Uma nova tecnologia desenvolvida por cientistas chineses promete transformar significativamente o futuro da exploração espacial. Em artigo publicado na revista científica Joule na última quarta-feira (16), a equipe apresentou um método inovador capaz de extrair água de amostras do solo lunar e utilizá-la na conversão de dióxido de carbono (CO₂) em oxigênio (O₂) respirável e hidrogênio (H), que pode ser usado como combustível. Essa abordagem pode ser um divisor de águas para tornar possível a permanência humana prolongada fora da Terra, especialmente na Lua.
A ideia de usar a Lua como uma base para missões espaciais mais longas não é nova. No entanto, um dos principais desafios enfrentados pelas agências espaciais é justamente o fornecimento de recursos básicos para sustentar a vida humana em ambientes extremos. Nesse contexto, a pesquisa liderada por Lu Wang e seus colegas representa uma possível solução para diminuir a dependência do transporte de suprimentos a partir da Terra. “A maior surpresa para nós foi o sucesso tangível dessa abordagem”, afirmou Wang em comunicado oficial, destacando que a integração da extração de água lunar com a conversão fototérmica de CO₂ pode melhorar a eficiência energética, além de reduzir custos e complexidade estrutural.
A inovação por trás da extração de água e conversão de CO₂
A pesquisa utilizou amostras do solo lunar trazidas pela missão chinesa Chang’E-5. Essas amostras forneceram evidências concretas da presença de água na superfície da Lua, indicando o potencial de uso de recursos locais para suprir as necessidades humanas em futuras colônias lunares. Em iniciativas anteriores, as estratégias para obter água do solo exigiam várias etapas e consumiam grandes quantidades de energia. Além disso, essas técnicas não aproveitavam o CO₂ exalado pelos astronautas para produzir recursos adicionais.
Com o novo método, os cientistas conseguiram extrair a água diretamente das amostras lunares e, em seguida, utilizar esse recurso para converter CO₂ em monóxido de carbono (CO) e hidrogênio gasoso — substâncias que podem servir como matéria-prima para a produção de oxigênio e combustível. O processo utiliza uma tecnologia fototérmica, que aproveita a luz solar para gerar calor e, assim, viabilizar as reações químicas necessárias. Além do solo da missão Chang’E-5, a equipe também conduziu experimentos com amostras lunares simuladas e um reator contendo gás CO₂, empregando um sistema de concentração de luz para ativar o processo.
Um dos minerais presentes nas amostras, a ilmenita — reconhecível por sua coloração escura e peso — foi usada para avaliar a atividade fototérmica e entender o funcionamento do novo método. A presença desse mineral no solo lunar é especialmente relevante por conter reservatórios naturais de água que podem ser aproveitados.
A relevância econômica da tecnologia é inegável. Atualmente, estima-se que o custo de envio de um único galão de água para o espaço seja de aproximadamente US$ 83 mil (cerca de R$ 463 mil). Considerando que cada astronauta consome, em média, quatro galões por dia, o gasto total com esse recurso vital é gigantesco. A possibilidade de produzir água e oxigênio diretamente no espaço reduz significativamente esse custo, além de diminuir a carga das missões e aumentar sua autonomia.
Desafios ainda precisam ser superados
Apesar dos resultados promissores obtidos em laboratório, os pesquisadores alertam que existem obstáculos relevantes para a aplicação prática da tecnologia no ambiente lunar. Entre os principais desafios estão as variações extremas de temperatura, os altos níveis de radiação e a baixa gravidade da Lua — todos fatores que afetam diretamente o desempenho dos equipamentos. Além disso, o solo lunar real apresenta uma composição irregular, o que pode influenciar a eficácia da extração de água e o rendimento das reações químicas.
Outro ponto importante é que o CO₂ liberado pelos astronautas pode não ser suficiente, sozinho, para suprir toda a demanda de água, combustível e oxigênio. A capacidade atual dos instrumentos catalíticos ainda está abaixo do necessário para sustentar a vida de forma contínua e independente fora da Terra. Os próprios autores reconhecem, no artigo, que o desempenho dos equipamentos precisa ser aprimorado para que a tecnologia seja verdadeiramente funcional em ambientes espaciais extremos.
“Superar esses obstáculos técnicos e os custos associados significativos no desenvolvimento, implantação e operação será crucial para concretizar a utilização sustentável da água lunar e a exploração espacial”, concluem os pesquisadores no estudo. Ainda assim, o avanço representa um passo importante em direção à sustentabilidade no espaço e ao futuro da presença humana fora do planeta Terra.