Entre os temas mais sensíveis ligados à Petrobras, o ajuste de preços dos combustíveis tem sido um termômetro do mercado para avaliar o quanto o governo federal pode tentar controlar os valores e o quanto a companhia pode deixar de lucrar com a venda dos produtos.
Em 2024, a petroleira fez apenas uma mudança de preço na gasolina, quando aumentou em R$ 0,20 por litro, ou 7,04%, em julho. No mesmo dia, a companhia anunciou aumento de R$ 3,10, ou 9,72%, nos preços do gás liquefeito de petróleo (GLP), o gás de cozinha. Não houve modificação do preço do óleo diesel em 2024. A última vez que a empresa reajustou o diesel foi em 27 de dezembro de 2023, ainda na gestão do ex-presidente Jean Paul Prates, quando houve redução de R$ 0,30 por litro, ou 7,85%.
De acordo com uma fonte que acompanha o setor, as cotações internacionais ajudaram a Petrobras a evitar mudanças de preços ao longo de 2024, uma vez que, ainda que tenha sofrido com a pressão da alta do dólar, a cotação do petróleo teve pouca oscilação, o que garantiu o equilíbrio. “Não é um cenário tão crítico para estar abaixo da paridade internacional”, ponderou o interlocutor.
Enquanto em 2023, quando implementou a política de formação de preços em vigor, a Petrobras deu prioridade aos cortes, o ano de 2024 trouxe a estabilidade. Em 2023, a companhia realizou cinco cortes na gasolina e sete no diesel.
Para Thiago Vetter, analista da StoneX, o ano de 2024 permitiu que a Petrobras optasse por realizar mudanças nos preços somente quando houvesse uma consistência nos parâmetros de mercado: “Considerando o que foi posto em prática pela Petrobras após a divulgação da nova política, é bastante claro que a empresa opta por fazer movimentações ainda menos frequentes do que em gestões anteriores”, disse Vetter. “A exemplo da gasolina e do diesel em 2024, ficou claro que a companhia optou por fazer movimentos de preços depois que houvesse diferença constante em relação ao mercado internacional, por meses seguidos, depois que houvesse uma necessidade consolidada de ajuste.”
A nova fórmula da Petrobras ainda não foi testada em uma conjuntura de alta expressiva do barril do tipo Brent. Nessa situação, a empresa teria que aumentar os preços dos derivados no mercado doméstico para evitar perder receita, como aconteceu nas gestões passadas do PT, quando a estatal acabou acumulando uma das maiores dívidas corporativas do mundo, em parte, por segurar aumentos e aceitar perdas. Em 2024, o Brent fechou o ano em US$ 74,24 o barril, com queda acumulada de 3,74%.
Na visão de Vetter, ainda que seja provável que o governo tenha tido um papel para determinar que a Petrobras fizesse poucos ajustes, a companhia não fez qualquer movimento contrário ao que seria o ideal, em relação aos preços internacionais. “Isso demonstra que a empresa continua monitorando continuamente a necessidade de reajuste em função do mercado e que não atua somente sob a influência de interesse político.”
Em agosto deste ano, a presidente da Petrobras, Magda Chambriard, disse que a companhia teve uma ligeira perda de participação de mercado na venda de combustíveis: “Aumentar preço de combustíveis agora seria abrir mão de ‘market share’, o que está longe da nossa intenção”, afirmou a executiva naquela ocasião.
Desde 2023, o aumento da entrada de diesel russo no Brasil a preços baixos tem chamado a atenção do mercado, deixando a concorrência mais acirrada no setor. Também em agosto, o diretor de logística, comercialização e mercados da Petrobras, Claudio Schlosser, reforçou que a estatal tem concorrido com o produto do leste europeu, que tem entrado no Brasil com desconto em relação a outros mercados.
Para Sergio Araujo, presidente da Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom), a Petrobras ainda deve ter uma “gordura” nos valores cobrados nas portas das refinarias para conseguir a manutenção dos preços por período tão longo.
Procurada pelo Valor, a Petrobras disse que a nova estratégia comercial, adotada pela companhia em maio de 2023, considera “melhores condições de produção e logística para precificação de diesel e gasolina na venda para distribuidoras.”
“Essa estratégia permite à empresa mitigar a volatilidade do mercado internacional e da taxa de câmbio, proporcionando períodos de estabilidade de preços para os seus clientes, assim como contribui para uma melhor competitividade dos seus produtos frente às principais alternativas de suprimento, considerando a participação no mercado que permita a otimização dos seus ativos e a rentabilidade de maneira sustentável”, afirmou a estatal em nota ao Valor.
Questionada sobre se a alta do dólar tem pressionado os preços dos combustíveis nas últimas semanas do ano a ponto de estimular ajustes, a Petrobras disse: “Por questões comerciais, não podemos antecipar decisões quanto ao ajuste ou manutenção dos nossos preços.”
Em entrevista ao programa “Canal Livre”, na Band TV, no domingo (29), Chambriard negou que a companhia tenha prejuízos após “abrasileirar” a fórmula de cálculo dos preços dos combustíveis. De acordo com ela, gasolina, óleo diesel, gás de cozinha (GLP) e querosene de aviação (QAV) estão com preços inferiores aos praticados pela companhia há dois anos, quando era vigente o chamado preço de paridade de importação (PPI), fórmula que considerava como principais fatores o câmbio e a cotação do petróleo do tipo Brent no mercado internacional.
Nos últimos dois meses de 2024, a cotação do dólar teve alta volatilidade com o menor valor, de R$ 5,67 no dia 6 de novembro e depois chegou ao pico de R$ 6,26, em 18 de dezembro. “Estamos fazendo dinheiro mesmo depois de abrasileirar os preços e evitando volatilidades no mercado interno”, disse Chambriard.
Este conteúdo foi publicado originalmente no Valor PRO, serviço de informações em tempo real do Valor.