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A essa altura, já dá pra afirmar sem medo: A Diplomata é o tipo de série que sobrevive à própria implausibilidade com tanta elegância que a gente acaba agradecendo. Debora Cahn segue brincando com o gênero político como quem tempera um drama conjugal com pólvora, e por algum milagre narrativo, tudo explode na medida certa.

O terceiro ano começa em modo emergência. O presidente Rayburn morreu (uma perda e tanto, considerando o carisma debochado de Michael McKean), e o vácuo de poder abre espaço para o delírio institucional. Grace Penn (Allison Janney, em modo imperatriz maquiavélica) assume o comando, enquanto Hal Wyler (Rufus Sewell) é escolhido como novo vice-presidente dos Estados Unidos — uma decisão tão absurda que chega a ser coerente com o universo da série. Em A Diplomata, o sistema sempre recompensa o desastre.
Keri Russell continua sendo o coração — e o fígado — desse circo. Sua Kate Wyler é uma mulher que tenta salvar o mundo enquanto o próprio casamento implode em rede nacional. Agora, além de embaixadora dos EUA em Londres, ela também é segunda-dama. É impressionante como Keri transita entre o colapso emocional e o humor involuntário de quem já ultrapassou o limite do cansaço. Em uma cena, ela negocia um acordo nuclear; na outra, tenta lembrar em que país está. É tragicômico.
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Debora Cahn mantém sua lupa afiada sobre os Wyler. O casamento, oficialmente separado mas emocionalmente pendurado por um fio, vira o grande motor da temporada. E o que poderia ser um drama doméstico se transforma em comentário político. Enquanto Kate e Hal medem egos, o planeta mede forças nucleares. A série se diverte com essa sobreposição entre o íntimo e o institucional — reuniões da OTAN que soam como DRs mal resolvidas, discussões conjugais que parecem coletivas de imprensa.
Hal alcança o ápice da autoparódia. Promovido a vice-presidente, ele vira um monumento à megalomania masculina: acredita que manipula a história, quando na verdade já é produto dela. Rufus Sewell interpreta essa ruína com um olhar cínico e quase charmoso — o de um homem que acredita em suas próprias mentiras e ainda exige aplausos por isso.
Do outro lado, Allison Janney é puro deleite como Penn: fria, teatral, consciente do próprio poder e das conveniências que ele exige. Quando ela e o primeiro-ministro britânico (Rory Kinnear, deliciosamente insuportável) decidem reescrever a verdade para proteger seus cargos, A Diplomata atinge seu auge satírico. É a arte da mentira elevada à política externa.
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A temporada também brinca com um tom quase cômico. Não chega ao estilo Veep, mas há um humor de gabinete irresistível, em que crises internacionais dividem espaço com telefonemas de ex-marido e alertas do Google Agenda. É o caos institucional transformado em rotina, e a série abraça isso com gosto.
Há espaço, claro, para romance e espionagem — afinal, ninguém é de ferro. O novo envolvimento de Kate com Callum Ellis (Aidan Turner, em ótimo timing) é menos sobre paixão e mais sobre sobrevivência. Um respiro entre sabotagens diplomáticas e jantares de Estado.
O arco final, centrado na descoberta de um submarino russo nuclear próximo à costa britânica, devolve a A Diplomata o suspense geopolítico de raiz. É o momento em que o roteiro lembra que ainda há um mundo para salvar, mesmo que todos os envolvidos pareçam mais interessados em salvar suas reputações.


Visualmente, a série segue impecável: figurinos engomados, salas de crise reluzentes e aquela fotografia que transforma a diplomacia em drama de câmara. Mas o que realmente brilha é a ideia central de Debora Cahn: o poder como forma de intimidade corrompida. Cada gesto de confiança vira um contrato implícito, e cada segredo compartilhado, uma armadilha.
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Quando Kate descobre o tamanho das conspirações que a cercam, a traição é tanto pessoal quanto política. É o ponto em que a série mostra sua melhor faceta: o equilíbrio entre cinismo e empatia, entre o colapso e o charme.
O último episódio prepara terreno para um quarto ano ainda mais explosivo. Agora, Kate não enfrenta apenas crises internacionais — enfrenta os monstros que ajudou a criar. A Diplomata termina a terceira temporada em modo alerta total: sem fé no sistema, sem paciência para as conveniências e com um sorriso cansado de quem já entendeu que, no fim, o poder é só uma forma elegante de desastre.
