Um ano após desastre em Vinhedo, investigação não foi finalizada; comissão externa da Câmara apresenta relatório nesta semana
Brasília|Thays Martins, do R7, em Brasília
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Há exatamente um ano, o Brasil presenciava o maior acidente aéreo do país quase duas décadas. A queda do avião da Voepass, em 9 de agosto de 2024, deixou 62 mortos e, até agora, não se sabe quem foram os responsáveis pela tragédia.
O relatório do Cenipa (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos) sobre o caso continua pendente e sem previsão de entrega.
Na próxima semana, entretanto, o relatório final da comissão externa da Câmara dos Deputados sobre o caso será lido e votado. A reunião está marcada para quarta-feira (13).
O parecer, elaborado pelo deputado Padovani (União-PR), critica a atuação da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) e atribui falhas à conduta dos pilotos.
A conclusão da comissão ressalta que as gravações da cabine são essenciais para esclarecer o ocorrido. O texto também aponta o clima adverso, com severa formação de gelo, como fator determinante.
Segundo o relator, há indícios de que os pilotos não seguiram procedimentos recomendados.
Em relação à Anac, o documento afirma que a agência teve atuação “no mínimo hesitante” diante das diversas denúncias contra a Voepass.
No fim, os deputados sugerem um projeto de lei para criar um comitê de cooperação entre instituições públicas e privadas, sob coordenação da Anac, destinado ao atendimento humanizado e eficiente tanto de vítimas de acidentes aéreos quanto de familiares.
A Anac informou ao R7 que o avião estava em condição regular para operar no momento do acidente e que tem colaborado com a investigação do Cenipa e com as comissões no Congresso.
“Não é possível afirmar, neste momento, o que causou o acidente aéreo sob pena de disseminar, infundadamente, pânico e desinformação”, ressaltou.
A agência ainda disse que tem um plano de vigilância anual. “No caso da Voepass, todos os procedimentos e prazos foram executados conforme as leis brasileiras e os normativos da aviação civil vigentes no país”, destacou.
Investigação da Câmara
Ao longo de quase um ano, a comissão externa da Câmara ouviu 28 pessoas, entre representantes da Anac, do Cenipa, da Voepass e especialistas em aviação.
“Conseguimos perceber a negligência da empresa, muitas denúncias de mecânicos, ex-funcionários, pilotos, pessoas que participavam da vida ativa da empresa, dizendo de botões, treinamentos, peças que eram trocadas. Então foi um homicídio, foi, se não intencional, uma negligência muito grande”, disse Padovani.
Voepass em Terra
A frota da Voepass permanece parada, enquanto a empresa enfrenta dívidas milionárias e recuperação judicial
Voepass explica a situação
Em nota enviada ao R7, a VOEPASS Linhas Aéreas afirmou que o dia 9 de agosto de 2024 foi o mais difícil de sua história. A queda do voo 2283, na região de Vinhedo (SP), resultou em perdas irreparáveis e, segundo a companhia, um ano depois a dor permanece presente. Em mais de 30 anos de atuação, a empresa disse nunca ter enfrentado um acidente aéreo.
A companhia informou que, nas primeiras horas após a tragédia, formou um comitê de gestão de crise e mobilizou psicólogos, equipes de atendimento humanizado, autoridades públicas, seguradoras, além de suporte funerário e logístico para atender as famílias das vítimas. Segundo a VOEPASS, as questões indenizatórias estão em estágio avançado e o suporte psicológico segue disponível, assim como o apoio a homenagens realizadas pelos familiares ao longo do último ano.
A empresa declarou confiar no trabalho do CENIPA para apurar as causas do acidente e ressaltou que a investigação é complexa e envolve múltiplos fatores, sendo o relatório final o único documento capaz de apontar conclusivamente as causas. Lembrou ainda que o relatório preliminar divulgado em setembro de 2024 confirmou que a aeronave tinha Certificado de Verificação de Aeronavegabilidade válido e todos os sistemas requeridos funcionando normalmente.
A VOEPASS destacou que opera com padrões internacionais de segurança, possui certificação IOSA — concedida a empresas auditadas pela IATA — e é acompanhada periodicamente pela ANAC. “Seguimos agindo com responsabilidade, humanidade e empatia, com respeito e sensibilidade à dor dos familiares das vítimas e de toda a sociedade brasileira”, concluiu.
