bateria sódio
Em forma de filme fino, dispositivo pode ser aplicado sobre superfícies. Foto: Maria Karolina Ramos/GQM/UFPR

Baterias fazem parte do nosso dia a dia. Elas estão presentes em celulares, carros, notebooks, marca-passos, câmeras digitais e assim por diante. É possível pensar em uma série de objetos eletrônicos de comunicação, informática, transporte e até saúde que são alimentados por baterias.

As baterias convencionais são amplamente feitas de lítio, um metal que, embora tenha alta eficiência, traz uma série de riscos ambientais e de segurança. Por isso, pesquisadores vêm tentando desenvolver baterias de elementos alternativos ao lítio, como sódio e potássio, elementos mais fáceis e baratos de encontrar na natureza.

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Baterias transparentes, flexíveis e aquosas possibilitam mais funcionalidades.

Uma das pesquisas tem à frente Aldo José Gorgatti Zarbin, professor do Departamento de Química da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e que pesquisa o tema há 28 anos. O docente, junto com pesquisadores do laboratório que coordena, o Grupo de Química de Materiais (GQM), usou o sódio encontrado no sal de cozinha para criar um protótipo de bateria funcional que reúne, simultaneamente e de forma inédita para o setor, três características: é flexível, transparente e funciona em meio aquoso, eliminando riscos de explosões.

A bateria foi desenvolvida durante o mestrado, o doutorado e o projeto de pós-doutorado da pesquisadora Maria Karolina Ramos. Os atributos possibilitam uma série de aplicações inovadoras das baterias, desde eletrônicos vestíveis até janelas inteligentes.

O estudo foi capa recente da revista Sustainable Energy & Fuels, da Royal Society of Chemistry. A pesquisa ainda rendeu uma premiação ao professor no Prêmio Paranaense de Ciência e Tecnologia, iniciativa do governo do Paraná que reconhece profissionais que contribuem para a produção científica e tecnológica do estado.

A motivação para o desenvolvimento da bateria, além de suas diferentes aplicações, também foi pensando na descarbonização da matriz energética, em uma busca por fontes de energia renováveis.

“Há pouco tempo tivemos a COP 30, falando sobre energia limpa e como é fundamental que a gente elimine combustível fóssil, para parar de emitir gás carbônico”, afirma o docente. “Uma das formas de você pegar energia é solar. Mas e à noite, quando não tem sol, como fica? Precisamos de bateria para armazenar essa energia, por isso elas são extremamente importantes no processo de descarbonização e de energia limpa”.

Nanoarquitetura abre caminho para baterias de sódio

O lítio é um metal leve, com grande capacidade de armazenamento de energia, encontrado principalmente em salmouras de lagos salgados ou em pegmatitos, que são rochas ígneas que contêm cristais e minerais ricos em elementos raros.

De acordo com o Serviço Geológico do Brasil (SGB), Chile, Austrália, Argentina e China detêm juntos cerca de 95% das reservas de lítio atualmente conhecidas no mundo. No Brasil, o metal é encontrado em depósitos de pegmatitos, especialmente nas áreas do Médio Jequitinhonha, em Minas Gerais, e da Província Pegmatítica da Borborema, na região Nordeste.

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Ilustração que mostra o funcionamento da bateria de íon-sódio,

“Por muito tempo, as baterias de íons de lítio dominaram a eletrônica portátil graças à sua alta capacidade de armazenamento e longa duração. A importância delas foi reconhecida até com o Nobel de Química de 2019 [para John B. Goodenough, M. Stanley Whittingham e Akira Yoshino, considerando as baterias de lítio uma revolução da eletrônica portátil]”, conta Maria Ramos.

“Mas nem tudo são flores: essas baterias usam solventes orgânicos tóxicos e inflamáveis, podem causar curto-circuito e até explodir. Além disso, dependem de reservas de lítio, que é um elemento químico escasso. São reservas concentradas em poucos países e causam um grande dano ambiental na sua extração, o que tornam essas baterias muito caras”.

Além de provocar atritos geopolíticos, a mineração do lítio tem alto impacto ambiental, decorrente do uso intensivo de água e da ameaça de contaminação por metais pesados. Ao contrário do lítio, o sódio é mais abundante, barato e distribuído por todo o planeta. Sua obtenção é considerada de menor impacto ambiental — especialmente quando extraído do mar, como ocorre com o sal de cozinha.

Mas apenas substituir um elemento por outro não é uma tarefa simples. O desafio é encontrar materiais capazes de armazenar e liberar íons de sódio com a mesma eficiência do lítio, pois as diferenças de tamanho e química entre os elementos exige novos componentes para os polos da bateria.

Para isso, o laboratório coordenado por Zarbin utilizou a técnica de nanoarquitetura para chegar em uma combinação de três materiais diferentes, em escala nanométrica, que pode ser usada como eletrodo na bateria de íon-sódio.

