Manaus/AM – A menos de dois meses da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30), que será realizada em Belém do Pará, um estudo da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em parceria com o Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá revela uma realidade alarmante: a Floresta Amazônica está se tornando uma nova fronteira para o lixo plástico. O Rio Amazonas, segundo a pesquisa, é responsável por cerca de 10% das emissões marinhas de plástico no mundo.
O levantamento, publicado na revista científica AMBIO, aponta que comunidades ribeirinhas do interior do Amazonas vivem sem qualquer estrutura de coleta seletiva ou reciclagem. Em cidades como Tefé, os resíduos sólidos — antes majoritariamente orgânicos — agora incluem garrafas PET, embalagens de alimentos e plásticos industriais que boiam nos rios e se acumulam nas margens.
“Hoje vemos pacotes de macarrão instantâneo e garrafas plásticas flutuando onde antes havia apenas cascas de frutas e espinhas de peixe”, relatam pesquisadores do Instituto Mamirauá, que atuam diretamente com populações ribeirinhas.
A ausência de políticas públicas voltadas para o reaproveitamento de resíduos e a falta de infraestrutura básica transformam o cotidiano dessas comunidades em um ciclo de contaminação. A água consumida está exposta a microplásticos, os peixes — base da alimentação local — já apresentam sinais de contaminação, e o lixo segue sem controle, atravessando cidades, países e oceanos.
A bióloga Jéssica Melo, uma das autoras do estudo, alerta que a Amazônia abriga o segundo rio mais poluído por plástico do planeta, mas ainda recebe atenção científica limitada. “A poluição por plástico é uma crise global, mas os estudos se concentram em ambientes marinhos. A Amazônia precisa entrar nesse debate com urgência”, afirma.
O epidemiologista Jesem Orellana, da Fiocruz Amazônia, reforça que o impacto da poluição plástica na região é subestimado. “Revisamos 52 estudos que mostram uma contaminação muito maior do que se imagina. A falta de reciclagem nas comunidades ribeirinhas é um dos principais agravantes”, pontua.
Enquanto capitais como Rio de Janeiro e Salvador avançam com leis que proíbem plásticos descartáveis, nenhum município do interior do Amazonas oferece reciclagem estruturada. A invisibilidade dessas comunidades nas políticas ambientais nacionais levanta questionamentos sobre o compromisso do país com a justiça climática.
Com a COP30 se aproximando, especialistas defendem que o debate sobre poluição plástica inclua as populações ribeirinhas da Amazônia. Sem estrutura, apoio ou visibilidade, elas continuam sendo vítimas e vetores de uma crise ambiental que já ultrapassa os limites da floresta.