
Um levantamento coordenado pela Fiocruz Amazônia, em parceria com o Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, revela um cenário alarmante: a presença disseminada de plásticos em ecossistemas da Amazônia. O estudo aponta riscos não apenas para a fauna e a flora, mas também para a saúde humana, em especial de comunidades tradicionais e ribeirinhas.
A pesquisa, publicada na revista científica AMBIO, revisou 52 artigos avaliados por pares sobre a presença de macro, meso, micro e nanoplásticos em água, sedimentos, flora e fauna da região. Segundo os autores, trata-se da primeira revisão sistemática desse tipo sobre o bioma amazônico, feita a partir do protocolo internacional PRISMA-ScR.
“Revisamos 52 estudos, avaliados por pares, com uma gama de relatos sobre lixo e fragmentos de plástico em ambientes terrestres e aquáticos do bioma amazônico, o que indica um impacto muito maior do que a maioria das pessoas imagina”, explica o epidemiologista da Fiocruz Jesem Orellana, coordenador do trabalho.
Crise global, impacto local
Para a bióloga Jéssica Melo, primeira autora do estudo, a poluição plástica é uma crise global que tem recebido mais atenção em ambientes marinhos, mas ainda é pouco estudada na Amazônia. Ela lembra que o bioma abriga a maior bacia hidrográfica do mundo e o segundo rio mais poluído por plásticos.
“A contaminação de fontes importantes de alimentos e de água representa um grande risco para a Saúde Única de populações tradicionais. Identificamos lacunas urgentes em pesquisas – especialmente em fauna não piscícola, tributários, áreas remotas e outros países amazônicos – e destacamos a necessidade de mitigação direcionada por meio da gestão de resíduos e educação”, destaca Melo.
Entre as principais falhas identificadas pelos pesquisadores estão a ausência de investigações em fauna não piscícola, em tributários e em áreas mais remotas, além da falta de dados de outros países amazônicos.
Comunidades sem apoio
No interior do Amazonas, a realidade das comunidades ribeirinhas expõe a gravidade do problema. Sem infraestrutura de coleta de lixo, moradores convivem diariamente com toneladas de resíduos que chegam aos rios — muitos deles descartados pelas próprias comunidades ou por embarcações que cruzam a região.
“As comunidades não têm infraestrutura para coleta de lixo. Antigamente, os resíduos eram majoritariamente orgânicos ou biodegradáveis — cascas de frutas, espinhas de peixe — mas, hoje, vemos garrafas PET e pacotes de macarrão instantâneo boiando nos rios, com frequência”, relata um pesquisador do Instituto Mamirauá, que atua em Tefé.
Orellana reforça que, enquanto cidades como Rio de Janeiro e Salvador avançam em medidas para reduzir o uso de derivados de petróleo, como canudos e isopor, nenhuma cidade do interior do Amazonas possui sistema de reciclagem de plásticos. “Precisamos de políticas públicas que ofereçam soluções concretas para o crescente acúmulo de lixo plástico na Amazônia, mas que levem em conta desafios cruciais, como o isolamento de muitas comunidades”, defende.
O alerta dos cientistas ganha ainda mais relevância diante da COP30, que será realizada em Belém em 2025, e do prazo estabelecido pela ONU para que cerca de 180 países concluam a elaboração do primeiro tratado global contra a poluição plástica.
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