Quem defende a floresta com o corpo sofre com a escalada da violência no campo e, por enquanto, soluções institucionais não revertem esta realidade. Dados parciais de 2024 divulgados pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) no início de novembro, escancaram esse quadro: o Maranhão lidera, mais uma vez, o ranking nacional de conflitos por terra, seguido por Pará e Bahia.

Porém, um dado, em especial, chama atenção pela brutalidade: as contaminações por agrotóxicos cresceram mais de 700% no período, na região.

Enquanto esses copos resistem, entre os dias 10 e 21 de novembro, a 30ª Conferência do Clima da ONU (COP 30), realizada em Belém, reuniu representantes de governos e corporações, as “gravatas”, como define o líder indígena Wenatoa Parakanã, com o objetivo de debater metas climáticas.

A cacica Miriam Tembé resumiu a frustração de muitos: “Como discutir a solução climática sem nos ouvir?”. A pergunta ecoa o sentimento de comunidades tradicionais que veem suas realidades sendo ignoradas nos grandes fóruns. A emoção do seringueiro Udson de Souza, de Rondônia, ao relatar que um companheiro está na UTI após levar nove tiros em uma emboscada, é a face mais crua de um conflito que não dá tréguas.

Maranhão: epicentro da violência

Os números do Maranhão não são novidade nos relatórios anuais da CPT, mas a persistência do estado no topo do ranking de conflitos por terra evidencia uma crise estrutural, onde nada é feito e a o impasse não muda. O último documento “Atlas dos Conflitos no Campo” (lançado em 2024), já apontava o estado como um dos mais violentos, com 2.502 conflitos registrados na série histórica, atrás apenas do Pará. A região é palco de disputas agrárias intensas, grilagem de terras e violência contra comunidades tradicionais.

Agrotóxicos: a violência silenciosa que avança

O crescimento de mais de 700% nas contaminações por agrotóxicos é outro alerta vermelho. Esse dado vai além dos conflitos fundiários tradicionais e revela uma frente de violência mais difusa e silenciosa, que envenena terras, água e pessoas, muitas vezes de forma irreversível. A pulverização de venenos é uma ferramenta de expulsão e intimidação, e seu aumento exponencial sinaliza a intensificação de um modelo agropecuário agressivo e predatório.

O abismo entre a COP e a realidade no campo

A fala do líder Wenatoa Parakanã sobre as “gravatas” sintetiza o divórcio entre a formalidade das negociações climáticas e a urgência sangrenta do chão da floresta. Enquanto se discute o Fundo de Financiamento proposto pelo Brasil na Blue Zone, lideranças como a cacica Miriam e o seringueiro Udson lembram que a primeira medida para uma transição ecológica justa é garantir a vida e a integridade daqueles que são os verdadeiros guardiões dos biomas.

A pergunta que fica, ecoando a fala da cacica, é: as decisões da COP30 considerarão, de fato, quem defende a floresta com o próprio corpo? Ou continuarão a ser tomadas por aqueles que veem a crise climática através de gráficos e relatórios, distantes da terra conflagrada do Maranhão e de outros estados da Amazônia Legal?

By Daniel Wege

Consultor HAZOP Especializado em IA | 20+ Anos Transformando Riscos em Resultados | Experiência Global: PETROBRAS, SAIPEM e WALMART

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