Andressa Pufal
Na noite desta quinta-feira (10), o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), junto de centenas de assentados e acampados, esteve reunido com o governo do Estado. A audiência ocorreu às 19h30, no prédio do CAFF, e contou com a presença do secretário de Habitação e Regularização Fundiária, Carlos Gomes, e da secretária de Planejamento, Governança e Gestão, Danielle Calazans, além de subsecretários. Entre outras reivindicações, o movimento cobrou soluções para as 450 famílias que ocuparam um terreno da CEEE Transmissão na madrugada de quinta.
Por volta das 4h30 da manhã, o MST ocupou uma área de 1,7 mil hectares da CEEE Transmissão, na cidade de Triunfo. De acordo com a organização, o local servia para plantação de eucalipto para postes de energia e estava sem uso. A intenção do movimento era que a área fosse destinada para moradia e trabalho de 450 famílias afetadas pelas enchentes de maio de 2024.
No entanto, em menos de 12 horas o terreno já estava desocupado. Após demonstrações de força pela Brigada Militar, o MST e as famílias negociaram uma retirada, em troca de uma audiência com secretários do governo do Estado. Na reunião, representantes da direção nacional do MST cobraram o governo a respeito de três tópicos principais: o assentamento das 450 famílias que perderam lavouras na enchente; soluções para a situação das 1.604 famílias cadastradas no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária do Rio Grande do Sul (Incra-RS) que aguardam por assentamento; e a regularização de Termos de Concessão de Uso (TCU).
“É uma pauta extensa, mas os pontos principais foram esses”, explica Adão Pretto, deputado estadual (PT), que acompanhou a ocupação desde o início em nome da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do RS. “Foi uma reunião de cobrança. E ficou acordado que daqui a 2 semanas vai ter uma nova reunião para o governo nos dar uma posição concreta. Daqui a 15 dias, eles nos chamam para uma nova conversa e propõem uma solução.”
A área ocupada ainda está vinculada ao patrimônio do Estado do Rio Grande do Sul, por não ter entrado nas negociações de privatização da CEEE. O MST alega que o local se tornou improdutivo desde a mudança da legislação que substituiu postes de eucalipto pelos de concreto, discussão que entrou em pauta na Assembleia em abril de 2016.
“Desde então, a área ficou praticamente vazia. Tem muitas estruturas sucateadas lá”, diz Marlon Rodrigues, integrante da direção estadual do MST. “Decidimos ocupar para abrir um diálogo e pressionar o governo do Estado. A gente sabe que tem muitas áreas que não cumprem a sua função social, nem garantem a parte ambiental. E essa área da CEEE em Triunfo tem essa característica: tá improdutiva. Mas ela pode cumprir uma função social pra sociedade gaúcha, se for desapropriada para a reforma agrária.”
Em nota enviada à reportagem do Sul21, a Secretaria de Planejamento, Orçamento e Gestão (SPGG) confirma que o local era utilizado para o plantio de eucaliptos “para o suprimento de matéria prima para a Usina de Preservação de Madeira – UPM” e que há indícios de contaminação do solo da área. A SPGG declarou ainda que está desenvolvendo um estudo no terreno e que “uma vez tratada, a área poderá ser destinada a finalidades que atendam a função social da propriedade, dentre elas o reassentamento de famílias oriundas da Reforma Agrária que foram atingidas pelas enchentes no município de Eldorado do Sul.” (leia a íntegra ao final da reportagem)
A área foi desocupada ainda na quinta-feira, no meio da tarde, após repressão pela Brigada Militar. “De forma desproporcional, o governo do Estado encaminhou para lá a tropa de Choque e todo um aparato, com helicópteros e viaturas, para um local que tinha famílias, crianças”, relata Adão Pretto. Sem conflitos físicos, as famílias e os representantes do MST decidiram deixar o local em troca da audiência com secretários.

A ação integra a Jornada Nacional de Lutas em Defesa da Reforma Agrária, que desde 1º de abril já realizou 23 ações em 10 estados, mobilizando cerca de 10 mil famílias que reivindicam o direito à reforma agrária e fomento para a produção da agricultura familiar. A Jornada faz parte das ações do Abril Vermelho, que marca o Massacre de Eldorado do Carajás, acontecido em 1996, e tem como lema “Ocupar para o Brasil alimentar”.
A reportagem do Sul21 tentou contato com a Brigada Militar, mas não obteve retorno até a publicação desta matéria.
Nota enviada pela Secretaria de Planejamento, Orçamento e Gestão:
O imóvel em questão decorre do processo de desestatização da CEEE, no âmbito da Lei Estadual nº 14.467/2014.
Além disso, o Decreto Estadual nº 55.622/2020 traz em seu Anexo Único uma lista de bens a serem incorporados ao patrimônio do Estado do Rio Grande do Sul, dentre eles o imóvel denominado Horto Florestal Renner.
O referido imóvel está localizado na RS 470, Distrito de Barreto, Triunfo/RS, de titularidade da CEEE-D.
O horto florestal Renner era utilizado basicamente para o plantio de eucaliptos para o suprimento de matéria prima para a Usina de Preservação de Madeira – UPM.
Contudo, a matrícula desse imóvel possui averbação de contaminação ambiental. Essa contaminação pode colocar em risco a saúde humana. Dessa forma, a SPGG está desenvolvendo um estudo a fim de verificar a melhor forma de diagnosticar e recuperar a qualidade ambiental dessa área.
As peças técnicas para viabilizar a contratação deste estudo serão desenvolvidas pelos servidores oriundos da Contratação Integrada de Temporários, tendo em vista a sua aderência ao escopo da reconstrução do Estado.
Uma vez tratada, a área poderá ser destinada a finalidades que atendam a função social da propriedade, dentre elas o reassentamento de famílias oriundas da Reforma Agrária que foram atingidas pelas enchentes no município de Eldorado do Sul.