“Toda a base do estudo é uma tecnologia de preparar materiais na forma de filme fino, que foi totalmente desenvolvida no meu laboratório. Isso significa conseguir preparar um material com uma espessura muito fina, muito fina mesmo, de poucos nanômetros de espessura. A gente consegue depositar esse material em cima de qualquer coisa, como um sólido, uma superfície, uma mesa, qualquer lugar. E é essa tecnologia que é o grande diferencial para conseguir as propriedades que a gente teve”.

A composição obtida com a nanoarquitetura consta no artigo “Nanoarchitected graphene/copper oxide nanoparticles/MoS2 ternary thin films as highly efficient electrodes for aqueous sodium-ion batteries”, publicada em 2023 por periódico da Royal Society of Chemistry.

Bateria de íons-sódio

Baterias transparentes, flexíveis e aquosas possibilitam mais funcionalidades. Os materiais utilizados para essa bateria de íons-sódio não apenas fazem a bateria funcionar. A composição assegurou que os pesquisadores fabricassem uma bateria com uma série de características combinadas que, até então, eram inéditas.

Uma dessas propriedades é a flexibilidade, um atributo para baterias considerado uma das tecnologias mais emergentes e importantes na atualidade e que pode ter uma série de aplicações. Leves e maleáveis, as baterias de íon-sódio podem se curvar e dobrar sem perder a funcionalidade, mas vão além: elas representam a remoção de uma restrição tecnológica que limita o design de novos dispositivos. Atualmente, mesmo em dispositivos dobráveis (como certos smartphones), a bateria permanece como um componente rígido e volumoso.

Entre as diversas aplicações, uma bateria flexível pode ser utilizada em eletrônicos vestíveis na área da saúde. “Você pode colocar um dispositivo na roupa, por exemplo, que pode acompanhar a taxa de glicose de alguém, ou o seu batimento cardíaco, um acompanhamento in-situ vinculado à roupa do sujeito. Ele vestiu e está lá. Então, para isso tem que ser dobrável, a nossa roupa é dobrável. Em qualquer tipo de dispositivo que você possa imaginar que seja vestível, a gente poderia usar essa tecnologia”, afirma Aldo Zarbin.

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O professor ainda cita o exemplo de uma bateria que pode ser dobrada e guardada dentro de uma carteira, ocupando espaço mínimo. Quando necessário, o usuário a desdobra para carregar um celular ou laptop; a flexibilidade das baterias também pode ser um atrativo para eletrônicos enroláveis ou papéis eletrônicos, tecnologia vista em dispositivos como leitores digitais (o Kindle, por exemplo).

Outro atributo viabilizado pelas novas baterias de íon-sódio é a transparência, que foi possível pela tecnologia de filmes finos utilizada para arranjar os componentes da bateria de íon-sódio: o material é tão fino que a luz visível o atravessa. Essa característica é crucial para acoplar a bateria a sistemas que exigem passagem de luz, como células solares (componentes dos painéis solares, por exemplo) e janelas inteligentes, que ajustam automaticamente a entrada de luz e calor em ambientes internos.

“Ao invés de fechar uma cortina de pano ou uma persiana, eu simplesmente vou escurecendo o vidro, deixando passar mais ou menos luz”, explica Zarbin. “Para isso eu preciso de uma bateria também, é um material chamado eletrocrômico, que muda de cor de acordo com o potencial que a gente aplica. Se a bateria for transparente, eu consigo acoplar numa única coisa”.

Por fim, o grupo liderado por Aldo Zarbin também conseguiu encontrar uma bateria de íons de sódio que, além de ser flexível e transparente, também funciona em meio aquoso. Isso melhora um fator fundamental: a segurança.

Apesar de serem eventos raros, as baterias de íon-lítio estão sujeitas a riscos de explosões e incêndios, que podem ser causadas por danos físicos, superaquecimento e envelhecimento. Isso porque o eletrólito das baterias de lítio é composto por um material inflamável e tóxico.

Ao substituir esses materiais por água, elimina-se o risco de inflamabilidade. Assim, baterias aquosas oferecem alta tolerância o contra manuseio incorreto, tornando-se mais segura em relação a potenciais curtos-circuitos que levem a explosões.

“Em síntese, a invenção apresenta um conjunto de vantagens técnicas e econômicas que a diferenciam significativamente das tecnologias existentes: é segura, ecológica, de baixo custo, leve, flexível e transparente, combinando sustentabilidade com alto desempenho”, afirma Maria Ramos.

Por Luana Lopes | Sucom-UFPRleia aqui o texto na íntegra

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By Daniel Wege

Consultor HAZOP Especializado em IA | 20+ Anos Transformando Riscos em Resultados | Experiência Global: PETROBRAS, SAIPEM e WALMART

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