Relembre o acidente
O ATR 72-500 decolou de Cascavel (PR) às 11h58 com destino a Guarulhos (SP), mas caiu em Vinhedo, no interior paulista, às 13h22. A aeronave transportava 58 passageiros e quatro tripulantes. Não houve sobreviventes.
Em setembro de 2024, o Cenipa divulgou o relatório preliminar. Conforme o documento, não ocorreu comunicação de emergência antes da queda, mas o copiloto Humberto de Campos Alencar e Silva relatou intensa formação de gelo minutos antes do impacto.
Dados atmosféricos indicaram elevada umidade combinada com temperatura do ar abaixo de 0°C, favorecendo formação de gelo em aeronave severa, desde o centro-norte do Paraná até São Paulo. Essas informações estavam disponíveis antes do voo, e os pilotos tinham treinamento para lidar com tal cenário.
“As informações meteorológicas estavam disponíveis antes do horário da decolagem; os pilotos possuíam mais de 5.000 horas totais de voo e estavam com todas as licenças e certificações válidas”, afirmou, no ano passado, o tenente-coronel aviador Paulo Mendes Fróes, investigador do Cenipa.
Ele destacou que a aeronave, fabricada em 2010, estava certificada para voo em condição de gelo, e os pilotos possuíam treinamento específico para esse tipo de voo.
“Integrando a tripulação do PS-VPB, havia também duas comissárias. Ambas possuíam a Licença de Comissária de Voo e estavam com as habilitações para a aeronave tipo AT47 em vigor”, concluiu.
A Voepass está impedida de voar por determinação da Anac desde 2024, após a agência identificar falhas em aeronaves da empresa, como trincas e danos estruturais. Em abril deste ano, a companhia ingressou com pedido de recuperação judicial.
Ano mais fatal da aviação brasileira em 17 anos
O acidente com a Voepass foi o mais grave no Brasil desde 2007, quando um avião da TAM não conseguiu parar após a aterrissagem no Aeroporto de Congonhas e bateu em um prédio da companhia aérea, matando 199 pessoas.
O ano passado encerrou com 152 vítimas de acidentes aéreos no país, quase o dobro do registrado em 2023 e do acumulado após o caso da Voepass.
Desde o episódio em Vinhedo, ocorreram 121 acidentes aéreos no Brasil, resultando em 76 mortes.
Leia a íntegra da nota da Anac:
Primeiramente, a Anac reforça sua solidariedade e seu respeito aos familiares e amigos das vítimas do acidente com a aeronave da Voepass ocorrido em 9 de agosto de 2024, em Vinhedo (SP).
A aeronave da Voepass acidentada na ocasião, um ATR-72, foi fabricada em 2010 e se encontrava, pelos registros na Anac, em condição regular para operar no momento do acidente, com seus certificados de matrícula e de aeronavegabilidade válidos. O voo contava com quatro tripulantes a bordo e todos estavam devidamente licenciados e com habilitações válidas.
Sobre a investigação do acidente, ela está sendo conduzida pelo Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa). A Anac segue acompanhando, desde agosto de 2024, os desdobramentos desse trabalho e todas as informações necessárias para a realização da apuração das causas do acidente da Voepass estão sendo prontamente disponibilizadas ao órgão de investigação competente. Como esse processo segue em andamento, não é possível afirmar, neste momento, o que causou o acidente aéreo, sob pena de se disseminar, infundadamente, pânico e desinformação. Da mesma forma, dado que o Cenipa ainda não emitiu seu relatório final sobre os fatores que contribuíram para o acidente, é preciso aguardar a divulgação do referido documento, e suas eventuais recomendações, para que procedimentos sejam alterados, se necessário.
Da mesma forma que vem colaborando com o trabalho de investigação realizado pelas autoridades competentes, de acordo com as previsões legais, a Anac sempre presta informações sobre suas atividades às comissões da Câmara dos Deputados e do Senado Federal na intenção de contribuir com o Poder Legislativo. Assim, representantes da Diretoria da Agência participaram de audiências na comissão externa da Câmara dos Deputados sobre o acidente da Voepass e prestaram, nos limites legais da competência da Anac, todas as informações disponíveis sobre o tema.
