
O Brasil não perde dinheiro por falta de recursos. Perde por falta de compreensão. A liderança ambiental, social e de governança custa mais caro do que qualquer crise, seja ela, ambiental, sanitária, econômica e de gestão. Na esfera ambiental, por exemplo, basta olhar para as cenas que se repetem ano após ano, cheias que devastam bairros inteiros, secas que paralisam cidades, rios que deixam de ser rios e passam a ser ameaça para a saúde pública. Nada disso é obra do destino. É resultado direto de uma gestão que ainda insiste em tratar meio ambiente como complementar, quando deveria tratá-lo como infraestrutura.
A primeira falha começa na percepção. ESG ainda é visto, em muitos conselhos e prefeituras, como gastos adicionais ou marketing reputacional. Essa leitura é ultrapassada. Segundo a Agência Nacional de Águas (ANA), mais de 80% dos municípios brasileiros enfrentam algum tipo de risco relacionado à água, seja por excesso, seja por escassez. Cada evento extremo cobra seu preço. O Banco Mundial estimou que, no Brasil, os desastres hídricos já representam perdas superiores a R$ 35 bilhões por ano, entre danos diretos e intermediários econômicos. Quando se olha para o custo da prevenção, a comparação é quase constrangedora, investir em saneamento, drenagem e monitoramento sai entre 4 e 6 vezes mais barato do que reparar danos após o desastre.
O impacto mais silencioso e talvez o mais perverso aparece na saúde pública, na produtividade e na educação. A Organização Mundial da Saúde (OMS) calcula que cada R$ 1 investido em saneamento gera uma economia de até R$ 5 em saúde. No Brasil, onde 35 milhões de pessoas ainda vivem sem acesso à água tratada e quase 100 milhões não têm coleta de esgoto (dados do SNIS 2023), isso significa doenças evitáveis, faltas no trabalho, internações, mortes e desigualdades que se perpetuam por gerações.
Esse ciclo se repete nas escolas. Enchentes obrigam fechamento de unidades, prejudicam transporte, interrompem aulas. O IBGE mostra que regiões com saneamento precário têm índices maiores de evasão escolar. É impossível separar meio ambiente de educação, assim como é impossível separar água limpa de saúde e produtividade. Uma cidade que não cuida do seu ambiente paga essa conta em todas as áreas e sempre paga mais caro.
No setor privado, o erro se manifesta de outra forma. Indústrias inteiras sem água segura. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) estima que a escassez hídrica já gera perdas bilionárias na produção brasileira todos os anos. No agronegócio, os extremos climáticos reduziram a produção de grãos em vários estados, com perdas superiores a R$ 25 bilhões apenas na safra 2023/2024. No setor urbano, as obras emergentes consomem orçamentos que poderiam estar sendo usados para inovação, infraestrutura e melhoria da qualidade de vida.
Outro equívoco cultural é acreditar que “preservar custa caro”. Na prática, caro é remediar. A (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) da OCDE reforça que países que tratam água, clima e resíduos como infraestrutura estratégica consigam reduzir riscos sistêmicos, atrair mais investimentos e gerar desenvolvimento sustentável de longo prazo. Enquanto isso, o Brasil ainda perdeu oportunidades porque não enxerga ESG como ferramenta de gestão. ESG não é relatório. ESG é inteligência estratégica.
O Brasil não precisa de mais discursos, mas de compreensão real. A natureza opera com lógica própria, e essa lógica não negocia. Ou prevenimos, ou pagamos. E a conta já está alta. As cidades mais pobres são sempre as que sofrem primeiro. Negócios menos preparados são os que quebram. Famílias vulneráveis são as que mais perdem. Não existe progresso possível ignorando o ambiente que sustenta toda a economia do país.
ESG nunca foi moda. É leitura de mundo.
É uma lente que expõe riscos antes invisíveis, que organiza prioridades, que separa discurso de entrega.
É planejamento, é governança, é prevenção é a diferença entre reagir ao caos ou antecipar soluções. O fato é que o custo da ignorância ambiental, social e de governança já está cobrando juros no presente do Brasil.
A questão real não é “se podemos”, mas até quando vamos adiar o país que sabemos ser possível construir.
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