5 perguntas para Nelmara Arbex, sócia-líder de ESG da KPMG no Brasil Crédito: Divulgação

Redação Fast Company Brasil

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Quando Nelmara Arbex fala sobre o futuro, não há espaço para abstração. Depois de mais de 25 anos participando na interseção entre ciência, negócios e impacto socioambiental, ela aprendeu que a sustentabilidade não avançou por dúvida moral, mas por choque com a realidade.

Física teórica de formação, com passagem por organizações como Instituto Ethos, Natura e Global Reporting Initiative (GRI), onde foi CEO global, Nelmara acompanhou de perto a transformação de uma agenda que saiu da responsabilidade social, passou pelo ESG e agora entra em uma fase mais dura e menos confortável: a da implementação.

Hoje, como sócio-líder do ESG da KPMG no Brasil e nas Américas, ela observa empresas lidando com um cenário em que mudanças climáticas, eventos extremos, desigualdades sociais e pressões regulatórias deixam de ser riscos difusos para se tornar fatores concretos de negócio.

Energia, água, seguros, cadeias de valor, acesso aos mercados e atração de talentos estão sendo redesenhados em tempo real, independentemente do que os governos decidam ou deixem de decidir.

Ao olhar para frente, ela propõe uma mudança menos discursiva e mais estrutural: entender que a sustentabilidade deixou de ser uma escolha estratégica e passou a ser uma condição para continuar existindo.

Nesta entrevista à Fast Company Brasilo executivo fala sobre as lições que ficam após a COP30, o papel da China na transição climática, os limites de uma agenda ESG restrita a uma área da empresa e por que a ideia de regeneração ganha força como novo horizonte econômico.

FC Brasil – Passada a COP30, qual a lição de casa que fica para as empresas?

Nelmara Arbex – Primeiramente, que o aquecimento global segue crescendo, mesmo com todos os esforços feitos até o momento, que teremos que lidar com as mudanças climáticas e eventos extremos na próxima década e que isso vai afetar todos os tipos de negócios e a forma como vivemos e planejamos a economia.

E que, independentemente do que os governos possam acordar em fazer, temos que descarbonizar as operações no Brasil, incentivando: a) o uso de combustíveis renováveis ​​– como etanol, biodiesel e carros elétricos se forem carregados com energia elétrica de origem sustentável, como solar, eólica, hidroelétrica; b) o combate à destruição de ecossistemas, especialmente queimadas e desmatamentos.

FC Brasil – Na falta dos Estados Unidos, a China teve uma participação significativa na COP30. Como você definiria a atuação no país?

Nelmara Arbex – A China foi à COP30 demonstrando que está fazendo o máximo para reduzir a dependência de sua economia dos combustíveis fósseis. Apesar de ainda ser a maior importadora de petróleo do mundo, segue em uma jornada intensa para ser independente do petróleo. Isso tem um significado enorme em termos de geração de receitas para países que vivem de vender petróleo para a China.

alguns temas vão se importar (na agenda das empresas), como as mudanças climáticas e tudo o que elas representam.

Além disso, vieram com vários ministros, empreendedores e especialistas para mostrar que estão dispostos a colaborar para divulgar planos que tiveram grande sucesso, como a adaptação de inúmeras cidades chinesas. Ou seja, mudando o planejamento destas cidades para que se tornem resilientes ao calor e aos eventos climáticos extremos.

No cenário da COP30, ele se posicionou como o país líder da transição para uma economia de baixo carbono e resiliente às mudanças climáticas. Os Estados Unidos, aparentemente, comunicaram que não estão específicos nesses temas. Havia empresas e especialistas dos EUA presentes, mas o país estava ausente e não comunicou nada às mais de 50 mil pessoas reunidas em Belém.

FC Brasil – Com a urgência climática se impondo, você defende que as empresas não tenham opção de retroceder na agenda ESG. O assunto não deveria ficar restrito à área de sustentabilidade, mas estar no centro do negócio. Com tantas questões urgentes dentro da sua agenda ESG, como o líder deve priorizar iniciativas?

