Nos últimos anos, temos assistido a um aumento significativo na frequência e intensidade dos desastres climáticos. O impacto macroeconómico destes fenómenos é um tema que exige a nossa atenção e não pode ser ignorado. Em Portugal, a situação é particularmente preocupante, dado que o país enfrenta uma crescente exposição a riscos climáticos, como incêndios florestais devastadores, secas severas que afetam a agricultura e os setores industriais, bem como ondas de calor que alteram os padrões de horas de trabalho e contribuem para a perda de vidas e para a diminuição da produtividade geral.
Um estudo recente do Banco de Compensações Internacionais (BIS) revela que os desastres climáticos, como inundações, secas e tempestades, afetam não só a vida das pessoas e a integridade das infraestruturas, como também têm repercussões profundas no crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) e na inflação das economias. Este impacto é visível em Portugal, onde as secas prolongadas e os incêndios florestais nas regiões do interior têm consequências diretas na produção agrícola, um setor vital para a economia nacional.
O estudo analisou dados de 151 países entre 2000 e 2024, revelando que os efeitos negativos sobre o PIB podem ser significativos e duradouros: -2%, -1% e -0,4%, respetivamente, após secas, deslizamentos de terra e incêndios florestais, ao longo de quatro anos. Este impacto não é apenas um número: são vidas afetadas, economias estagnadas e um futuro incerto. Em Portugal, os setores da agricultura, da silvicultura e do turismo são frequentemente os primeiros a sentir os efeitos devastadores das alterações climáticas. As secas prolongadas podem arruinar colheitas, levando a um aumento dos preços dos alimentos, o que se reflete inevitavelmente na mesa dos consumidores. A inflação, que já assombrava muitas economias, torna-se um fantasma ainda mais real quando as crises climáticas se instalam.
Além disso, o impacto dos desastres climáticos varia consoante a região e a capacidade de resiliência das economias locais. Em Portugal, as empresas e as regiões devem começar a avaliar os respetivos riscos climáticos e a desenvolver planos de adaptação e contingência integrados. O estudo sugere que a preparação e a adaptação às alterações climáticas são essenciais para mitigar estes impactos. São fundamentais investimentos em infraestruturas resilientes, sistemas de alerta precoce e políticas de gestão de riscos para reduzir a vulnerabilidade das comunidades.
A interconexão das cadeias de abastecimento globais torna o cenário ainda mais complexo. Um desastre num ponto do globo pode ter repercussões em economias a milhares de quilómetros de distância. Em Portugal, por exemplo, o aumento dos preços das matérias-primas e dos alimentos, causado por eventos climáticos extremos noutras partes do mundo, pode ter um impacto direto na inflação e na estabilidade económica. À medida que as alterações climáticas alteram os padrões de produção e distribuição, as economias mais interligadas podem enfrentar crises mais profundas.
É essencial que os governos e as empresas colaborem para desenvolver estratégias que não só respondam aos desastres, como também previnam a sua ocorrência e minimizem os seus efeitos. A resiliência e os planos de adaptação devem ser o novo lema. Investir em infraestruturas capazes de suportar a força da natureza e promover uma gestão sustentável dos recursos são passos fundamentais. A educação e a sensibilização para os riscos climáticos devem ser uma prioridade, capacitando as comunidades para se prepararem para o imprevisto.
O estudo do BIS realça a necessidade urgente de se abordar o impacto macroeconómico dos desastres climáticos, sendo evidente que a integração de análises de risco climático nas decisões de investimento e no planeamento económico pode contribuir para a construção de economias mais resilientes. Em Portugal, é necessário implementar medidas que considerem os riscos ambientais nas políticas públicas, nos investimentos, nas despesas e nas projeções de crescimento do PIB para os próximos anos.
Na semana passada, o Comité de Alterações Climáticas do Reino Unido escreveu uma carta ao Governo a chamar a atenção para a necessidade de desenvolver medidas sérias e urgentes de adaptação climática, pois existe uma probabilidade significativa de a temperatura atingir +2 °C em 2050 e não em 2100, como se pensava em 2015.
Toda a informação a que temos acesso indica que a temperatura está a aumentar a uma velocidade bastante superior à prevista. Os economistas já reconhecem que os riscos climáticos afetam a macroeconomia de um país, sendo necessário incluí-los nos modelos macrofiscais e nos processos de gestão das finanças públicas. Sendo Portugal um dos países europeus mais vulneráveis às alterações climáticas, deveria colocar este tema em cima da mesa de forma transversal e coerente desde já.
PhD, CEO da Systemic
