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magine acordar e precisar deixar tudo para trás—suas roupas, suas coisas, sua casa, sua vida. Essa foi a realidade de milhares de pessoas no Líbano, país do Oriente Médio, incluindo Fátima Cheaitou, de 25 anos.

Criada na Bahia, a jovem influenciadora voltou a morar no Líbano, mas viu sua rotina virar de cabeça para baixo por conta dos ataques israelenses ao país onde morava com a família.  

“Escutávamos as bombas todos os dias. É um terror psicológico que nunca nos deixa em paz. A cada explosão, uma parte de nós se despedaça”, conta em entrevista à CAPRICHO.

A escalada da violência nos últimos meses deixou um rastro de destruição. “Em um único dia, mais de 3.000 feridos. Hospitais lotados, pessoas perdendo as mãos, os olhos… É surreal, como um filme de terror”, diz. “Cada explosão não era só um estrondo, mas uma lembrança de que a paz parece distante.”  

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A decisão de fugir veio no susto. “Foi desesperador. Na correria, você não sabe o que levar. Apenas escuta as explosões e coloca qualquer coisa na mala.”

O caminho de Tiro, sua cidade, até Beirute, capital do Líbano, foi cheio de tensão. “Foram dez horas na estrada, tentando achar conexão. Passei horas sem conseguir falar com minha mãe, e isso me deixou em pânico.”  

A guerra não acabou

A invasão do Líbano por Israel começou em 1 de outubro de 2024, quando Israel invadiu o Líbano como parte de uma escalada no conflito em curso entre Israel e Hezbollah.

Assim, Israel partiu para a ofensiva no Líbano após quase um ano de trocas de hostilidades na fronteira, desencadeadas pela guerra em Gaza, dizendo que quer garantir o retorno seguro dos moradores das áreas de fronteira que foram desalojados pelos ataques do Hezbollah.

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Embora o Hezbollah tenha sido enfraquecido, ele não foi derrotado. O grupo continua a disparar foguetes no norte de Israel — e ainda acredita-se que possua um enorme arsenal incluindo mísseis de longo alcance.

O medo aumentava com a falta de comunicação. “Eles cortaram o sinal, e a gente só conseguia um pouco de conexão de tempos em tempos. É desesperador não saber se sua família está bem”, lembra. “Eu estava em modo de sobrevivência, longe de casa, e a ficha não tinha caído de que estava realmente fugindo.”  

Após a passagem pela capital libanesa, Fátima e sua família conseguiram um voo para Paris antes de chegarem ao Brasil para se refugiarem da guerra.

“Quando cheguei no aeroporto, chorei. Até então, eu só estava sobrevivendo. Mas, quando finalmente estava longe, a tristeza bateu. Eu não queria abandonar minha casa, não queria sair e não saber se voltaria algum dia.”  

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Já em São Paulo, os traumas da guerra ainda se faziam presentes.”Ficamos assustados com o barulho da chuva. Cada trovão parecia uma bomba. Eu me pegava esperando por uma explosão que nunca vinha, mas a ansiedade permanecia.”  

A volta para casa

"Escutávamos as bombas todos os dias. É um terror psicológico que nunca nos deixa em paz. A cada explosão, uma parte de nós se despedaça"
“Escutávamos as bombas todos os dias. É um terror psicológico que nunca nos deixa em paz. A cada explosão, uma parte de nós se despedaça” Fátima Cheaitou/Arquivo Pessoal/Reprodução

Em janeiro de 2025, com o anúncio de um cessar-fogo, Fátima e sua família finalmente puderam voltar ao Líbano. “Foi uma madrugada longa. A gente ficou acordado esperando esse momento. Assim que entrou em vigor, as pessoas começaram a voltar. Já tinha trânsito, e meus irmãos me mandavam fotos do caminho”, relembra.  

O alívio veio com uma realidade dura. “Você está feliz por voltar, mas não sabe o que esperar. Quando vimos a destruição, a ficha caiu. Um amigo do meu pai foi até nossa casa e nos enviou fotos e vídeos. Quando soubemos que a casa ainda estava de pé, agradecemos a Deus. Tiveram danos, mas foram mínimos comparados ao que poderia ter acontecido.”  

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O acordo de cessar-fogo, firmado em novembro de 2024 entre Líbano e Israel, inicialmente afirmava que as tropas israelenses tinham até 26 de janeiro para se retirar do sul do Líbano. No entanto, no final de janeiro deste ano os Estados Unidos anunciaram uma extensão do acordo, que foi até 28 de fevereiro.

Um amigo do meu pai foi até nossa casa e nos enviou fotos e vídeos. Quando soubemos que a casa ainda estava de pé, agradecemos a Deus.

A varanda, por exemplo, desabou parcialmente após a explosão de uma bomba próxima. “Se tivesse sido um pouco mais para frente, teria destruído metade da casa. Mas, graças a Deus, foram danos que conseguimos consertar”, diz.  

Outras pessoas não tiveram a mesma sorte. “Minha tia está morando com a gente porque o prédio dela desabou por completo. Nos acostumamos com a presença dela, é bom ter a família perto, mas é triste pensar no motivo pelo qual estamos juntos.”  

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Mesmo com a volta, o medo ainda existe. “O som dos aviões de guerra continua. Às vezes, o vento forte ou uma tempestade fazem todos acordarem assustados. Uma vez, mandaram uma mensagem nos grupos de notícias dizendo que era só uma tempestade. Eu quis rir e chorar ao mesmo tempo. Olha a situação em que estamos, onde qualquer barulho nos faz pensar que é uma bomba.”  

Imagine acordar e precisar deixar tudo para trás—suas roupas, suas coisas, sua casa, sua vida. Essa foi m a realidade de milhares de pessoas no Líbano, incluindo Fátima Cheaitou, de 25 anos.
Imagine acordar e precisar deixar tudo para trás—suas roupas, suas coisas, sua casa, sua vida. Essa foi m a realidade de milhares de pessoas no Líbano, incluindo Fátima Cheaitou, de 25 anos. Fátima Cheaitou/Arquivo Pessoal/Reprodução

Apesar de tudo, estar de volta ao Líbano é um misto de sentimentos. “Na hora que pousei, chorei. Eu estava voltando para casa, mas, ao mesmo tempo, a cada rua que eu passava, meu coração se partia mais. Lugares que eu conhecia estavam irreconhecíveis. Alguns prédios que serviam como referência simplesmente não existem mais. Você olha ao redor e se perde, porque o cenário mudou completamente.”  

A destruição é difícil de processar. “Em alguns lugares, onde antes havia prédios e mais prédios, agora dá para ver o outro lado do bairro. É como se, de repente, em São Paulo, tirassem todos os edifícios da Sé, e você conseguisse ver ruas que nunca viu antes. É surreal.”  

Dois meses depois, Fátima ainda tenta se readaptar. “Passo por algumas ruas e ainda me choco. Cada esquina traz um choque de realidade. Mas estamos aqui, reconstruindo aos poucos. Só queria que ninguém tivesse que passar por isso.”

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By Daniel Wege

Consultor HAZOP Especializado em IA | 20+ Anos Transformando Riscos em Resultados | Experiência Global: PETROBRAS, SAIPEM e WALMART

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