Processo de fiscalização
É importante ressaltar que a Anac segue um plano de vigilância anual baseado nas características e no desempenho das empresas aéreas. A cada ano, são realizadas milhares de atividades de fiscalização, sendo uma parte programada e avisada anteriormente e outra parte não programada, sem aviso prévio. Constantemente, há centenas de servidores da Agência em atividades de fiscalização nas empresas reguladas do setor de aviação civil em todo o país. O processo de fiscalização e sanção tem etapas e níveis de comprometimento a serem seguidos pelas empresas aéreas.
No caso da Voepass, todos os procedimentos e prazos foram executados conforme as leis brasileiras e os normativos da aviação civil vigentes no país. Assim, houve realização de vigilância, operação assistida, comunicações e vistorias de conformidade com acompanhamento presencial nas atividades da empresa.
Operação assistida da Voepass
Cabe ressaltar que a Anac, após o acidente, adotou uma série de medidas para avaliar a companhia. Além das fiscalizações e monitoramento de rotina, a Agência iniciou, em agosto de 2024, a operação assistida na Voepass, um acompanhamento intensificado na rotina operacional da empresa, atuando imediatamente sobre as falhas identificadas, de maneira a prevenir degradação de segurança abaixo dos níveis mínimos aceitáveis. A prioridade foi garantir que a continuidade da operação se desse em segurança.
Os achados da fiscalização geraram, em um primeiro momento, outubro de 2024, a adoção de medidas cautelares parciais, como redução da malha da empresa e das bases de manutenção, por exemplo. Outra medida foi determinação da troca de administradores da empresa. Após a substituição, todas as tratativas da Anac com a Voepass envolveram exclusivamente os novos gestores, responsáveis pelas operações.
O objetivo foi permitir a reorganização da Voepass após a crise, com melhor foco na resolutividade das questões identificadas pela Anac. O entendimento da Agência foi o de que a redução do escopo de atuação da companhia poderia viabilizar um esforço concentrado nas melhorias necessárias.
Suspensão das operações
Entretanto, as não conformidades encontradas e a reincidência de irregularidades apontadas e cobradas pela Anac nas ações de vigilância e fiscalização anteriores na Voepass levaram à quebra de confiança de que os sistemas da empresa tinham capacidade de dar respostas à identificação e correção de riscos da operação aérea, conforme exigem as normas da aviação. Assim, a Agência entendeu que havia a necessidade de interromper as operações da empresa até que ela recuperasse sua capacidade operacional.
Diante disso, a Anac suspendeu cautelarmente as operações da Voepass em março deste ano. A decisão não teve relação direta com o acidente de 9 de agosto, até porque ainda não se conhecem as causas do acidente. A suspensão decorreu exclusivamente da constatação, por parte da Anac, de que a empresa não estava apta a garantir a gestão da segurança de suas operações sob os requisitos dos regulamentos de aviação civil vigentes.
Cassação da Passaredo
O trabalho de acompanhamento da empresa seguiu em andamento e, em junho, após um processo sancionador em que houve direito à ampla defesa e ao contraditório, a Anac decidiu pela cassação definitiva do Certificado de Operador Aéreo (COA) da Passaredo Transportes Aéreos, principal empresa do grupo Voepass.
A Agência identificou falhas graves e persistentes em processos de gestão da segurança operacional da companhia, a exemplo do Sistema de Análise e Supervisão Continuada (SASC). Não cabe recurso à decisão, que abrangeu ainda a aplicação de sanções pecuniárias (multas) no valor total de R$ 570,4 mil à Passaredo. Mesmo após a cassação, a Anac segue a apuração de falhas nos sistemas de segurança do grupo Voepass.
Cabe ressaltar que a cassação do Certificado de Operador Aéreo da empresa não foi motivada pelo acidente – ela ocorreu devido à incapacidade de a Passaredo evidenciar as correções das falhas apontadas pela Anac a partir das fiscalizações realizadas. A investigação do acidente, no âmbito da aviação civil, cabe exclusivamente ao Cenipa
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