Nos últimos meses, os alertas da Defesa Civil tornaram-se parte da rotina dos brasileiros. A cada nova tempestade, inundação ou risco de deslizamento, mensagens de aviso chegam diretamente aos celulares, orientando sobre cuidados e áreas de risco. Entre dezembro de 2024 e setembro de 2025, quando o sistema nacional de alertas começou a operar em caráter ampliado, mais de 450 alertas foram enviados para as regiões Sul, Sudeste, Norte e Nordeste, número este que reflete o aumento da frequência e da gravidade dos eventos climáticos extremos no país. Neste episódio do Prato do Dia, o convidado é Irineu de Brito Júnior, professor do Instituto de Ciência e Tecnologia da Unesp no câmpus São José dos Campos e pesquisador nas áreas de logística humanitária e gestão de desastres.

O docente explica que os alertas, antes opcionais, agora são enviados automaticamente a todas as pessoas que estão em áreas de risco, sem necessidade de cadastro prévio. Trata-se de um importante avanço para a cultura de prevenção no Brasil, mas é preciso adotar certos cuidados antes de passá-los à diante. “O alerta não pode deixar de ser emitido, mas também não pode ser emitido por qualquer banalidade. Se for em excesso, cai no descrédito”, diz. A perda de credibilidade de uma pessoa ou sistema é chamada de Síndrome de Crywolf e é resultado da frequência de alarmes falsos emitidos quando não há perigo real.

Mesmo com os avanços tecnológicos, o pesquisador reforçou que o país ainda está construindo uma cultura de atenção aos riscos climáticos. Muitas tragédias ainda acontecem por falta de resposta adequada da população aos alertas meteorológicos. Para Brito Júnior, essa conscientização vem sendo construída aos poucos, com a criação de centrais de monitoramento e com o fortalecimento das defesas civis municipais e estaduais. “Talvez ainda estejamos longe do ideal, mas houve avanços. Antes, as pessoas não contavam com nenhum sistema de alerta”, observou.

Os desastres podem ser divididos em duas categorias principais: os localizados e os dispersos. Os primeiros atingem uma área restrita, como um município, o que agiliza o processo de resposta. Já os desastres dispersos se espalham por grandes extensões territoriais, afetando diversas cidades ao mesmo tempo e exigindo uma articulação de equipes e recursos em maior escala. “O desastre de São Sebastião foi um desastre localizado. Apesar da gravidade, a estrutura de resposta funcionou, porque já havia experiência nesse tipo de situação”, afirma.

Ao comparar o episódio às enchentes no Rio Grande do Sul, o docente afirma que este foi “o primeiro desastre disperso de grande magnitude que vivenciamos”. Na ocasião, as inundações atingiram 478 das 497 cidades da região e afetaram cerca de 2,4 milhões de habitantes. 

O fortalecimento da Defesa Civil foi outro ponto destacado pelo pesquisador. Em 2023, a profissão de agente de proteção e defesa civil passou a constar oficialmente no Código Brasileiro de Ocupações, reconhecendo o trabalho desses profissionais responsáveis por planejar, coordenar e executar ações de prevenção e resposta a desastres. “Foi um avanço. Agora existe uma carreira, e isso fortalece o sistema de resposta e a qualificação dos profissionais que atuam nessas situações”, comenta o docente. Ele também explica que o Estado de São Paulo realiza duas grandes frentes de atuação: a Operação Verão, voltada a ocorrências provocadas pelo excesso de chuva, como deslizamentos e enchentes no litoral e no Vale do Paraíba, e a Operação Inverno, que enfrenta a estiagem e as queimadas no interior do estado.

Além das autoridades, outro elemento essencial para a gestão de crises é o voluntariado. Brito Júnior ressalta a importância da participação popular nas ações humanitárias, mas alertou que a atuação dos voluntários deve ser organizada e segura. “O voluntário exerce um papel extremamente importante na retaguarda, como na triagem de doações, mas não pode atuar na zona quente, onde há risco direto”, diz. Segundo o pesquisador, a experiência recente no Rio Grande do Sul mostrou a força da solidariedade, mas também a necessidade de protocolos claros para orientar o trabalho voluntário.

Esses protocolos, desenvolvidos em parte por equipes da Unesp e de instituições parceiras, visam facilitar a resposta a desastres e reduzir falhas operacionais. As instruções precisam ser práticas e objetivas Documentos muito longos são inviáveis em situações de emergência. “A pessoa precisa entender exatamente o que fazer. O protocolo tem que ser curto, direto e em linguagem clara, o que chamamos de plain language”, explica.

Ouça a entrevista completa com o professor Irineu de Brito Júnior no podcast Prato do Dia, disponível nas principais plataformas de áudio e no player abaixo.

By Daniel Wege

Consultor HAZOP Especializado em IA | 20+ Anos Transformando Riscos em Resultados | Experiência Global: PETROBRAS, SAIPEM e WALMART

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