Dispersão de pesticidas com o vento traz impactos para a saúde pública, o meio ambiente e a agricultura familiar.
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Denúncias da Comissão da Produção Orgânica de Minas Gerais sobre os impactos da aplicação de agrotóxicos por meio de drones nos Vales do Mucuri e do Rio Doce ilustraram o desconforto de agricultores e ambientalistas com a prática, em audiência pública da Comissão do Trabalho, da Previdência e da Assistência Social da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) realizada nesta quarta-feira (10/9/25).
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Em Poté (Jequitinhona/Mucuri), no final do ano passado, um drone voando a mais de 30 metros de altura causou a dispersão de agrotóxico no espaço de produção orgânica de uma família, quando o vento levou o produto para fora do alvo.
Em Pavão, na mesma região, famílias da comunidade Córrego do Café sofreram com uma série de aplicações do herbicida glifosato, via drone acima de 20 metros de altura, em janeiro deste ano. Um casal de idosos teve que abrir mão da gôndola na feira regional de produtos orgânicos, que ocorre semanalmente na cidade.
Já em Jampruca, no Vale do Rio Doce, também em janeiro, a pulverização atingiu árvores matrizes da mata atlântica, que fornecem sementes recolhidas por um grupo de mulheres assentadas da reforma agrária. O trabalho garante a renda de aproximadamente 150 famílias, a partir da venda das sementes para recuperação de áreas degradadas.
De acordo com Lúcia Pereira, de Jampruca, árvores onde sementes eram colhidas morreram e representantes da comunidade foram ameaçados a cada denúncia. Ela explicou que as terras concedida às famílias assentadas não eram as mais adequadas para a produção, que só foi possível com o método agroecológico.
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O promotor Luciano Martins informou que o Ministério Público já instaurou procedimentos para apurar as denúncias. O Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar também manifestou apoio à denúncia e à penalização dos infratores, conforme o representante da pasta na audiência, José Marcos Beraldo.
Drones potencializaram o uso de agrotóxicos
Presidente da Comissão do Trabalho, o deputado Betão (PT) disse que o uso indiscriminado de agrotóxicos por meio de drones tem se configurado como um ataque direto à saúde pública, ao meio ambiente e à agricultura familiar. “O agrotóxico não respeita cercas, atinge alimentos, rios e o ar que respiramos”, afirmou.
“A pulverização aérea por drone hoje é ameaça de morte. O agrotóxico exclui, degrada e mata”, complementou o deputado Leleco Pimentel (PT).
O deputado federal Padre João (PT-MG) contrapôs o argumento de que os drones seriam mais precisos. Segundo ele, as aeronaves são usadas por grandes proprietários de terra, enquanto os drones são contratados por hora até por pequenos produtores, muitas vezes sem o rigor necessário e aumentando a escala do uso de agrotóxicos.
1ª vice-presidente da ALMG, deputada Leninha (PT), foi taxativa ao dizer que é possível produzir sem veneno e que o aumento dos casos de cânceres e outras doenças está relacionado aos alimentos consumidos – e contaminados – atualmente.
Subsecretário da Secretaria de Estado de Saúde, Fellipe Antônio Chaves citou estudos os quais indicam que apenas 32% dos agrotóxicos pulverizados no céu atingem as plantas. Entre as consequências para a saúde humana, estão alterações celulares, doenças crônicas e a contaminação de alimentos.
Ainda de acordo com o gestor, 385 milhões de pessoas são intoxicadas por agrotóxicos no mundo por ano, sendo que o Brasil registrou um aumento de 109% nos casos de 2010 a 2019. Em Minas Gerais, foram mais de 11 mil notificações por agrotóxicos entre 2018 e 2023.
Legislação carece de maior regulamentação
Engenheiro Agrônomo, Josean Vieira ponderou que a pulverização com drones precisa de muitos cuidados com um rol de variáveis, a exemplo da altura de aplicação, a regulagem de vazão dos bicos, a velocidade dos ventos e a mistura de agrotóxicos dispersados.
De acordo com o especialista, a legislação não trata dessas peculiaridades e poderia ser mais restritiva e rigorosa. Também para Leonardo do Carmo, gerente do Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA), a legislação federal tem lacunas que dificultam a fiscalização.
Auditora fiscal da Divisão de Aviação Agrícola do Ministério da Agricultura e Pecuária, Uéllen Colatto confirmou que a regulamentação da dispersão de agrotóxicos por drones está sendo revista, em função do rápido avanço da tecnologia. No entanto, ela acredita que o maior problema está no despreparo dos produtores que estão adquirindo os drones, e não nos veículos aéreos em si, automatizados e rastreáveis.
De forma semelhante, o deputado Antonio Carlos Arantes (PL), em contraponto aos colegas parlamentares, classificou a tecnologia por drones como um avanço que facilitou a vida do agricultor. Ele defendeu a utilização de defensivos agrícolas de forma moderada, que seriam essenciais para o fornecimento regular de alimento aos mais de 210 milhões de brasileiros.