simulam imagens dos quatro telescópios – todos com órbitas entre os 400 e os 800 km de altitude – e avaliaram como os satélites planejados (de projetos como Starlink, OneWeb, Astra ou Guowang) afetariam as exposições. 

O cenário apresentado corresponde a um “pior caso” caso todas as constelações previstas sejam lançadas, mas os resultados demonstram claramente o risco: rastos visíveis, saturação de luz, perda de dados científicos e degradação de imagens essenciais para o estudo do Universo. 

Consequências para a ciência e vozes críticas

O estudo, liderado por Alejandro S. Borlaff, explica que a redução dos custos de lançamento de cargas úteis impulsionou a proliferação de satélites, mas o seu impacto nos telescópios científicos tem sido negligenciado.

Em declarações à plataforma Science Media Centre (SMC), Olga Zamora, astrónoma de apoio do Instituto de Astrofísica das Canárias (IAC), destacou a qualidade do estudo, que revela que os futuros lançamentos de constelações de satélites “colocam em risco os telescópios espaciais mais importantes do ponto de vista científico”.

Esta poluição luminosa tem implicações para a astronomia: rastros de satélites podem mascarar astros distantes, ocultar asteroides potencialmente perigosos ou simplesmente tornar inviáveis observações delicadas necessárias para estudar galáxias, matéria escura ou planetas extrassolares. 

Para Jorge Hernández Bernal, do Laboratório de Meteorologia Dinâmica da Universidade Sorbonne, CNRS (França), as megaconstelações são “simplesmente um sintoma de um sistema socioeconómico descontrolado. Com o seu desejo irracional de crescimento que não leva a lado nenhum, está-nos a arrastar para o colapso”, alertou.

“A solução reside numa verdadeira democratização do espaço. Isto implica, entre outras coisas, que as decisões sejam multilaterais, transparentes e abertas à sociedade civil internacional, em vez de serem tomadas às escondidas dos cidadãos e à mercê dos estados e das empresas privadas”, defendeu em declarações à SMC.

Alguns telescópios posicionados em órbitas mais distantes estão melhor protegidos da poluição luminosa. O estudo não analisou, por exemplo, os efeitos no Telescópio Espacial James Webb da NASA, no Observatório Euclid da Agência Espacial Europeia ou no Telescópio Espacial Nancy Grace Roman, também planeado pela NASA.

By Daniel Wege

Consultor HAZOP Especializado em IA | 20+ Anos Transformando Riscos em Resultados | Experiência Global: PETROBRAS, SAIPEM e WALMART

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