Por Lia Nara Bau / Jornalista Revista Proteção – Após a explosão ocorrida no último dia 12 de agosto, na empresa Enaex Brasil, no município de Quatro Barras/PR, em que nove trabalhadores morreram e sete ficaram feridos, iniciou-se as etapas de apuração das causas do acidente e responsabilidade da empresa em relação às suas instalações e cumprimento das normas de Saúde e Segurança do Trabalho.
A Superintendência Regional do Trabalho no Paraná começou a fiscalização nas instalações da empresa, verificando se as normas de meio ambiente de trabalho estavam sendo cumpridas, bem como se estão sendo adotadas medidas de controle de acesso ao local, eliminação do risco de novas explosões e uso de equipamentos de proteção para os trabalhadores que se encontram no local.
O engenheiro de Segurança do Trabalho e chefe do Setor de Segurança e Saúde da Superintendência Regional do Trabalho no Paraná, Daniel Francisco Quintans Riveiro, explica que a inspeção está em fase inicial e, até o momento, não é possível apresentar conclusões sobre eventuais irregularidades. “O trabalho dos auditores fiscais do Trabalho envolve a análise técnica detalhada de documentos, registros, procedimentos e das condições físicas da instalação, o que exige tempo diante da magnitude dos danos causados”, frisa.
Riveiro garante que a empresa é reiteradamente fiscalizada, tanto em suas unidades fabris, quanto em suas minas. Na unidade de Quatro Barras, onde ocorreu a explosão, a última fiscalização ocorreu em 2019, com desdobramentos até 2022, e teve como foco, segundo ele, a proteção de máquinas e equipamentos para o ajuste à NR 12 (Segurança no Trabalho em Máquinas e Equipamentos). “Na oportunidade, foram interditadas máquinas que estavam apresentando risco grave e iminente, conforme as diretrizes da NR 3 (Embargo e Interdição), e foi concedido prazo para regularizar máquinas que, embora irregulares, não apresentavam risco iminente”, detalha. As interdições foram suspensas após regularização e, no momento, o foco da equipe está na investigação técnica do acidente ocorrido.
No entanto, a conformidade com a NR 19 (Explosivos) e demais normas regulamentadoras será verificada ao longo da auditoria, de acordo com Riveiro. “Essa análise inclui cruzamento de dados documentais e inspeções no local. Somente após a conclusão será possível afirmar se houve descumprimento e quais itens estariam envolvidos”, fala o AFT em entrevista à Proteção.
Próximos passos
Concluídas as investigações serão tomadas as medidas legais e cabíveis junto ao empregador, visando à adoção de providências técnicas que previnam acidentes como o ocorrido. “Essas medidas podem incluir interdições, adequações em infraestrutura, revisão de procedimentos operacionais, reforço em treinamentos, implantação de novos dispositivos de segurança e outras providências técnicas necessárias para prevenir a repetição de acidentes”, detalha Riveiro.
O relatório de investigação e análise do acidente será, após sua conclusão, remetido aos demais órgãos, como a Advocacia Geral da União – AGU e o Ministério Público do Trabalho – MPT, para ações cabíveis no âmbito de suas competências.
“Seu primeiro erro é o último”
Há um ditado na área de explosivos que diz: “Seu primeiro erro é o último”, indicando que qualquer falha pode ser fatal.
Quem lembra da frase é o engenheiro de Segurança do Trabalho e consultor de empresas, Antonio Carlos Vendrame, que ressalta que o risco é inerente à atividade. “De forma geral, os explosivos são sensíveis ao impacto, fricção e calor. Muitos explosivos podem ser detonados por pequenas quantidades de energia mecânica ou térmica, exigindo manipulação extremamente cuidadosa. Um grande problema são as explosões secundárias, onde num ambiente industrial, uma explosão pode desencadear outras, ampliando o dano”, explica.
Os principais perigos em empresas de explosivos, segundo Vendrame, incluem: explosão acidental, podendo ser causada por impacto, atrito, eletricidade estática, faíscas, calor, mistura inadequada de componentes ou falha de equipamentos; incêndio, pois muitas substâncias são altamente inflamáveis; exposição a agentes tóxicos, sendo que alguns explosivos ou seus subprodutos são tóxicos; risco de fragmentação, em caso de explosão; e risco ambiental, pois explosões podem contaminar solo, água e ar, afetando comunidades próximas.

Mercado de explosivos
Os explosivos industriais têm aplicação predominante em três grandes segmentos: fabricação de munições, produção de artefatos pirotécnicos (fogos de artifício) e fabricação de explosivos para uso em detonações na mineração e construção civil – ramo a que pertence a empresa Enaex.
Vendrame sublinha que, no segmento de explosivos para mineração, a quantidade de fabricantes é limitada, reflexo das exigências legais e dos altos padrões de segurança necessários. Apesar disso, o setor emprega tecnologias modernas, como explosivos encartuchados, emulsões explosivas e sistemas de detonação eletrônica, visando eficiência operacional e mitigação de riscos. “A indústria de explosivos evoluiu historicamente a partir de muitos acidentes graves, levando à criação de normas e práticas de segurança cada vez mais rigorosas”, salienta.
De modo geral, o consultor fala que as empresas de explosivos tendem a adotar cuidados rigorosos em Segurança e Saúde do Trabalho, pois o risco inerente à atividade é altíssimo e qualquer falha pode resultar em acidentes catastróficos, com múltiplas vítimas e grandes prejuízos ambientais e materiais. “No entanto, a realidade pode variar bastante. Em empresas menores, terceirizadas ou em regiões com fiscalização mais fraca, ainda são encontradas práticas inadequadas, falta de manutenção, treinamentos insuficientes e até descumprimento de normas básicas. Notícias recentes mostram que, apesar dos avanços, ainda ocorrem explosões e acidentes graves, muitas vezes ligados a falhas humanas, negligência ou pressão por produtividade”, lamenta.
Avanços necessários

A NR 19 foi elaborada com base nos conhecimentos do Exército Brasileiro, é uma norma bastante detalhada e cobre muitos aspectos essenciais para a segurança do setor, como armazenamento, transporte, manipulação, sinalização, controle de acesso, distâncias mínimas, entre outros.
No entanto, Vendrame aponta que há pontos na norma que poderiam ser aprimorados. Entre eles, o consultor cita a atualização tecnológica, gestão de mudanças, cultura de segurança, planos de emergência e simulações, integração com normas internacionais e gestão de resíduos e impactos ambientais. “Finalmente, poder-se-ia aplicar para os explosivos a gestão do ciclo completo de vida, desde a fabricação até o descarte e reciclagem, tema que poderia ser incluído na NR 19”, sugere.
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