Uma pesquisa realizada pela FEA (Faculdade de Engenharia de Alimentos) da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) confirmou a presença de agrotóxicos e outros contaminantes em fórmulas infantis. Foram analisadas 30 amostras de produtos comercializados no Brasil a fim de investigar a presença de resíduos de agrotóxicos e micotoxinas – compostos tóxicos produzidos por fungos.
Os estudos, publicados em dois artigos, um no Journal of Chromatography A e outro no Journal of Food Composition and Analysis, fazem parte da pesquisa de doutorado de Marcella Vitória Galindo, com orientação da professora Helena Teixeira Godoy e do pesquisador Wellington da Silva Oliveira, e com o apoio da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo).
Em duas análises apareceram resíduos desses compostos, entre os quais o carbofurano e o metamidofós, de uso proibido no Brasil, além de outras substâncias, como fármacos veterinários.
A maior parte dos contaminantes registrou concentrações abaixo dos limites de segurança estabelecidos pelas autoridades sanitárias. Mesmo assim, a mera presença desses componentes acende o alerta para o risco de contaminações indiretas, que podem ocorrer na cadeia de produção das fórmulas, e para a necessidade de o país adotar normas específicas voltadas ao setor.
Como foi a análise nas fórmulas infantis
A primeira análise baseou-se em uma lista de 23 possíveis contaminantes, sendo 19 agrotóxicos e 4 micotoxinas. Os agrotóxicos foram elencados a partir de uma lista elaborada pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), que disponibiliza relatórios e monografias periodicamente sobre os compostos mais empregados nos campos de cultivo do país.
“Fizemos um levantamento sobre as matérias-primas utilizadas e consideramos quais agrotóxicos poderiam ser encontrados com base nos levantamentos da Anvisa”, explica Galindo.
As amostras também passaram por uma verificação, chamada triagem suspeita, para apontar a presença de outros contaminantes além dos 23 iniciais. Para isso, a pesquisadora utilizou um banco de dados com mais de dois mil contaminantes, entre agrotóxicos e seus metabólitos, hormônios, fármacos veterinários e outras substâncias.
Nessa análise inicial, o estudo encontrou os pesticidas fenitrotiona, clopirifós e bifentrina. Eles apareceram abaixo dos limites de segurança estabelecidos pela UE (União Europeia), cujos parâmetros foram usados por conta da ausência de uma legislação específica para as fórmulas infantis no Brasil.
A pesquisadora alerta que, mesmo estando dentro dos níveis especificados, a questão não deixa de ser preocupante. “Isso não significa que esses compostos vão, necessariamente, trazer malefícios, porque o organismo tem a capacidade de metabolizá-los e eliminá-los. O problema é que o organismo dos bebês não tem esse sistema ainda completamente desenvolvido”, afirma.
Uma questão importante envolveu a detecção do carbofurano, agrotóxico proibido no Brasil em 2017 e identificado em cerca de 10% das amostras. Nesse caso, a hipótese é de que a contaminação tenha ocorrido por bioacumulação. “Mesmo não sendo utilizado, o composto pode ainda permanecer no ambiente por muitos anos e contaminar os alimentos”, esclarece Godoy.
Foram identificados, na triagem, 32 compostos, entre agrotóxicos não previstos, hormônios e medicamentos veterinários, algo que pode resultar de contaminações na cadeia de produção de matérias-primas como o leite de vaca e o de cabra.
A segunda análise monitorou os resíduos de agrotóxicos também por meio de uma triagem suspeita, com base em um banco de dados com 278 produtos do tipo. Nessa etapa, seis compostos foram detectados em 86,6% das amostras: ftalimida, cis-1,2,3,6-tetra-hidroftalimida, pyridaben, bupirimate, piperonil butóxido e metamidofós.
Desses, destacam-se o pyridaben, a ftalimida e a cis-1,2,3,6-tetra-hidroftalimida por estarem em concentrações acima do limite estabelecido pela UE, e o metamidofós, de uso também proibido no Brasil, desde 2012. De acordo com as pesquisadoras, os resíduos podem ter vindo de várias fontes, desde as matérias-primas até o processamento e embalagem.
Godoy destaca que o estudo não busca desencorajar o consumo desses produtos, mas garantir a qualidade dos alimentos fornecidos aos bebês. “O processamento é importante e, desde que feito dentro das normas estabelecidas, garante um alimento de qualidade”, diz.
Falta de regulação no Brasil
Uma das motivações que levaram Galindo a trabalhar com a análise de fórmulas infantis é a ausência de normas e legislações específicas para o setor no país, o que dificulta o controle sobre os produtos.
Nos últimos anos, o avanço das técnicas de análise, como as empregadas na pesquisa, possibilitou estudos mais detalhados. “Não adianta existirem normas se não for possível sabermos se os produtos atendem ou não a elas”, observa Godoy.
A continuidade da pesquisa deverá incluir a análise de amostras de leite materno, com foco na identificação de contaminantes provenientes do ambiente, de embalagens de alimentos e de produtos de cuidado pessoal que podem chegar ao leite via alimentação e devido ao estilo de vida das mães. Além de evidenciar a necessidade de haver normas rígidas para esse tipo de produto, o doutorado de Galindo identifica os fatores humanos envolvidos no problema.
“É fundamental promover uma orientação alimentar adequada para as mães, incentivando-as a evitar o consumo de produtos que supostamente estão contaminados por substâncias potencialmente nocivas. Essa conscientização não só protege a saúde individual, mas também reflete um compromisso com a segurança nutricional, tanto da mãe quanto do bebê”, aponta a pesquisadora. “Trata-se de uma questão social e de saúde pública.”
*Com informações do Jornal da Unicamp
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