Pela primeira vez, cientistas brasileiros detectaram a presença de microplásticos e metais pesados nas fezes de tatu-canastra, uma espécie ameaçada de extinção. A descoberta foi realizada dentro de uma unidade de conservação ambiental e acende um alerta sobre os impactos da poluição em animais silvestres, mesmo em áreas protegidas.

A pesquisa analisou 20 amostras de fezes coletadas no PERD (Parque Estadual do Rio Doce), em Minas Gerais, e todas apresentaram contaminação por fragmentos plásticos e níveis preocupantes de metais como cromo, manganês e chumbo.
O estudo foi publicado em março de 2025 na revista científica Environmental Research e conduzido por pesquisadores da USP, UFRJ e do Icas (Instituto de Conservação de Animais Silvestres).
O tatu-canastra foi escolhido como foco do trabalho por estar na lista de espécies ameaçadas e por ser um animal que vive em contato direto com o solo, o que o torna mais vulnerável à ingestão de partículas contaminantes.

O PERD abriga o que pode ser a última população viável do tatu-canastra na Mata Atlântica, tornando os resultados ainda mais preocupantes. Os dados já foram apresentados à administração do parque, segundo os pesquisadores.
Os autores destacam que a contaminação na região é resultado de múltiplas fontes humanas, incluindo:
- Rejeitos de mineração
- Uso intensivo de fertilizantes na agricultura
- Descarte irregular de lixo
- Falta de saneamento básico nos municípios vizinhos
Essas atividades, acumuladas ao longo de décadas, contribuem para a presença de substâncias tóxicas no solo e na água.
Com o tempo, os contaminantes se acumulam no organismo dos animais — um fenômeno chamado bioacumulação.

As análises laboratoriais mostraram que os microplásticos identificados eram, em sua maioria, fibrosos, incolores e variavam entre 100 e 3.900 micrômetros. Entre os tipos mais comuns estavam:
- Polipropileno (32,5%) – usado em embalagens, copos descartáveis e seringas
- PET (22,5%) – presente em garrafas plásticas e tecidos sintéticos
- Polietileno (15%) – muito usado em sacolas plásticas e filmes de embalagem
Além dos plásticos, foram detectadas altas concentrações de metais pesados, como alumínio, ferro, chumbo, cobre, zinco, cromo, manganês e níquel.
A porção sul do parque, próxima ao Rio Doce e a áreas de plantio de eucalipto, concentrou os maiores níveis de contaminação.
Estudos anteriores mostram que a exposição prolongada a microplásticos e metais pesados pode causar infertilidade, alterações hormonais e neurológicas, danos ao fígado e rins, além de aumentar o risco de tumores em mamíferos.
Os cientistas alertam que, em animais de grande porte como o tatu-canastra, os efeitos tendem a aparecer de forma mais lenta, o que dificulta a percepção do problema. Ainda assim, os danos podem ser profundos e comprometer a sobrevivência de populações inteiras.