BEATRIZ GARCIA E FERNANDO AZEVÊDO
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
Pesquisadores da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) observaram a presença de 14 pesticidas e cinco produtos de degradação na chuva de São Paulo, Campinas e Brotas. O estudo, divulgado em março deste ano na revista Chemosphere, analisou a presença de agrotóxicos dissolvidos nas amostras de águas pluviais de 2019 a 2021.
Os pesquisadores detectaram compostos como o herbicida atrazina e o fungicida carbendazim, proibido no Brasil desde 2022 e encontrado em 88% das coletas. Pela primeira vez, o herbicida tebuthiuron foi identificado na água da chuva, aparecendo em 75% dos registros.
A pesquisa avaliou a dispersão da contaminação por agrotóxicos em diversos meios. Segundo Cassiana Montagner, professora que orienta o trabalho, o objetivo era investigar a presença dos pesticidas usados na cultura da cana-de-açúcar. Por isso, houve a análise de 19 compostos.
Os contaminantes não estão em concentração significativa para causar efeitos diretos à saúde humana.
De acordo com Montagner, só seria possível enxergar o impacto dos materiais após exposição prolongada a eles. “Mas, mesmo não havendo risco direto, [a pesquisa mostra] um indício do tamanho da dispersão dos agrotóxicos após a aplicação nas lavouras.”
O uso de pesticidas não é exclusivo de uso agrícola: uma das principais formas de contaminação é a dispersão atmosférica. Os contaminantes podem ser transportados por correntes de ar a grandes distâncias e depositados pela chuva em áreas urbanas e rurais.
Riscos à vida aquática também foram observados no estudo, uma vez que a água da chuva poderia contribuir para a contaminação da água doce. “A biota aquática -os organismos que vivem nos rios e no solo- são os primeiros afetados por essa exposição”, diz Montagner.
A atrazina, herbicida usado em lavouras de milho e cana, foi detectada em níveis altos nas três cidades. Em Brotas, o 2,4-D, outro herbicida, também apareceu em maior quantidade. Já em Campinas, os destaques foram o fipronil, o diuron e o 2HA, com proibições de uso em diversos países. Na capital paulista, a maior concentração foi de carbendazim, fungicida associado a riscos à saúde humana.
Já o fungicida carbofurano, proibido no Brasil desde 2017, apareceu em níveis baixos em algumas amostras de Brotas e Campinas, mas não foi detectado na capital. A presença dessa substância pode indicar o uso irregular de agrotóxicos proibidos, segundo a pesquisa.
Apesar da presença dos componentes, as concentrações encontradas estão dentro dos limites estabelecidos para a água potável no país, segundo o Ministério da Saúde. Ao todo, das 19 substâncias analisadas, 13 possuem parâmetros definidos para consumo, enquanto outras seis não contam com regulamentação específica.
A pesquisa investigou a contaminação das águas pluviais em cidades com diferentes usos do solo. São Paulo, por exemplo, é um cenário mais urbanizado, onde a agricultura está em menor proporção.
“Se tivéssemos procurado em outras regiões, por exemplo, em Mato Grosso, que tem um extensivo de soja e milho, os agrotóxicos usados no manejo são diferentes. Mas a presença deles na atmosfera teria um perfil parecido com o que vimos no estado de São Paulo”, afirma Montagner.
Em nota, a Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo diz que monitora o uso de agrotóxicos por meio do Programa Estadual do Uso de Agrotóxicos e Afins. A fiscalização abrange comércios, prestadores de serviço, armazéns, pontos de recebimento de embalagens vazias e propriedades rurais.
A nova legislação estadual, em vigor desde março, realizou 57 autuações. Outros 40 processos administrativos seguem em análise.
A pasta também conduz o Programa de Análise de Resíduo de Agrotóxicos em Produtos de Origem Vegetal, que monitora alimentos da cesta básica colhidos em propriedades agrícolas. As amostras são analisadas no Instituto Biológico, em São Paulo.
Já a liberação ou a proibição de agrotóxicos é uma responsabilidade federal, compartilhada entre o Ministério da Agricultura, o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).