Um relatório de 374 páginas da Polícia Federal revela a engrenagem de um esquema milionário de corrupção judicial, manipulação de decisões e lavagem de dinheiro que alcança gabinetes do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Segundo as investigações, a Fource Consultoria, comandada pelos empresários Valdoir Slapak e Haroldo Augusto Filho, era o núcleo de uma rede com 41 vínculos empresariais formais 23 empresas ativas e 18 ex-sócias — utilizadas para movimentações financeiras, ocultação de patrimônio e fraudes processuais disfarçadas de reestruturação empresarial.
Estrutura para burlar credores e blindar patrimônio
De acordo com o relatório, a estrutura da Fource funcionava como mecanismo de blindagem patrimonial, permitindo que ativos financeiros fossem transferidos para fora do alcance da Justiça em casos de falência ou recuperação judicial.
A operação se sustentava em contratos simulados, notas fiscais falsas e cessões de crédito artificiais, criando uma fachada contábil que dava aparência de legalidade a transações ilícitas.
O expediente, segundo a PF, produzia dois efeitos principais:
- Esvaziava massas falidas, frustrando credores e comprometendo o pagamento de dívidas;
- Criava lastros fictícios, legitimando a circulação de valores com aparência de legalidade no sistema financeiro.
Conversas e transferências ligam o grupo ao STJ
Interceptações telefônicas e trocas de mensagens de WhatsApp revelam a atuação coordenada entre Haroldo Augusto Filho, o advogado Roberto Zampieri e o lobista Andreson.
As comunicações mostram discussões sobre estratégias para influenciar decisões judiciais, acelerar julgamentos e monitorar pautas e votos de magistrados no STJ.
A PF também rastreou R$ 14,5 milhões em transferências bancárias entre CNPJs ligados à Fource e contas controladas por Zampieri, valores que seriam pagamentos de propina e honorários disfarçados.
O poder paralelo: influência e lobby em Brasília
O relatório descreve uma estrutura de influência jurídica e política, com acesso privilegiado a gabinetes e servidores, especialmente em Brasília.
O lobista Andreson seria o elo do grupo junto a instâncias superiores, manejando prazos, minutas e pautas de julgamento para favorecer interesses da Fource e de seus clientes.
A PF define o esquema como uma “estrutura empresarial de fachada”, planejada para criar uma cortina de legalidade sobre operações ilícitas que uniam engenharia contábil, lobby e tráfico de influência.
Fraudes atingiam também o agronegócio
Um dos capítulos do relatório revela que as simulações de falência e recuperação judicial atingiam o setor do agronegócio, envolvendo empresas de insumos e produtores rurais.
Os investigadores afirmam que o grupo explorava brechas da Lei nº 11.101/2005 (Lei de Recuperação e Falência) e o desequilíbrio de informações entre credores e devedores para distorcer decisões judiciais e preservar fortunas.
Indícios de corrupção no STJ e novas investigações
A Polícia Federal afirma haver indícios concretos de corrupção judicial envolvendo três gabinetes do STJ, o que motivou a abertura de procedimentos específicos em Brasília.
“A Fource se apresentava como especialista em reestruturação empresarial, mas funcionava como centro de manipulação processual e canal de lavagem de recursos ilícitos”, conclui o relatório da PF.
Mesmo parcial, a apuração já expõe a teia de influência e poder que unia empresários, advogados e lobistas em um dos maiores escândalos do Judiciário brasileiro.