Depois de dias de cenas de peixes mortos no Rio Paraopeba, na Grande BH, a mortandade chegou ao fim. Nesse domingo (14/9), pouco mais de uma semana após os primeiros registros, não havia novos sinais de animais agonizando no leito. A informação foi confirmada pelo presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Paraopeba (CBH Paraopeba), Heleno Maia, que classificou o quadro como “estabilizado”.
“Percorri o lugar e não localizei mais nada. Não vi mais os peixes morrerem, já está bem estabilizada a situação. Os peixes que restam aqui ainda são aqueles que pereceram durante a mortandade”, afirmou Maia ao Estado de Minas nesta segunda-feira (15/9).
A estimativa do comitê é a de que mais de 10 mil peixes tenham morrido no episódio. Ao longo da semana, equipes de resgate retiraram pelo menos 4,5 mil animais mortos.
Mancha invisível
A contaminação percorreu um trecho de 17 quilômetros, desde a foz do Rio Betim, em Juatuba, até a chamada Fazenda da Ponte, em Esmeraldas. Diferentemente de desastres em que a poluição pode ser vista na água, dessa vez tratava-se de uma “mancha invisível”.
As primeiras mortes foram registradas no dia 6 de setembro e se estenderam até a última sexta-feira (12/9). A principal hipótese a é de que um produto químico tenha sido despejado na noite anterior, em 5 de setembro, culminante em uma reação em cadeia.
Moradores documentaram em vídeo peixes de diferentes espécies se debatendo na superfície. “Temos vídeos que mostram os peixes agonizando, buscando respiração fora d’água”, contou Maia ao EM. Imagens captadas pela reportagem na quarta-feira (10/9) mostravam centenas deles acumulados em pontos do rio, transformando o que sempre foi sinônimo de vida em um cenário fúnebre.
Impacto na fauna
O que mais preocupa pesquisadores, ambientalistas e moradores ribeirinhos é que a mortandade atingiu justamente espécies que, apesar de viverem em um ambiente já degradado, conseguiam resistir. Entre elas estavam pacamãs, peixes noturnos de hábitos de fundo que já chegaram a constar em listas de espécies ameaçadas de extinção; surubins com até 40 quilos, também considerados ameaçados; piranhas; e cascudos.
“Sabemos que pode ser uma contaminação muito mais reagente, porque temos espécies muito resistentes morrendo. Esses animais já convivem há anos com a poluição por metais pesados do rompimento da barragem de Brumadinho, além do esgoto que atinge a bacia. São espécies adaptadas a esse cenário adverso, mas que agora não resistiram”, lamentou Maia.
Diante da incerteza, prefeituras de municípios banhados pelo Paraopeba, como Pompéu, Mateus Leme e Esmeraldas, recomendaram à população que evite pescar, consumir ou comercializar peixes do rio até a conclusão dos laudos. “Essa é uma ação preventiva para proteger a saúde de todos”, afirmou a Prefeitura de Pompéu em comunicado publicado na quinta-feira (11/9), nas redes sociais.
Mortandade atingiu espécies que, apesar de viverem em um ambiente já comprometido, ainda conseguiam resistir, como surubins de até 40 quilos Edesio Ferreira/EM/D.A Press. Brasil
Busca pela causa
Enquanto a mortandade cessa, a pergunta que permanece sem resposta é: o que matou tantos peixes em tão pouco tempo? As análises da água, dos sedimentos e das carcaças já estão em andamento. A previsão é de que os resultados sejam divulgados até a próxima segunda-feira (22/9).
“Assim que os laudos chegarem, vamos conseguir detectar o que houve”, afirmou o presidente do CBH. A expectativa é de que os resultados também auxiliem na identificação de possíveis responsáveis. “Ainda não sabemos do que se trata, mas acreditamos que será possível identificar com mais facilidade, já que o ponto de origem parece estar concentrado na foz do Rio Betim”, acrescentou.
A suspeita de que se trate de um ato criminoso não está descartada. A hipótese de que a mortandade tenha alguma relação com o rompimento da barragem de Brumadinho foi afastada pelos especialistas. “Se fosse algo ligado à barragem, a contaminação teria surgido a montante. O que observamos foi o contrário: o ponto inicial está a jusante da foz do Rio Betim, distante da área do rompimento”, explicou Maia.
Outra linha de investigação cogitou a possibilidade de descargas industriais. Especulou-se, inclusive, que pudesse se tratar de uma empresa de bebidas. Mas essa hipótese perdeu força após verificação técnica. “Já foi constatado que a indústria não faz descarte no local. Se fosse o caso, teríamos sinais também no Ribeirão Serra Azul, o que não aconteceu”, disse o presidente do comitê.
Siga nosso canal no WhatsApp e receba notícias relevantes para o seu dia
Monitoramento contínuo
Enquanto o mistério não é solucionado, órgãos ambientais intensificam o monitoramento da bacia. Em nota, a Secretaria de Meio Ambiente de Minas Gerais (Semad) informou que o Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam) realizou coletas emergenciais e que os exames já estão em análise. O Instituto Estadual de Florestas (IEF) e a Polícia Militar de Meio Ambiente também acompanham a situação.
“As medidas para mitigar os impactos ambientais serão definidas a partir dos resultados das investigações e do monitoramento contínuo realizado pelos órgãos competentes”, destacou a Semad em nota divulgada na última quarta-feira.