A ascensão vertiginosa das empresas de tecnologia ligadas à Inteligência Artificial (IA) tem despertado temores de uma nova bolha financeira global. Assim como ocorreu no fim dos anos 1990 com as companhias da Internet, as chamadas “pontocom”, o atual entusiasmo dos investidores pode estar inflando expectativas e valores muito além do que a tecnologia de fato tem condições de entregar.
O economista Nelson Seixas, que analisou as semelhanças com crises passadas e os possíveis reflexos para o Brasil, explica que a bolha financeira é uma elevação muito rápida dos preços de ativos que não acompanha a capacidade de eles gerarem lucro. “No caso, a bolha estaria ocorrendo no mercado de ações das empresas que produzem IA.”
Ele explica que, apesar do marketing, o real estado da tecnologia de IA que é disponibilizado ao público ainda está longe das inteligências artificiais gerais, isto é, aquelas que pensam de modo semelhante aos seres humanos.
“Por isso, o valor que a elas tem sido atribuído pelos seus usuários ainda é muito baixo em relação aos investimentos. Este descompasso tende a gerar um longo período para se obter retorno pelo investimento ou até mesmo haver depreciação no valor dos investimentos reais (por exemplo, gasto em data center) com as receitas geradas pelas IA’s que ‘justificariam’ todo o investimento”, analisa Seixas.
Os impactos de uma eventual explosão da bolha dependeriam da sua intensidade. Para o economista, a consequência mais provável seria semelhante à crise das pontocom, mas com um agravante: o pano de fundo geopolítico da disputa entre Estados Unidos e China. “O governo dos EUA deverá entrar forte no mercado para garantir estabilidade com alguma espécie de plano de socorro para as empresas americanas de tecnologia que sofrerem com o endividamento ao ponto de correrem riscos de falência. Deve haver algum programa de recuperação semelhante ao que ocorre com grandes bancos que quebram”, prevê ele.
Reflexos no Brasil
Ainda que o país não esteja diretamente envolvido no núcleo da corrida tecnológica, Seixas alerta que o Brasil poderia sentir os reflexos de forma indireta. “Em vista de o Brasil não ter investimentos significativos em tecnologia de IA, não sofremos diretamente, mas a situação das nossas finanças públicas é tão grave que não temos recursos para amortizar qualquer efeito que sofrermos”, observa. A redução nos investimentos norte-americanos no mercado brasileiro seria o maior efeito, já que os EUA são os maiores investidores no Brasil
“A crise nas contas externas e públicas simultaneamente ocorrendo tende a provocar uma depressão econômica ou uma inflação descontrolada ou – o que é mais provável – um misto de ambos.” Se isso acontecer, o resultado pode ser “um desastre para o Brasil”.
Apesar do cenário potencialmente grave, Seixas mantém certa esperança: “Não acredito no pior cenário – ou talvez eu não queira acreditar que vamos nos destruir dessa forma.”
