Existe um problema e uma grande solução. Seu nome é o mais pronunciado da novela. Odete Roitman, mais do que a vilã, acabou se tornando a espinha dorsal do remake de “Vale Tudo” —ofuscando a mocinha Raquel e mesmo Maria de Fátima, que na versão original fazia avançar a trama.
Muito por causa do roteiro de Manuela Dias e da fleuma de Debora Bloch, atriz deslumbrante com força para o drama e imbatível verve cômica, a nova Odete é o motor de todos os enredos da trama. Faz sentido que o público não a queira ver morta, como acaba de mostrar uma pesquisa do Datafolha. Bloch e sua Odete são a raiz do sucesso paradoxal de um remake que, em grande parte, fracassou.
Dias deformou os personagens de Gilberto Braga. Marco Aurélio deixou de ser o inescrupuloso e charmoso vilão para se tornar fofo e emasculado. Afonso, que já era raso como mocinho, conseguiu descer a um nível insondável de insipidez. Maria de Fátima perdeu a perversidade, e Raquel, toda a fibra, apesar da boa performance de Taís Araujo.
Nesse cenário pouco inspirado, a Odete de Bloch se destaca em várias frentes. A atriz construiu uma vilã multipolar, sedutora, perversa mas sobretudo humana, capaz de amar e desejar —com tesão mesmo.
Se a Odete original, na pele de Beatriz Segall, era um tanto mais plana e previsível, embora nada menos magnética, a autora, talvez ancorada no potencial de atuação de Bloch, parece ter desviado toda a força de sua caneta para lapidar sua vilã —e deu certo. A única coisa do remake que funcionou.
Por mais racista, preconceituosa e violenta que seja a nova Odete, ela fala com um público de mulheres, a maioria da audiência da novela, que vê nela um espelho de poder e talvez de sororidade. Não são poucas as falas que demonstram um feminismo aflorado apesar de seus contornos fascistas, e isso fala mais alto que a maldade.
Faz tempo que fãs já não confundem vilões da ficção com vilões do mundo real, e parece ser reconfortante para uma vasta maioria de mulheres brasileiras —público majoritário da novela segundo o Datafolha— ver uma mulher rica, poderosa e no comando de homens muito desejáveis nas telas. É um personagem raro na teledramaturgia do país, que fez brilhar Debora Bloch como uma loba, ou “cougar”, indefectível. Salvou o remake de um completo desastre.