Qual é, afinal, o som mais alto que a Terra já ouviu? A pergunta é simples, mas a resposta se complica quando os fenômenos ultrapassam o comportamento esperado do ar. Acima de 194 decibéis, o meio deixa de vibrar e passa a agir como uma muralha de pressão em movimento, o que faz muitos dos estrondos históricos escaparem da definição clássica de som. Isso explica por que medir tais eventos é um desafio permanente para a ciência.
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O limite das medições fica evidente em episódios como a erupção do Krakatoa, em 1883. O estrondo foi ouvido a milhares de quilômetros e a onda de choque deu a volta ao planeta sete vezes. Reconstruções modernas sugerem cerca de 310 decibéis, nível em que o som deixa de existir como vibração. “Podemos fazer suposições sobre a propagação do som, mas elas são extremamente incertas”, resumiu Michael Vorländer, professor do Instituto de Audição e Tecnologia Acústica da RWTH Aachen.
Erupções, explosões e ondas que atravessam continentes
De acordo com o Infobae, em 1908, a explosão de Tunguska voltou a testar os limites. Estimada acima de 300 decibéis, devastou milhões de árvores e derrubou pessoas a centenas de quilômetros. Diferente do Krakatoa, o estrondo teve origem no impacto e na desintegração de um asteroide, mostrando como até eventos espaciais moldam a acústica extrema da Terra. No século XX, a Tsar Bomba, detonada em 1961, atingiu cerca de 224 decibéis e foi ouvida a quase 900 quilômetros, tornando-se o som artificial mais poderoso já produzido ao ar livre.
A era moderna trouxe um novo recordista: o Hunga Tonga, cuja erupção submarina em 2022 gerou uma elevação de pressão de 1800 pascais, equivalente a 256 decibéis se convertido diretamente para dB. O especialista em infrassom Milton Garcés ressalta, porém, que essa conversão “está cientificamente incorreta”, já que o fenômeno se comportou mais como um pulso de ar do que como um som convencional. Ainda assim, o estrondo foi ouvido do Alasca à Europa Central.
Além das explosões colossais, a natureza viva também desafia expectativas. A baleia-cachalote emite cliques de até 236 decibéis, o som biológico mais intenso conhecido, capaz de causar danos a humanos próximos. Na floresta, os bugios chegam a 140 decibéis, enquanto o minúsculo camarão-pistola produz um estalo de 210 decibéis ao implodir uma bolha com sua garra — um lembrete de que tamanho não define impacto acústico.
Nos laboratórios, pesquisadores têm rompido fronteiras ao criar ondas de pressão gigantescas. Em um experimento recente, um laser de raios X impulsionou um jato microscópico de água, liberando pressão equivalente a 270 decibéis. Nada, porém, pôde ser ouvido: o teste ocorreu no vácuo, ambiente em que o som não existe. Garcés comparou o fenômeno ao espaço: “Uma supernova pode gerar enorme pressão de radiação, mas ela não se irradiaria como o que chamamos de som.”
A resposta à pergunta inicial depende, portanto, do critério adotado. Para medições modernas, Tonga lidera. Para a história, Krakatoa e Tunguska continuam gigantes imbatíveis. No reino animal, a cachalote não tem rivais. Mais do que números, esses eventos revelam como a energia extrema se propaga e mostram que os limites do som ainda são apenas parcialmente compreendidos.
