Na ressaca do desastre climático de maio de 2024, o maior registrado na história do Estado, o Rio Grande do Sul viu gargalos logísticos se tornarem mais evidentes em vários pontos de seu território. Ficou evidente a urgência de discussões sobre anéis viários, qualidade das rodovias, alternativas para o transporte aéreo — com o principal aeroporto atingido e fechado por quase seis meses —, e um ponto que já preocupava antes das enchentes, a situação das ferrovias.

Essas foram algumas das questões diagnosticadas e analisadas por especialistas em evento realizado nesta terça-feira (16), em Porto Alegre, sobre a infraestrutura de transportes da região Sul, parte da série de debates “Logística no Brasil”, promovida pelo Valor, com oferecimento de Infra S.A. e Ministério dos Transportes.

Com uma economia baseada em sua maior parte no agronegócio, e uma posição geográfica que o coloca em uma das pontas do mercado nacional, afastado do centro de consumo, o Estado vê sua indústria e a produção ainda mais dependentes de condições de transporte.

Segundo o professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Luiz Afonso dos Santos Senna, um dos painelistas, apenas 10% da malha rodoviária do RS é pavimentada, percentual abaixo da média nacional, de 12%. Enquanto obras de recuperação de grandes estradas andaram e se encaminham para pontes, as ferrovias seguem como uma preocupação pendente.

Diretora de obras e projetos da Secretaria Nacional de Transporte Ferroviário, criada pelo governo atual dentro do Ministério dos Transportes com foco no setor, Maryane da Silva Figueiredo Araujo, diz que a discussão é baseada no que já existe na malha do país e na possibilidade de novos corredores.

No caso da região Sul, diz ela, foi aberto um grupo de trabalho para analisar estudos com diversos atores, incluindo municípios e ONGs. Com o levantamento em fase de conclusão, ela antecipa que um dos pontos pensados é racionalizar a malha, dividindo-a em trechos que fazem ou não sentido e que sejam atrativos para o mercado.

‘‘A Malha Sul, especificamente, tem um traçado antigo e desafiador para competir com outros modos. Dividimos ela em três: a malha gaúcha, um corredor Mercosul, que é a ligação com o Paraná, e o corredor do Paraná, que liga ao Porto de Paranaguá’’, explica. ‘‘Estamos vendo o quão viável é cada pedaço e as possibilidades de financiamento ou funding que a gente vai precisar endereçar a cada parte ou ao todo.’’

Jorge Bastos, presidente da Infra S.A., que tem trabalhado junto ao governo gaúcho para elaboração de um novo Plano Estadual de Logística de Transportes (Pelt), lembra que as ferrovias atuais, tanto no RS quanto em outras partes do país, foram pensadas há dois séculos, quando os trens competiam com carroças e não com os caminhões e as rodovias atuais.

‘‘É uma ferrovia que está desatualizada. A opinião do Rio Grande do Sul, das federações é superimportante, eles estão vivendo aqui, sofrendo aqui com o que acontece, tem que ser levado da conta’’, afirma Bastos. ‘‘Estamos agora com um diálogo para 2050, ferrovia não é uma coisa rápida de acontecer, mas não adianta ficar deixando para depois, senão não acontece.’’

Ricardo Portella, vice-presidente da Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul (Fiergs), embra que o desenho da malha gaúcha é ainda baseado no que foi feito à época do Império, no século XIX, basicamente para transporte de gado. O cenário hoje é de uma malha antiga, com problemas de geometria devido a quantidade de curvas e que atravessa zonas urbanas de cidades.

‘‘Essa malha tem utilidade emergencial, mas ela tem muita dificuldade de competir com caminhões. Estamos defendendo que, existe um estudo feito, de uma nova ferrovia, bitola larga, que sairia do porto de Rio Grande, chegaria próximo a Santa Maria, e subiria’’, afirma ele. ‘‘Tem um corredor de transporte de grãos fortíssimo, poderia inclusive juntar ao hub de combustíveis que vai para Passo Fundo [norte do Estado]’’.

Na avaliação do cenário geral do Rio Grande do Sul, que conta com estruturas de todos os modais, ainda que com problemas, Portella salienta: ‘‘O desafio agora é transformar essa malha em algo melhor do que tínhamos antes. Para isso precisamos de recursos, investimentos’’.

— Foto: Isabelle Rieger/Valor

By Daniel Wege

Consultor HAZOP Especializado em IA | 20+ Anos Transformando Riscos em Resultados | Experiência Global: PETROBRAS, SAIPEM e WALMART

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