Cidade do Extremo Sul de Santa Catarina tenta reerguer setor que transformou o turismo da Capadócia Brasileira

O balonismo em Praia Grande, cidade localizada ao Extremo Sul de Santa Catarina, ganhou destaque internacional após o acidente que matou oito pessoas durante um passeio turístico no dia 21 de junho. A tragédia paralisou a atividade, que tem previsão de retomada nesta segunda-feira (30).
Em função do acidente, a taxa de cancelamentos de voos ultrapassa 60%, o que provoca cancelamentos de reservas também em hotéis, baixa no movimento em restaurantes e prejuízo a toda uma cadeia produtiva integrada por mercados, fornecedores, logística e comércio em geral.
Diante deste cenário, a reportagem apurou o que, de fato, o balonismo significa para a economia e o quanto ele se expandiu desde 2017, quando as primeiras agências promotoras de voos abriram as portas em Praia Grande. Dados da Secretaria Municipal de Cultura e Turismo indicam que até 80% da economia local é movimentada pelo balonismo, que é tratado como um marco no crescimento socioeconômico e como fundamental para o futuro da cidade.
Reconhecida como a Capital dos Canyons, Praia Grande tem mais de 200 empreendimentos ligados ao programa Turismo Legal. Estima-se que antes do balonismo, esse número não chegava a 20. De 2017 para cá, foram realizados mais de 40 mil voos, consolidando o setor como a “maior indústria” da cidade, que ganhou um novo título: de Capadócia Brasileira.
Balonismo em Praia Grande potencializou o turismo e a economia
A indústria do balonismo é tocada por mais de 30 empresas que operam com 70 balões. Antes dos voos se consolidarem, a cidade já era conhecida pelo potencial natural aproveitado no ecoturismo e no turismo de aventura, porém, o secretário de Cultura e Turismo, Henrique Maciel, acredita que o balonismo cresceu durante a pandemia e potencializou tudo isso.

“Com a chegada dos voos de balões aqui na cidade, nós tivemos um salto extraordinário porque a gente conseguiu unir o potencial natural, onde através dos voos é possível fazer a contemplação de toda a área natural no contorno da cidade. Realmente, foi um grande salto. Posso dizer que teve dois momentos: um momento antes do balonismo em Praia Grande e outro depois dele”, explica.
Empresário aproveita movimento turístico para expandir os negócios
Integrado na cadeia econômica do balonismo em Praia Grande, o empresário Ramon Maciel, dono de uma pousada e gerente de um restaurante em Praia Grande, reconhece o quanto o setor melhorou o desempenho dos negócios. O restaurante funciona desde 2008. Mas a pousada foi inaugurada em 2022, justamente para abrigar a grande quantidade de turistas que passaram a frequentar o município.
“Começamos a construir chalés voltados para esse pessoal que vinha muito cedo para voar e não tinha um local para dormir antes de chegar na cidade. Então, foi onde a gente começou a fazer chalés, voltados para esses casais, para essas famílias. Hoje, a média na nossa hospedagem gira em torno de 70% de hóspedes que vem exclusivamente para o voo de balão”, conta Maciel.
A outra porcentagem de cliente está ligada às demais atividades turísticas da cidade, enquanto a clientela do restaurante, aos finais de semana, é 90% voltada ao turismo. “Mas devido a tudo o que aconteceu, muitos estão deixando de vir à cidade, alguns estão cancelando e outros reagendando para datas futuras”, lamenta.

Piloto monta agência e prospera em Praia Grande
O empresário Murilo Pereira Gonçalves, de Sombrio, é dono de uma agência promotora de voos de balão em Praia Grande. Ele estabeleceu a empresa em 2017, tornando-se um dos pioneiros da atividade neste local. De lá para cá, a empresa realizou cerca de 18 mil voos e já conta com dez balões.
“Se tu falar de Praia Grande, não tem como não lembrar dos balões e dos cânions. Os cânions vieram primeiro, mas os balões conseguiram vender a imagem deles ainda melhor. Os balões são a porta de entrada do turismo. Depois disso, claro, surgiram várias outras atividades, que com certeza também estão sendo impactadas”, disse.
Murilo é piloto desde 2015 e já realizou cerca de 2,4 mil voos. Atualmente, é presidente da Associação de Pilotos de Balão de Praia Grande, que conta com mais de 40 pilotos, todos diretamente afetados pela paralisação da atividade e pelas incertezas que pairam sob o seguimento após a tragédia.
“O equipamento é muito seguro, a gente tem capacidade e também experiências internacionais, onde a gente faz voos lá fora para ter esse intercâmbio e conhecer um pouco do equipamento lá fora. Em todo o mundo é usado o mesmo equipamento, sendo que são feitos os voos diários, não só na Praia Grande, mas ao redor do mundo. E isso só mostra o quão seguro é o balonismo, o esporte balonismo. Infelizmente, algo aconteceu pelo efeito externo, algum objeto externo ou algo que não deveria estar ali, mas o equipamento do balão é muito seguro”, garante.

Momento é de “escrever uma nova página”
A consternação em torno do acidente e o luto ainda são evidentes em Praia Grande, que viveu a sua primeira tragédia com morte no balonismo. Agora, as lideranças do setor prometem fortalecer a luta pela regulamentação da atividade junto à Anac (Agência Nacional de Aviação Civil). Hoje, os passeios turísticos não são regulamentados pelo órgão, que certifica apenas o balonismo como esporte radical de alto risco.
O desafio também está em padronizar os procedimentos de segurança adotados pelas agências responsáveis pelos voos e enrijecer as inspeções de equipamentos, como os extintores, inclusive aumentando para dois a quantidade disponível nos cestos.
O secretário de Cultura e Turismo, Henrique Maciel, lembra outras tragédias ocorridas no Brasil para exemplificar que é momento de estabelecer um novo capítulo para o balonismo em Praia Grande e no Brasil.
“O Brasil precisa fazer a sua parte. Na verdade, essa é a grande questão. Infelizmente, não deveria ser assim, mas a gente já tem outros exemplos no Brasil, como o acidente de Capitólio, o acidente da Boate Kiss, que mudou muitas realidades. E esse acidente, eu acho que ele vai escrever agora uma nova página, um novo início, uma nova era para o balonismo nacional, eu não tenho dúvidas disso”, avalia.
Onde fica Praia Grande
O município de Praia Grande, localizado 270 quilômetros ao Sul de Florianópolis, fica na divisa com o estado do Rio Grande do Sul. Reconhecida como a Capital dos Canyons, a cidade tem em seu território 11 canyons, considerados entre os principais do Parque Nacional de Aparados da Serra.

“Praia Grande já é consolidada por ter realmente uma vista privilegiada e única no Brasil, em função de sermos um território de reconhecimento internacional, como Geoparque Mundial da Unesco. Isso faz com que todo esse complexo natural atraia turistas para cá. E por isso que deu muito certo o balonismo em Praia Grande, por isso que Praia Grande se tornou essa joia preciosa para o balonismo nacional”, argumenta o secretário.
De acordo com dados da Prefeitura de Praia Grande, vivem mais de 8 mil pessoas no município, distribuídos entre a zona urbana (59,13%) e rural (40,87%). Além do balonismo, a cidade oferece serviços como SPAs, chalés e campings, além de atividades voltadas para o ecoturismo e turismo de aventura.