Nelmara Arbex – O que eu acho importante é que a liderança empresarial perceba que temas sociais, ambientais e éticos sempre estariam presentes no dia a dia do negócio, em cada decisão que parece somente financeira. E eles seguem presentes.

Porém, mudanças climáticas e eventos extremos vão mudar nosso acesso à energia, água, saneamento, definição de impostos, acesso ao mercado e políticas de seguros. Tudo isso sempre afetou os negócios e vai impactar ainda mais, no curto e longo prazo.

O mesmo vale para questões sociais e éticas. O tema da igualdade de direitos e evolução entre homens, mulheres e outros gêneros, o combate à violência doméstica e outras formas de violência, o acesso à saúde e à educação estarão muito presentes e impactarão a forma como fazemos negócios.

Neste sentido, estes não são temas de uma área da empresa, mas de todas as áreas: planejamento, finanças, recrutamento, vendas, comunicação, relacionamento etc. Mas alguns temas são importantes, como as mudanças climáticas e tudo o que elas representam.

FC Brasil – A sustentabilidade está dando lugar à “regeneração”. O que significa uma empresa e uma liderança regenerativa na prática?

Nelmara Arbex – Precisamos atuar em duas frentes para estabilizar o clima: primeiro, temos que reduzir a emissão de gases que provocam o efeito estufa, que vem do uso de petróleo e queimadas. Em segundo lugar, precisamos regenerar os ecossistemas que ajudem a absorver carbono, proteger os recursos hídricos e reduzir a temperatura.

Sempre falamos do primeiro aspecto e agora falamos cada vez mais do segundo, pois concluímos que não vai adiantar reduzir emissões se seguirmos com este nível de destruição dos ecossistemas. Assim, além de conservar os ecossistemas que ainda são saudáveis, precisamos regenerar os que estão degradados.

Na América Latina e Caribe, estamos falando de 600 milhões de hectares de áreas degradadas. A regeneração de parte disso já estabilizaria o clima do planeta. Sem falar do que podemos fazer para regenerar os ecossistemas oceânicos.

clarareira na floresta amazônica aberta por remoção de madeira
Crédito: Getty Images

As dimensões do nosso continente, sua relação com práticas de agricultura, seus recursos hídricos etc. fazem do nosso país e das vizinhanças uma peça fundamental na inovação da estabilização climática. Na prática, isso significa uma oportunidade de geração de negócios de trilhões de dólares nos próximos anos.

Inúmeros atores estão interessados ​​em tudo isso – além dos investidores, dos governos e dos povos guardiões dos ecossistemas. Uma combinação positiva rara de se encontrar.

A liderança das próximas fases de crescimento econômico tem que atuar nesta agenda. Por tudo, regeneração é o tema mais relevante que temos para discutir, junto com a redução drástica do uso de petróleo e das queimadas.

FC Brasil – Depois de 25 anos atuando no setor, você já testemunhou uma série de mudanças. ​​Qual ideia sobre ESG você acha que as próximas gerações consideram óbvias e que hoje ainda são radicais?

Nelmara Arbex – Dentro dos temas ambientais, acho que serão termos óbvios conta corrente de carbono – com a quantidade que emitimos e restauramos – e vamos deixar essas contas como herança para nossos descendentes. O mesmo para a quantidade de resíduos que geramos. Nossos filhos vão pastorear formalmente, como um bem, pilhas de lixo a serem gerenciadas.

Na área social, acredito que será comum não empregar pessoas envolvidas com violência doméstica ou outras formas de violência. Também acho que não vamos empregar pessoas que ficam além de um limite de horas por dia em mídias regidas por inteligência artificial porque, como agora sabemos, isso afeta a habilidade das pessoas para tomar decisões inteligentes.


SOBRE O(A) AUTOR(A)

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By Daniel Wege

Consultor HAZOP Especializado em IA | 20+ Anos Transformando Riscos em Resultados | Experiência Global: PETROBRAS, SAIPEM e WALMART

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