Executiva integra rede latino-americana de especialistas em mudança no clima.

Executiva de sustentabilidade com duas décadas de atuação em temas como governança climática e capital natural, Ana Luci Grizzi faz parte do conselho da Laclima, sigla de rede de profissionais do Direito na América Latina especializados em mudança do clima. Para a profissional, o negacionismo climático de Donald Trump, exacerbado na Assembleia Geral da ONU, impacta a evolução do tema. Mas observa que quem de fato estava consciente e comprometido segue atuando, ainda que sem dar tanta visibilidade. E vê no dilúvio gaúcho de 2024 um ponto de inflexão das discussões econômicas sobre riscos ambientais. Ana Luci foi uma das palestrantes da Semana Caldeira, que tem a RBS como media partner. 

Quanto a eleição de Donald Trump complicou o trabalho de profissionais da área?

Tudo o que ele faz tem grande impacto em relação às discussões de sustentabilidade. Na prática, para quem já tinha entendido que os temas de clima e natureza são absolutamente essenciais para gerenciamento de risco e captura de oportunidades, as falas de Trump não têm impacto. Tínhamos a sensação de que haveria uma limpeza no mercado, no sentido de quem falava sobre o tema com viés só promocional. Para quem de fato estava comprometido, houve dois tipos de  consequências: ou continua fazendo e falando, ou continua fazendo, mas não fala. No fundo, tanto faz.

Doeram os comentários negacionistas de Trump na ONU?

Sempre dói, mas já tivemos presidente de COP abrindo a conferência falando que petróleo era uma dádiva de Deus. Vamos ter de conviver com essas declarações, porque teremos oposição mesmo que sem fundamento científico, financeiro ou econômico.

Ter menos gente fazendo melhor já ajuda ou vamos precisar de  mais gente fazendo melhor?

Sem dúvida, precisamos de mais gente fazendo melhor, mas com a visão de que não é uma ação promocional, de que estamos falando de dois temas que são absolutamente essenciais para a economia do país.

Há cobrança maior para as ações ambientais terem resultado econômico?

Sem dúvida. O ponto é que ainda não aperfeiçoamos a valoração dos ativos ambientais. Cobrar resultados econômicos demanda ações para que se consiga identificar os valores econômicos. Há uma discussão  simples de mercado: tenho um produto que consigo comprovar ser ambientalmente melhor do que o do concorrente e precisa ter um prêmio no preço. Mas o consumidor não paga preço-prêmio. Entendo, mas precisamos agir para educar o mercado e mostrar que, quando não se paga preço-prêmio, paga-se a conta do seguro, do juro mais alto por causa do risco distribuído. Precisamos de uma curva de aprendizagem de mercado para mostrar as vantagens. Se não paga o prêmio, paga a conta no final de um jeito muito pior para todo mundo.

Onde estava o risco físico, de perder infraestrutura, ou logística? Não existia nas discussões até 2024.

A enchente no Rio Grande do Sul ajudou a materializar os riscos climáticos?

No sistema financeiro, a mudança do clima era discutida mais pelo viés de risco de transição. Por exemplo, a mudança de políticas públicas que possam precificar a emissão de carbono, que impacta competitividade. Onde estava o risco físico, de perder infraestrutura, ou logística? Não existia nas discussões até 2024. Mitigação todo mundo já conhece, onde está a adaptação? Como é possível assegurar que a infraestrutura física vai resistir às novas temperaturas? Não era tangível. E se eu não vejo, não sinto e não gerencio. 

Quando se perde a logística e há impedimento em operações de empresas, há perda financeira, que terá de ser entendida e gerenciada. O desastre no RS é o melhor exemplo de risco climático físico. Não vamos impedir que aconteça, mas temos de estar preparados. Quanto mais vamos demorar para entender que estamos falando de temas que são essencialmente econômicos, não de quem abraça árvore?

O Brasil vai tentar construir coalizão de países para formar o mercado de carbono global, ao menos uma primeira fase.

O que dá para esperar de concreto para a COP 30?

A geopolítica global está impactando  as discussões multilaterais sobre clima. As questões estruturais já conhecidas desde o dia zero em relação à Belém receber o evento também não nos ajudam. A movimentação de Brasil em relação ao financiamento climático é o Fundo de Florestas Tropicais para Sempre, o TFFF (na sigla em inglês), anunciado há duas COPs, mas que agora vai ter lançamento oficial, mais estruturado e com o compromisso de financiamento pelo Brasil. 

É possível esperar mais?

O que seria um grande acerto e que parece ser outra ação que o Brasil vai tentar construir é uma coalizão de países para formar o mercado de carbono global, ao menos uma primeira fase. Seria extremamente relevante, uma vantagem comparativa como país para ser o grande provedor de soluções baseadas em natureza. É uma possibilidade de se conseguir destinar capital estrangeiro qualificado, resiliente e de longo prazo para a nossa economia. Traz materialidade para tudo que discutimos em termos de soluções baseadas em natureza, ajudando o mundo inteiro, porque vamos ter um percentual de florestas e uma captura de carbono muito maior. 

Qual a probabilidade de que ocorra, de fato?

Parece que as negociações estão avançadas. A probabilidade deveria ser de média para alta, mas vou ficar no médio.

Que tipo de ferramenta de inovação  pode ajudar nessa área?

Tudo na área ambiental é inovação. As melhores ferramentas de inovação, do ponto de vista de Brasil, são as que nos ajudam a implementar soluções baseadas em natureza. Quanto mais tecnologia houver que consiga comprovar capacidade de capturar carbono no solo, melhor. Tecnologia para fazer os relatórios de sustentabilidade também é uma oportunidade.

*Colaborou João Pedro Cecchini

Leia mais na coluna de Marta Sfredo

By Daniel Wege

Consultor HAZOP Especializado em IA | 20+ Anos Transformando Riscos em Resultados | Experiência Global: PETROBRAS, SAIPEM e WALMART

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